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São Paulo, sábado, 08 de março de 2003

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REESTATIZAÇÃO?

Mark Smith, vice-presidente da Câmara de Comércio norte-americana, alerta para impasse no caso AES

EUA detectam retrocesso na privatização

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

Mark Smith, vice-presidente da Câmara de Comércio dos Estados Unidos, afirma que o impasse entre a AES e o BNDES no Brasil está "passando a percepção" aos investidores norte-americanos de que o governo Lula está "retrocedendo, voltando atrás, no processo de privatização".
A Câmara de Comércio dos EUA representa as 75 maiores empresas americanas com investimentos no Brasil. "Não seria bom para o Brasil perder esse tipo de investimento", diz Smith. "O governo Lula deveria manter aceso o sinal de que estão abertos ao diálogo para resolver os problemas atuais."
O maior "problema atual" é entre a AES, controladora da Eletropaulo, e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Soma US$ 1,13 bilhão ( cerca de R$ 4 bilhões), valor da dívida que a energética está tendo dificuldades de saldar junto ao banco.
Leia entrevista que Smith deu ontem à Folha em Washington:

Folha - Como o sr. avalia o atual impasse entre o BNDES e a AES e quais as consequências para as outras empresas americanas que têm investimentos no Brasil?
Mark Smith -
Em primeiro lugar, gostaria de ver o problema resolvido da melhor maneira possível para as duas partes. Mas a principal questão são as implicações diretas que serão geradas da análise de como crises como essa são solucionadas pelo governo.

Folha - Que implicações?
Smith -
O que temos hoje? Um mercado muito desconfiado em relação ao passado de Lula. Ele tem feito um grande trabalho para mostrar que vai fazer exatamente o que disse durante a campanha eleitoral. Mas ainda há muito medo em relação a ele. Em momentos como esse, a realidade não tem importância. O fato é que há uma percepção de que o governo brasileiro não está aberto ao diálogo e não está olhando para uma saída criativa. A percepção é que o Brasil está retrocedendo, está voltando para trás no processo de privatização.

Folha - Essa percepção está se generalizando?
Smith -
Gostaria que não estivesse, mas infelizmente esse é o perigo que está implícito nessa discussão. Idealmente, gostaríamos de ver uma grande vontade política da administração Lula em encontrar uma solução criativa que fosse favorável a todos.

Folha - Que outros sinais negativos o país tem dado?
Smith -
Há uma série de problemas em áreas pesadamente reguladas, como o setor elétrico. Há uma discussão em torno da criação de novos modelos. Os setores elétrico e de telefonia estão em crise. As empresas não conseguem reaver o dinheiro investido, os consumidores estão pagando caro pelos serviços oferecidos e as agências regulatórias do governo não estão trabalhando no sentido que deveriam. A solução seria ampliar o debate sobre o assunto. Pensar em uma estrutura regulatória nova a partir de um debate maior com as empresas. O governo deveria encontrar uma solução que permitisse às empresas continuar no país. Não seria bom para o Brasil perder esse tipo de investimento. O governo brasileiro deveria manter aceso o sinal que vinha enviando até aqui aos investidores internacionais.

Folha - E qual sinal os srs. estão recebendo neste momento?
Smith -
O de que eles não tomaram uma decisão. Se o governo brasileiro conseguir aparecer com uma solução que permita ao investimento estrangeiro permanecer no país e ao BNDES receber o que tem direito, essa é uma boa solução. O sinal que será dado ao resultado desse impasse será muito importante. Até aqui, o nível de diálogo entre uma empresa como a AES, que investiu milhões de dólares, e o governo brasileiro, particularmente o BNDES, infelizmente não tem sido tão robusto como o nível da atual crise exigiria.

Folha - O Ministério de Minas e Energia chegou a cogitar a retomada da companhia. O sr. considera isso uma ameaça?
Smith -
É mais do que uma ameaça. É uma possibilidade. Está no contrato. Mas o melhor seria que a AES conseguisse pagar as suas dívidas e que mantivesse seus investimentos. Para o governo brasileiro, o melhor seria não ter de falar em retomar o controle da companhia.


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