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ANÁLISE
Um desafio para a produtividade na Europa
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
Algo de fundamental pode
estar-se alterando no equilíbrio econômico entre os Estados
Unidos e a Europa Ocidental. Depois do final da Segunda Guerra
Mundial, a Europa por um longo
tempo se aproximou regularmente do padrão de vida dos Estados
Unidos. Mas esse período de convergência se encerrou na metade
dos anos 90. Se a presente divergência continuar, a Europa, já insignificante militar e politicamente, passará a desempenhar também um papel econômico cada
vez menor.
A convergência posterior à
guerra foi indubitavelmente impressionante. De acordo com o
historiador da economia Angus
Madison, em 1950 a renda per capita média real na Europa Ocidental (em termos de paridade de poder aquisitivo) equivalia a 54% da
norte-americana. No começo dos
anos 90, ela havia chegado à marca dos 80%.
Desde a metade dos anos 90, no
entanto, surgiu uma divergência
em substituição à tendência de
convergência. Entre 1995 e 2001, o
PIB (Produto Interno Bruto) per
capita real subiu em 2,3% ao ano
nos Estados Unidos, mas em apenas 1,4% na Europa Ocidental.
Essa divergência resulta, em si,
de um renascimento da produtividade nos Estados Unidos. Mas a
produtividade não é o único determinante dos níveis de vida
-ou de sua mudança.
Também importantes são as horas trabalhadas individualmente e
a proporção da população que esteja empregada.
Em 2001, de acordo com um estudo do Conference Board, uma
organização de pesquisa sem fins
lucrativos, a produtividade por
hora na União Européia equivalia
a até 87% do nível norte-americano, mas o PIB per capita real ficava em apenas 67%*.
Doze pontos percentuais dessa
diferença se devem à jornada de
trabalho média mais baixa adotada na União Européia. Os outros
oito pontos percentuais à proporção menor da população européia
que está ativa no mercado de trabalho.
É direito dos europeus trabalhar
menos, se quiserem, se bem que
seja outro assunto caso os governos de seus países os forcem a reduzir suas jornadas.
Mas a diferença no nível de emprego indica um fracasso: em
muitos países europeus, a alta
produtividade reflete a substituição de mão-de-obra dispendiosa
por investimentos de capital e a
exclusão dos trabalhadores de
baixa renda devido à carga tributária e regulatória.
Assim, alta produtividade nem
sempre é bom. Entre 1990 e 1995, a
produtividade da mão-de-obra
cresceu ao impressionante ritmo
de 2,5% anuais na União Européia. Mas o número total de horas
trabalhadas caiu, no período, em
1% ao ano.
A produtividade aparentemente
elevada da União Européia foi
causada, em parte, por cortes indesejavelmente altos no nível de
emprego.
No entanto, não se pode dizer o
mesmo sobre os ganhos de produtividade dos Estados Unidos na
segunda metade dos anos 90. Entre 1995 e 2001, o crescimento geral na produtividade geral norte-americana aumentou para 2% ao
ano. Mas o crescimento mais elevado na produtividade dos Estados Unidos foi acompanhado por
desempenho vigoroso em termos
de nível de emprego, com aumento de 1,6% nas horas trabalhadas
ao ano.
A maior questão ainda é determinar se esse excelente desempenho norte-americano foi mais que
circunstancial. No momento, é difícil responder com confiança.
Mas a queda jamais explicada no
desempenho da produtividade
dos Estados Unidos depois de
1973 parece ao menos ter acabado.
Entre os dois picos sucessivos do
último ciclo econômico, acontecidos no terceiro trimestre de 1990 e
no primeiro trimestre de 2001, a
produção por hora no setor não
agrícola da economia norte-americana subiu em nível composto
anual de 2%. É verdade que isso fica bem abaixo do ritmo atingido
entre 1957 e 1973. Mas se compara
bem ao 1,5% anual obtido no ciclo
iniciado em 10981 e encerrado em
1990, ao 1,3% registrado no ciclo
1973-1980.
Igualmente revelador foi o desempenho da produtividade em
2001. O Conference Board ressalta
que, entre 2000 e 2001, a produtividade geral da economia cresceu
em 1,8% nos Estados Unidos, mas
em apenas 0,6% na União Européia. Nos 12 meses até o quarto trimestre de 2001, a produção por
hora do setor não agrícola norte-americano aumentou em 1,7%.
Esse é um ritmo excepcionalmente elevado para um período de recessão.
O relatório do Conference
Board conclui que "a despeito da
recessão e dos acontecimentos de
11 de setembro, o crescimento da
produtividade nos Estados Unidos se manteve notavelmente
próximo à tendência recente".
O desempenho dos últimos meses me fez um pouco menos cético
quanto à opinião de que existe
uma aceleração durável em curso
no crescimento da produtividade.
No Relatório Econômico da
Presidência norte-americana, publicado no mês passado, prevê-se
crescimento econômico anual de
3,1% para a próxima década. Isso
inclui um crescimento anual de
2,1% na produtividade dos trabalhadores não agrícolas. E mesmo
esse ritmo fica bem abaixo dos
2,6% atingidos entre 1995 e 2001.
Parte da melhora no crescimento da produtividade na segunda
metade da década de 90 reflete um
crescimento insustentavelmente
rápido no nível de capital. Parte
dela reflete os efeitos do ciclo de
negócios, que são difíceis de desemaranhar. Assim, ninguém sabe
ao certo que tendência tem o crescimento da produtividade norte-americana no momento. Mas é
plausível supor que fique decisivamente acima da média atingida
entre 1973 e 1995.
Suponha que a produtividade
básica cresça em 2% ao ano nos
Estados Unidos, no futuro próximo. Suponha igualmente que a
União Européia não se saia melhor do que nos últimos seis anos.
Dessa forma, haverá divergência
constante entre os Estados Unidos
e a União Européia em termos de
produtividade e de padrão de vida.
Essa divergência poderia ser reduzida se a União Européia obtivesse sucesso em elevar seu nível
de emprego para um patamar
mais próximo ao norte-americano. Mas isso exigiria mudanças
politicamente implausíveis nos
mercados de trabalho e estruturas
fiscais européias.
Os Estados Unidos também têm
um crescimento populacional e de
força de trabalho superior ao da
Europa Ocidental. Isso posto, o tamanho geral de sua economia poderia crescer, com relação à União
Européia, ainda mais do que em
termos de renda per capita relativa. Sob suposições bastante cautelosas, a economia norte-americana poderia crescer pelo menos um
ponto percentual ao ano mais rápido do que a européia.
Uma superioridade sustentada
como essa não é implausível. Os
Estados Unidos, afinal, possuem
muitas vantagens sobre a Europa
em uma era de revolução tecnológica. Entre elas estão uma maior
aceitação das forças de mercado; a
superioridade de suas instituições
de ensino de terceiro grau e as ligações estreitas entre estas e as
empresas; seu domínio sobre a
maior parte das áreas de nova tecnologia; sua população relativamente jovem; e sua abertura à imigração dos mais capazes.
É sempre difícil discernir a ruptura de tendências. As tendências
de crescimento da produtividade
não são exceção. Mas podemos
estar testemunhando um tal acontecimento. Por meio século, a Europa trabalhou bem para enfrentar o que o escritor francês Jean-Jacques Servan-Schreiber definiu
como "le defi Américain". Mas o
desafio acaba de ser renovado. A
Europa será capaz de enfrentá-lo?
*"Performance 2001: Productivity, Employment and Income in the World's Economies" ("Desempenho 2001: Produtividade, Emprego e Renda nas Economias
Mundiais")
Tradução de Paulo Migliacci
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