São Paulo, terça-feira, 08 de setembro de 2009

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Bolsa está à beira de correção, dizem bancos

Fundamentos das empresas não justificam euforia dos últimos meses, alerta o IIF, entidade do setor financeiro global

Ações de bancos, que têm puxado o índice em Nova York, estão entre as mais ameaçadas de cair; cotações estão acima do preço real


FERNANDO CANZIAN
DE NOVA YORK

Relatório confidencial distribuído pelo IIF (Instituto de Finanças Internacionais, na sigla em inglês) a seus 375 membros, a maioria grandes bancos, afirma que os mercados de ações globais estão à beira de uma nova "correção".
A possibilidade de queda, após vários meses de altas a partir de março, seria mais forte para as ações do próprio setor financeiro. Os papéis dos bancos têm sido os principais "puxadores" do índice da Bolsa de Valores de Nova York.
Na semana passada, os preços das ações nos EUA tiveram a maior queda em dois meses, liderada pelos papéis dos setores bancário e de energia.
"Tanto nos mercados avançados quanto nos emergentes, a relação entre o preço e o lucro (P/L) das ações já está muito acima da média dos últimos cinco anos", diz o IIF.
Os últimos cinco anos, até o estouro da atual crise, em setembro de 2008, foram os de maior crescimento contínuo e conjunto da economia global. Isso ajudou a justificar, no passado recente, a relação elevada entre preço de ações e lucros.
O P/L representa o número de anos necessários até que o investidor tenha de volta o capital investido em uma ação. Isso considerando que seja distribuído lucro aos acionistas e que o montante seja constante em termos reais (atualizado pela inflação de cada ano).
Se uma companhia tem uma ação cotada a R$ 10 e pagou um dividendo de R$ 0,50 nos últimos 12 meses, por exemplo, seu P/L (índice preço-lucro) é de 20 (R$ 10 divididos por R$ 0,50). Assim, os R$ 10 investidos retornariam ao investidor em um prazo de 20 anos.
Nos 113 anos de história do índice Dow Jones da Bolsa de Nova York, em apenas seis ocasiões a recuperação foi tão forte e rápida quanto a atual.
Segundo cálculos do economista Robert Shiller, da Universidade de Yale, em março as ações nos EUA eram negociadas em um nível 12 vezes inferior aos ganhos proporcionados aos acionistas nos últimos dez anos. Isso deprimiu o valor total do mercado até o menor patamar desde 1986.
Hoje, essas ações estão em um patamar 18,4 vezes maior em relação à projeção de lucros das empresas. E acima até da média de 16,3 vezes calculada sobre o passado de longo prazo.
O que esses números mostram é que os investidores estão bastante otimistas com a recuperação da economia mundial, em especial nos EUA.
Já os dados do IIF ponderam a possibilidade de a "correção" estar baseada no fato de os bancos continuarem reduzindo o volume de empréstimos a consumidores e bancos, como vêm fazendo desde o ano passado.
Menos financiamento significa menos vendas, produção e atividade econômica, deprimindo o lucro das empresas. E, consequentemente, o ganho por ação dos acionistas.
Nos últimos meses, grande parte do aumento do lucro das empresas (que justificou a valorização do mercado) também ocorreu mais devido ao corte de custos e empregos do que pelo aumento das vendas.
Alguns investidores bem informados já estariam se retraindo. Em agosto, segundo a empresa de pesquisas TrimTabs Investments, diretores de companhias com ações na Bolsa venderam 31 vezes mais papéis do que compraram. A relação de longo prazo para o indicador é de 7 para 1.
Na sexta-feira, Mohamed El-Erian, presidente da Pimco, uma das maiores corretoras do mundo, disse que a valorização do mercado de ações e títulos empresariais "ultrapassou a realidade da economia".
Para El-Erian, há 50% de chance de a economia dos EUA voltar ao vermelho em 2010, o que levaria a atual recessão a ter um formado de W (queda, recuperação e nova queda antes de subir de vez). E não de V (queda e recuperação).
"Não é que as coisas estão começando a melhorar. Elas estão piorando mais lentamente", disse El-Erian ao comentar a divulgação de que mais 216 mil pessoas foram demitidas em agosto nos EUA. Nos primeiros meses de 2009, a média de cortes mensal foi de 700 mil.
Parte da valorização para além dos "fundamentos econômicos", segundo o IIF, também seria consequência de os principais bancos centrais do mundo estarem mantendo uma política de taxas juros extremamente baixas para estimular a atividade econômica.
Assim que as economias crescerem e quando os gastos públicos recordes em vários países começarem a fazer efeito, poderá haver o risco de aumento da inflação.
Se os BCs elevarem os juros para combater a alta de preços (que é praxe), haveria um novo estímulo para os investidores saírem do mercado de ações e aplicarem em títulos públicos.


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