São Paulo, terça-feira, 09 de março de 2004

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LUÍS NASSIF

Os pareceristas econômicos

Não têm ajudado em nada a clarear a discussão sobre o direito econômico os artigos em que os ex-presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) Gesner Oliveira defende, ao mesmo tempo, a fusão da AmBev e a proibição da compra da Garoto pela Nestlé. Há contradições flagrantes.
Na época da compra da AmBev, a conselheira Lúcia Helena Salgado lembrou que não existia nenhum lugar do mundo com tamanha concentração no mercado de cerveja. Gesner argumentou que não era o ponto relevante porque sempre o governo poderia reduzir as alíquotas de importação. Por que não vale para chocolates?
Agora, recebo correspondência do diretor jurídico da AmBev, Pedro Mariani, na qual explica que, "em relação a exportações, é importante enfatizar que o setor cervejeiro se caracteriza pela produção e consumo no próprio local onde é fabricada a bebida. As exportações de cerveja são insignificantes". Isso a propósito do receio que manifestei na coluna de que a Interbrew pudesse atrapalhar os planos de exportação da AmBev.
Na coluna "Opinião Econômica" de 7 de fevereiro (Dinheiro, pág. B2), Gesner dizia que, no caso AmBev, verificaram-se "eficiências compensatórias relativamente altas", o que não ocorreria no caso Garoto.
"Eficiência compensatória" é o nome que se dá a fechamento de três fábricas de cerveja, quatro de refrigerantes e suspensão de quatro contratos de franquia, redução do número de empregados, mudança na correlação de forças com os distribuidores e fornecedores, redução dos investimentos em promoção. Poderia se justificar se houvesse ganhos para o consumidor (na forma de melhores preços ou qualidade) ou para o país (na forma de mais investimento).
Não se minimize a competência administrativa do grupo, mas tudo o que o monopólio permitiu de geração de caixa foi investido na aquisição de cervejarias no exterior para engordar o preço na AmBev na hora da venda do seu controle. O ganho foi exclusivo dos controladores e, em proporção menor, dos minoritários. Usaram o monopólio para agregar valor à empresa, para vendê-la.
E o que diz Gesner sobre o consumidor e a concorrência? "Não há dano para a concorrência se uma empresa se torna mais eficiente e, pela sua dimensão, é capaz de racionalizar suas compras, produção e lançamentos em escala mundial", escreve. Ora, uma empresa pode ser tudo isso e causar dano à concorrência. E ele está falando de uma empresa cujo controle acabou de ser vendido.

Compromisso
A propósito do termo de compromisso firmado com o Cade, não existe a obrigatoriedade de não vender o controle da AmBev por dez anos. A promessa limitou-se a uma declaração de Marcel Telles, sem valor legal.
Na correspondência enviada, o diretor jurídico da AmBev explica que não ocorreu "operação de venda de empresa, mas uma transferência de controle por meio de permuta de ações".
Explica também que o preço pago pela Labatt correspondeu a 11,4 vezes o Ebitda das operações da empresa. Os 10,1 mencionados pela AmBev correspondem ao múltiplo após os ganhos de sinergia.

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