São Paulo, quarta-feira, 09 de janeiro de 2008

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Empresas atacam taxação de importados

Medida provisória cria alíquota para mais de dez categorias de produtos, que vão de bebidas e têxteis a aparelhos de hemodiálise

Importadores de vinho afirmam que item ficará "invendável"; medida também abre divergências dentro do próprio governo

IURI DANTAS
JULIANA ROCHA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou uma medida provisória instituindo no país medidas de comércio vistas como protecionistas por importadores e setores do próprio governo e que são criticadas há anos pelo Brasil no cenário internacional e nas negociações comerciais da OMC (Organização Mundial do Comércio).
A mudança unilateral também representa, na visão dos críticos, um golpe no Mercosul, como bloco aduaneiro. Fornecedores argentinos de empresas brasileiras se perguntam se a mudança resulta em quebra de contratos.
O governo não soube elucidar ontem se a nova sistemática representa uma mudança na política externa brasileira ou apenas um erro técnico cometido pela Receita Federal na elaboração do texto da medida provisória número 413, publicada numa edição extra do "Diário Oficial" da União na quinta-feira passada -um "contrabando" no pacote de medidas para compensar a perda da CPMF.
O texto institui a aplicação de uma alíquota específica de R$ 10 sobre mais de dez categorias de produtos, segundo uma interpretação ouvida pela Folha. Sob outra ótica, também coletada pela reportagem, a taxa variaria de R$ 1 a R$ 10.
Esse valor seria cobrado de cada "unidade de medida estatística", mas não há clareza sobre o que seria isso e como aplicar a questão na prática. A própria medida provisória afirma que a sistemática só valerá depois de ser regulamentada, o que aumentou a insegurança de importadores ouvidos pela Folha.
"É terrível, vai matar o setor, 80% a 90% das empresas vão sair do mercado. Vinho de 2 pode sair por R$ 50 na gôndola. O produto vai ser invendável. Há muita dúvida, é uma grande questão que o Brasil vai enfrentar", disse Raquel Salgado, presidente-executiva da ABBA (Associação Brasileira de Exportadores e Importadores de Bebidas).
A medida provisória provocou queixas do chanceler Celso Amorim a Lula na sexta-feira passada e reações negativas do Ministério do Desenvolvimento nos bastidores.
A assessoria do Itamaraty chegou a divulgar que o tal artigo foi incluído na MP porque a Receita se preocupava com "subfaturamento" das importações. Depois da perda de arrecadação da CPMF, a interpretação era a de que a Receita planejava arrecadar mais com essa medida.
Já a Receita nega. "Essa medida nunca teve finalidade arrecadatória, e sim regulatória. Visa-se um controle efetivo de comércio exterior", contestou o secretário em exercício Carlos Alberto Barreto. Ele disse que a Receita não chegou a fazer um levantamento de quanto a norma poderia gerar em arrecadação.
Ontem, Amorim discutiu a nova medida com os ministros em exercício Ivan Ramalho (Desenvolvimento) e Nelson Machado (Fazenda), mas o conteúdo da discussão não foi divulgado, o que também gerou críticas de empresários. O governo federal acena que o tema será resolvido em fevereiro pela Camex (Câmara de Comércio Exterior).
"Enquanto isso, deixam-nos 60 dias com uma espada em cima da cabeça. Isso não é política adequada. Todo mundo está com pé atrás, quem ia fazer negócio não faz", disse Cláudio Marques, secretário-executivo da Abimed (Associação Brasileira de Importadores de Equipamentos, Produtos e Suprimentos Médico-Hospitalares).
A medida provisória de Lula afeta 13% das importações brasileiras, ou R$ 14,7 bilhões. Inclui bebidas, plásticos, borrachas, têxteis e confecções, calçados, ferramentas, aparelhos médicos, relojoaria, móveis e outros. Segundo Marques, da Abimed, também inclui preservativos, luvas de borracha, aparelhos de raios-X, aparelhos de hemodiálise, microscópios.
Se mantiver a aplicação de alíquota específica para unidade de produto, o Brasil irá contra acordo firmado com a OMC sobre tarifas máximas de 35%, representará quebra de compromisso com o Mercosul e firmará posição prática contrária ao que vem defendendo com o G20, grupo de países em desenvolvimento que negociam em conjunto a Rodada Doha de comércio.


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