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BC não mata regime, diz economista
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
O economista José Júlio Senna,
57, sócio-diretor da MCM Consultores Associados, afirma que a
decisão do Banco Central de comprar dólares para recompor as reservas não fere de morte o regime
de câmbio flutuante.
Segundo ele, as circunstâncias
atuais justificam a decisão. O nível
de reservas do Brasil é muito baixo. O problema, no entanto, é que
esse movimento irá gerar aumento da dívida pública. "Não se acumula reservas sem custos."
Folha - O Banco Central mudou a
política cambial?
José Júlio Senna - Não vejo motivo maior para esse tipo de apreensão. O Banco Central está apenas
dando continuidade ao que já estava sendo feito pelo Tesouro.
Agora será adotada uma sistemática de compra de dólar um pouco
mais saudável, já que será mais
transparente e por meio de leilões.
É evidente que todo regime de
câmbio flutuante faça jus ao nome. Ou seja, que o preço da divisa
flutue realmente. Em alguns momentos, no entanto, as circunstâncias obrigam a não adotá-lo
em sua forma mais pura. Uma intervenção aqui e ali se impõe algumas vezes.
É fundamental, porém, que essas intervenções sejam feitas sem
ferir mortalmente o espírito do
regime de câmbio flutuante. Como o Banco Central garantiu que
não haverá uma meta para acúmulo de reservas e também não
será definido um preço a se perseguir para a taxa de câmbio, a sensação é que, de fato, o Banco Central não irá estabelecer um cabo
de guerra com o mercado.
O Banco Central não vai, assim,
se empenhar para ter um câmbio
fixo. Se assim o fizesse estaria ferindo mortalmente o regime de
câmbio flutuante. Não me parece,
portanto, que a gente esteja diante
de uma forma de intervenção nefasta para o Brasil. Tanto que o
mercado reagiu favoravelmente.
Folha - Por que o Banco Central
decidiu intervir no mercado?
Senna - Nós começamos o ano
passado com o risco-país em mais
de 1.000 pontos, e terminamos em
500 pontos. Foi uma redução brutal. É impossível que um movimento de prêmio de risco dessa
ordem deixe de ter impacto expressivo sobre a taxa de câmbio.
Num país como o Brasil, câmbio é sinônimo de risco. Para onde vai o risco costuma ir a taxa de
câmbio. De abril do ano passado
até o início deste ano, o risco continuou em queda, mas a taxa de
câmbio se estabilizou num patamar pouco acima de R$ 2,90.
Por quê? Isso foi resultado da
decisão do Tesouro de comprar
dólares no mercado de forma antecipada para fazer frente a seus
compromissos externos. Essa intervenção impediu que a queda
do prêmio de risco Brasil tivesse
mais impacto ainda sobre a taxa
de câmbio.
O que quero mostrar é que as
intervenções já estavam em curso
e o anúncio de anteontem do Banco Central apenas muda a forma
de intervenção.
Se não tivesse havido essa intervenção por parte do Tesouro, o
câmbio poderia estar hoje num
patamar de R$ 2,60 ou R$ 2,70. A
intervenção impediu uma "apreciação exagerada" da moeda nacional.
O Brasil tem hoje um nível muito baixo de reservas líquidas, de
US$ 17,4 bilhões. Há três anos, as
reservas estavam em torno de
US$ 33 bilhões, um número muito mais adequado para a situação
externa. Esses US$ 17,4 bilhões de
reservas representam apenas cerca de 30% das importações anuais
do Brasil. É muito pouco. A recomposição das reservas é um
movimento saudável.
Folha - O processo de acumulação
de reservas não gera pressão sobre
a dívida pública?
Senna - O Brasil não produz dólar, e acumulação de divisas envolve custos. O país terá de se endividar. Uma das formas é lançar
bônus no exterior. A segunda maneira é o Banco Central comprar
dólar no mercado, o que expande
a oferta monetária.
Para que a oferta monetária não
se expanda e produza efeitos indesejáveis, o governo terá de vender títulos públicos, o que aumenta a dívida pública.
Folha - Haverá um piso para a intervenção do Banco Central?
Senna - Essa impressão pode
existir sim, já que o Banco Central
fez o anúncio da medida quando
o câmbio estava numa faixa de R$
2,85, quando no ano passado se
estabilizou em R$ 2,93.
O mercado pode entender que
um número abaixo dessa faixa
pode não ser bom para o Banco
Central. Não é ruim essa imagem
do piso.
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