São Paulo, domingo, 08 de setembro de 2002

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CORRUPÇÃO NO TRABALHO

Segundo pesquisa, golpista começa mais cedo no Brasil e dá um rombo maior para a empresa

Brasileiros fraudam mais que americanos

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O cruzamento dos dados de duas pesquisas sobre fraudes em empresas privadas, obtidas pela Folha, mostra que os empregados brasileiros são mais corruptos do que os seus colegas norte-americanos.
Os fraudadores que surrupiam o caixa das empresas começam nessa vida mais cedo -entre 36 e 40 anos- do que os norte-americanos. Desviam mais recursos e a maioria deles -oito em cada dez- são homens. No Brasil, as mulheres fraudam menos do que nos EUA e é raro pegá-las com a boca na botija.
Há informações, no mínimo, curiosas e preocupantes. Companhias privadas do setor industrial são cada vez mais o alvo preferido dos fraudadores brasileiros -mais até do que os bancos.
Não é só isso. Segundo levantamento da GBE Peritos, empresa especializada em desmantelar os esquemas, 29,2% dos casos de fraudes no Brasil promoveram, em 2001, desvios de recursos que variaram de mais de US$ 100 mil a até US$ 500 mil.
Os esquemas foram montados por empregados de alto e baixo escalão. Quarenta e três casos foram analisados.
Essa é a maior taxa verificada no levantamento. O montante não é nada desprezível. Nos EUA, por exemplo, um número menor -27,6% dos mais de 600 casos analisados neste ano- surrupiou a mesma quantia, informa o levantamento finalizado em julho pela ACFE (Association of Certified Fraud Examiners), entidade que reúne 25 mil investigadores em cem países.
A pesquisa analisou 663 casos de desvios de recursos nos EUA. Ela mostra que 35% -a maior taxa na pesquisa americana- dos "gatunos" de lá roubam de US$ 10 mil a até US$ 100 mil.

Criatividade
Outro detalhe chama a atenção. Ao cruzar os dados da GBE e da ACFE, descobre-se que o crime preferido dos empregados que assaltam o caixa das empresas no Brasil é a corrupção.
Nessa categoria entram os crimes em que os fraudadores usam da influência de seus cargos para conseguir algum benefício. Aqui, mais de 56% das investigações identificaram um cenário de corrupção dentro da empresa.
Normalmente, o esquema é descoberto porque a companhia solicita aos auditores uma investigação sigilosa.
Nos EUA, no entanto, 85,7% dos casos eram de apropriação indevida de bens -caracterizada por uma situação de roubo ou de mau uso dos ativos da empresa.

Mais cuidadosas
Na hora de agir na surdina, as mulheres são menos pegas. Isso não acontece só porque a maioria dos fraudadores são homens, mas porque elas são mais cuidadosas e pacientes do que eles.
"O homem frauda e pouco tempo depois vai gastando o dinheiro. A mulher não. Ela espera porque sabe que corre o risco de ser pega", diz Marcelo Gomes, diretor da GBE.
Há uma tendência, porém, que já preocupa as companhias. Mais de 46% dos fraudadores, nos 663 casos analisados nos Estados Unidos, são do sexo feminino. Em 1996, a taxa não passava de 40%. No Brasil, mais de 84% dos acusados são homens.
Há exemplos de fraude à vontade. Anos atrás, Gomes investigava desvios no caixa de uma multinacional. Desconfiava que um dos diretores lesava a empresa, mas não sabia como.

BMW na garagem
Numa noite, um dos diretores encontrou o possível fraudador na garagem da empresa estacionando um BMW. Não deu outra: no dia seguinte ele foi colocado contra a parede. Perdeu o emprego, mudou de cargo e está trabalhando em outra empresa.
"Isso ocorre muito. O cara é pego, mas a empresa tem medo da má exposição do caso e o demite na surdina. O cara procura uma empresa de recolocação respeitável e consegue um novo emprego. E volta a operar na clandestinidade", conta Gomes.
Por isso, há dificuldade em levantar números de executivos atrás das grades.
Histórias como a do diretor com o BMW entram nas estatísticas como "descoberta por acidente". O acaso facilitou a identificação do fraudador. Quase 19% das descobertas dos investigadores da ACFE ocorreram sem querer.
"O método mais comum de detectar é a denúncia anônima do colega, que ocorre em um quarto dos casos esclarecidos", informa o trabalho da associação.
Nesses esquemas dentro das companhias, o jovem executivo é, normalmente, o larápio. Aqueles entre 36 e 40 anos são responsáveis por quase 42% das fraudes no país, segundo o estudo da GBE nos 43 casos com 155 pessoas acusadas do crime. Nos EUA, 30% delas têm entre 41 e 50 anos.

Até na 3ª idade
Acredita-se ainda que os que terminaram o ensino superior estão mais perto de cometer o crime, até pelo cargo que ocupam -de gerência e diretoria. Mas especialistas norte-americanos ressaltam que quem fez a "high school" (equivalente ao colegial no Brasil), já é responsável por quase 57% dos casos registrados.
Outro dado chama a atenção: aqueles com mais de 60 anos desviam, em média, volumes que chegam a ser 27 vezes superiores àqueles desviados por jovens com menos de 26 anos nos EUA. A informação não é confirmada pelas auditorias no Brasil.



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