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OPINIÃO ECONÔMICA
Metas de inflação pelo mundo
GESNER OLIVEIRA
A experiência com o regime de metas inflacionárias
no Brasil tem sido positiva.
Transcorridos três anos de sua
implantação e em um momento
de debate acerca das melhores alternativas para a próxima administração, é natural que surjam
propostas de aperfeiçoamento do
sistema, como as sete interessantes sugestões de Edmar Bacha na
edição do "Valor" de ontem.
A experiência internacional sumariada no quadro baseado em
trabalho do economista do Banco
Central chileno Klaus Schmidt-Hebbel é útil nesse sentido. A diversidade do sistema pelo mundo
mostra que o regime de metas inflacionárias está longe de ser um
pacote fechado e padronizado.
Trata-se de marco institucional
amplo, adaptável às peculiaridades de cada país e que evolui de
acordo com as lições da prática.
A Nova Zelândia adotou de forma pioneira um sistema informal
de metas de inflação em 1988 e
tornou-o explícito em lei a partir
de 1990. O Chile adotou no mesmo ano, Canadá e Israel, em 1991,
o Reino Unido, em 1992, a Suécia,
em 1993, e a Austrália e a Espanha, em 1994. Um pouco mais
tarde, vieram o Brasil, em 1999, e
a África do Sul, em 2000.
O quadro destaca dimensões relevantes de cada um dos casos: o
grau de independência do Banco
Central, o tipo de índice usado como meta, a faixa de tolerância, a
existência das chamadas cláusulas de escape e a transparência.
Quanto à independência do
Banco Central, a variabilidade de
arranjos é grande, não se restringindo a aspectos formais como a
existência ou não de mandatos fixos para as autoridades monetárias. Conforme destacado em relatório recente do Fundo Monetário Internacional em relação ao
Brasil, "o Banco Central não é
formalmente independente, mas
na prática desfruta de uma substancial autonomia operacional".
Em contraste com a independência formal, que não é geral, essa
autonomia na utilização dos instrumentos disponíveis é comum
aos países indicados no quadro.
Quanto ao tipo de índice usado
como meta, países como a Espanha e a Suécia utilizam a chamada "inflação cheia", como o Brasil. Isto é, não se faz nenhum tipo
de ajuste, por exemplo, para depurar choques específicos dos índices de preços. Outros, como a
Austrália e a Nova Zelândia, excluem componentes excessivamente voláteis dos indicadores
inflacionários.
A experiência é igualmente diversa no tocante à utilização de
metas pontuais comparativamente a intervalos (ou bandas)
de variação para as taxas de inflação. A própria amplitude dessas últimas varia; no caso neozelandês chega a três pontos percentuais, contra quatro pontos no
Brasil.
Quanto aos mecanismos de flexibilização das metas em circunstâncias especiais (cláusulas de escape), enfatizadas em recente artigo pelos economistas Rogério
Mori e Alexandre Matias, Espanha, Chile, Israel, Reino Unido e
Brasil são relativamente rígidos.
Nos dois últimos, o Banco Central
deve prestar explicações ao governo em caso de estouro da meta, o
que não pode ser considerado
uma cláusula de escape no sentido estrito. Já a Nova Zelândia
prevê desvios em determinadas
condições, como no caso de choques externos de preços (petróleo,
por exemplo).
Quanto à transparência, o Brasil sobressai pela publicação das
atas do Copom, pela divulgação
aberta das projeções de inflação
do Banco Central e pela publicação de um relatório de inflação,
uma tríade que não se verifica em
todos os países que adotam o regime. O relatório trimestral de metas de inflação produzido pelo
Banco Central brasileiro chegou a
ser citado como exemplo pelo economista Frederic Mishkin, um
dos gurus do regime de metas inflacionárias, em artigo de 2000,
preparado para a conferência
anual da Associação Americana
de Economia.
A natural diversidade e a desejável flexibilidade do regime de
metas inflacionárias indicam,
portanto, que aperfeiçoamentos
são bem-vindos. A implementação desses últimos exigirá, contudo, lançar mão de ingrediente já
presente no sistema brasileiro: a
transparência. Quaisquer alterações terão de ser acompanhadas
de ampla discussão e entendimento, não apenas pelos especialistas do mercado mas pela opinião pública.
O gradualismo é fundamental
para o desenvolvimento de novas
instituições e práticas coletivas.
Os técnicos de futebol sabem -e
no Brasil há cerca de 174 milhões
deles- que o jeito mais fácil de
perder um campeonato é ficar
mudando o esquema tático a cada jogo.
Gesner Oliveira, 45, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-SP, consultor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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