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ARTIGO
A globalização da economia
NIGEL LAWSON
Em pouco mais de uma década,
saímos de um mundo no qual o
contexto político era claro, mas
em que os rumos econômicos
eram relativamente confusos, e ingressamos em um mundo politicamente confuso, porém em que
os rumos econômicos ficaram
bem mais claros.
Esse novo panorama é regido pela economia de mercado, que, hoje
-como jamais antes-, tem sido
aceita em praticamente toda parte
do mundo como sendo o único
modelo capaz de levar ao progresso econômico. Paralelamente, como reforço para esse fato tão significativo, surgiu o fenômeno denominado globalização.
Hoje em dia, as grandes empresas multinacionais pensam -e
são obrigadas a pensar- em termos de mercado global. O fato de,
atualmente, o investimento externo direto aumentar bem mais rápido do que o comércio exterior
-que, por sua vez, tem aumentado em ritmo maior do que as economias como um todo- é mais
um sintoma importante da globalização.
A peça fundamental em tudo isso tem sido a liberdade de movimento do capital. Durante décadas, os países desenvolvidos viviam em um mundo no qual o comércio era relativamente livre,
mas em que fluxos de capital eram
rigorosamente controlados. A
transformação que hoje vivenciamos, bem como a forma como esta
ocorreu, foi de natureza quase
darwiniana.
É claro que sempre existiram
pessoas que pregavam as vantagens do livre movimento de capital, argumentando que as restrições que se aplicavam à sua mobilidade eram prejudiciais à economia. Mas o fluxo livre de capitais
não teria se difundido pelo mundo
de tal maneira se não fosse a informática, que tornou a imposição de
controles cambiais tão evidentemente ineficaz que até os governos, que a princípio eram a favor
de tais controles, perceberam que
não valia mais a pena mantê-los
em vigor.
Em outras palavras, como consequência da revolução da tecnologia da informática e da facilitação dos fluxos de capital por ela
desencadeada, medidas para o
controle do câmbio -mesmo
mantendo o seu potencial nocivo- não mais desempenhavam
um papel seguro na consecução
dos objetivos desejados pelos governos que os impuseram.
As consequências têm sido das
mais profundas. A liberdade dos
fluxos de capital vem dando um
impulso adicional ao investimento
externo direto, que, por sua vez,
vem desencadeando um forte estímulo ao comércio. Hoje em dia,
grande parte do comércio internacional se dá entre unidades de empresas multinacionais, ou seja, entre fábricas de um mesmo grupo,
localizadas em países distintos.
Mas isso também significa que
os mercados financeiros vêm ocupando espaços cada vez maiores.
Por exemplo, assumiram em grande parte o papel do FMI e do Banco
Mundial.
Para os países em desenvolvimento, hoje em dia não existe
mais a perspectiva de financiar
seus déficits de conta corrente junto ao FMI: são os mercados financeiros que realizam essa tarefa. E
mais ainda, países em desenvolvimento que seguem políticas conscientes têm a possibilidade de
atrair imensos fluxos de capital de
empréstimo do setor privado, ou
seja, de fundos captados nos mercados financeiros e não de instituições da esfera pública, como o
Banco Mundial.
É claro que isso não significa que
possamos descartar a disciplina financeira que o FMI, com toda razão, sempre exigiu. Os mercados
financeiros impõem a sua própria
disciplina, que em certas situações
pode ser extremamente severa.
Mas tal disciplina é de natureza
mais aceitável para a maioria dos
países do que o vexame de ter de
solicitar a aprovação de suas contas junto a uma instituição internacional e dos governos dos países
que a controlam.
Tudo isso tem exercido um profundo impacto sobre a formulação
de políticas públicas. Por um lado,
a limitação imposta pela balança
comercial deixou de ser problema
para um país com uma economia
bem administrada. Por outro, os
governos nacionais tornaram-se
mais fracos do que nunca, em face
dos imperativos do mercado, e as
políticas, por sua vez, têm que ser
exercidas à luz desse conhecimento.
Se tudo isso parece bom demais
para ser verdade, é porque realmente é. Além das oportunidades
existentes, há também perigos
muito reais, representando os riscos acarretados pela evolução. Em
primeiro lugar, mais do que nunca
nesta época em que os mercados
financeiros são mais poderosos do
que antes, existe o risco de inversões repentinas nos fluxos de capital, que podem, por sua vez, causar imensos estragos econômicos.
Em segundo lugar, existe a preocupação de que a globalização poderá conduzir à perda de empregos em grande escala, tendência
esta que não poderá ser revertida a
não ser por meio de medidas protecionistas, por sua vez altamente
prejudiciais.
Nigel Lawson, 64, é ``chairman'' da Central Europe Trust Co. Ltd. e diretor do banco Barclays.
Foi ministro da Economia (1983-89) e secretário
da Energia (1979-83) do Reino Unido.
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