São Paulo, domingo, 08 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

As mulheres dos nossos sonhos

Dia desses, li uma reportagem sobre a ex-vedete Darlene Glória. O tempo é impiedoso, senão você saberia quem foi Darlene para os adolescentes da minha geração.
O que faz uma mulher marcar época? A beleza é fundamental, mas não basta. A sensualidade ajuda, mas deve ser dosada, de acordo com o perfil da musa, um temperamento forte, ainda que desgovernado, a inteligência, desde que desacompanhada do intelectualismo forçado que acomete as belas com complexo de belas.
Minha infância foi marcada por duas belezas clássicas, das maiores que este país já teve: Marta Rocha e Tônia Carrero, e uma beleza para paladares muito sofisticados -Danuza Leão. E havia ainda os dentes e as pernas de misses como Adalgisa Colombo e as covinhas de Terezinha Morango.
Nos anos 60, as revistas passaram a ser mais ousadas, e as musas, mais carnais. Mas ainda eram tempos de mulheres maduras, curvilíneas. Começam os reinados de Norma Benguell e de Odete Lara, protagonistas de um dos clássicos eróticos do cinema nacional, "Os Cafajestes". E também o período das "Certinhas do Lalau", que Stanislaw Ponte Preta imortalizaria nas páginas da "Última Hora", com as imbatíveis pernas de Íris Bruzzi.
No final dos anos 60 e início dos anos 70, há espaço maior para negras monumentais, como Marina Montini -a musa de Di Cavalcanti-, Adele Fátima e Piná, que virou a cabeça do príncipe Charles.
Os programas humorísticos de televisão começam a consagrar as musas maliciosas, sucessoras das vedetes do rebolado, fazendo o tipo ingênuo ou burro, bastante calcados em Brigitte Bardot, como as "francesas" Jaqueline Mirna e Anick Malvill e a norte-americana Kate Lyra. Sem contar a "língua presa" de Sônia Mamede.
Surge um tipo de musa para públicos mais intelectualizados, como a insuperável Leila Diniz, e, no Cinema Novo, a beleza plácida (e estragada pelo intelectualismo do Cinema Novo) de Helena Ignez, que Glauber Rocha fez, e Adriana Prietto, de morte trágica e prematura.
Nesse período, os "catecismos" clássicos de Carlos Zéphiro são substituídos pelas primeiras revistas masculinas com uso abundante de nus, como a pioneira "Fairplay", que, pela primeira vez, traria nus explícitos de Betty Faria, Pepita Rodrigues e da belíssima modelo Marisa Urban. As modelos, aliás, sempre tiveram seu espaço: nos anos 50, Danuza, nos anos 60, Milla, Marisa Urban e Lucia Cúria.
No final dos anos 60 e início dos anos 70, no rastro da Garota de Ipanema -que se torna símbolo mundial de sensualidade-, começa a se desenvolver um novo padrão de musa, mais jovem, magra, tipo "gata" ou "pantera" -termos pelos quais eram tratadas. Além da original, Helô Pinheiro, o período consagra Lueli Figueiró, a trágica Ângela Diniz (a "pantera" mineira morta por um amante enlouquecido) e três monumentos absolutos da época: Rose di Primo, com suas fotos em biquíni em cima de uma motocicleta, Monique Evans, com a campanha "o fino que satisfaz", para cigarro, e a santista Alcione Mazzeo.
O cinema nacional continuava atuante, agora com as pornochanchadas. Há a beleza estonteante na presença discreta de Kate Hansen, a sensualidade explícita de Sandra Bréa, assim como a brasileiríssima beleza de Sonia Braga e a beleza estrangeira de Bruna Lombardi.
Nos anos 80 e 90, a televisão foi o meio que consagrou as novas deusas. Muitas atrizes passaram, se popularizaram, muitas vedetes se transformaram em símbolos sexuais, provavelmente surgiu a mais bela fantasia brasileira, que foi Luma de Oliveira. E também um conjunto de atrizes semi-adolescentes, padrão Globo, como Lídia Brondi e Glória Pires, nos anos 80, e Malu Mader e Cláudia Abreu, nos anos 90.
Há mulheres que se destacaram pelo conjunto da obra -beleza, sofisticação, personalidade e história de vida-, como Luiza Brunet, o tipo brasileiro por excelência, e Rita Camata. E símbolos sexuais que surgem e desaparecem na voracidade que caracteriza os tempos atuais, como Tiazinha e Feiticeira.
Obviamente, nem chegam aos pés da maior fêmea (com o perdão das feministas), a beleza eterna, a mulher que constrói e desconstrói o mito, que vence as intempéries da vida e da idade e a rapidez da mídia, e renasce sempre, imbatível: Vera Fischer, que começa miss no início dos anos 70, passa pelas pornochanchadas dos anos 70 e torna-se grande atriz nos anos 80.
De qualquer modo, as eróticas explícitas que me perdoem, mas a sensualidade discreta é imbatível, junto com a beleza, a inteligência e um toque de classe. Na relação das minhas musas, além de Tônia Carrero, estariam Ana Paula Arósio, Maitê Proença e Carolina Ferraz.

E-mail - LNassif@uol.com.br



Texto Anterior: Lições contemporâneas: O memorando sob cenário de guerra
Próximo Texto: Corrupção no trabalho: Brasileiros fraudam mais que americanos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.