São Paulo, terça-feira, 09 de março de 2004

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Papéis do país podem ser afetados ainda mais

CÍNTIA CARDOSO
DE NOVA YORK

Desprestigiado desde o "default" do país em 2001, o mercado da dívida argentina poderá sofrer mais um abalo, caso o país decida não pagar a parcela do acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional) que vence hoje.
Segundo Arturo Porsecanski, economista-chefe de mercados emergentes do banco ABN Amro, os poucos investidores que ainda investem em títulos soberanos argentinos poderiam se ver ainda menos atraídos por esses papéis. "Uma nova moratória afetaria o mercado de ações, de títulos e de moedas do país", disse.
Mesmo sem uma nova moratória, os investidores internacionais têm diminuído as posições no país em decorrência da queda-de-braço trimestral entre a Argentina e o FMI. O Emerging Markets Bond Fund, que tem US$ 24,7 bilhões aplicados em bônus dos mercados emergentes, diminuiu a fatia argentina no bolo da alocação de recursos do grupo. Em janeiro, os papéis argentinos tinham 2,5% de participação no total. Em fevereiro, essa participação recuou para 1,3%. Em 2000 (antes da moratória), essa fatia chegou a 20%.
A corretora Pimco (Pacific Investment Management Company) retirou todas as posições em papéis soberanos do país antes da moratória em 2001. A Pimco administra uma carteira de US$ 370 bilhões em títulos da dívida de emergentes. Segundo Mohamed El-Erian, analista de mercados emergentes da instituição, não há ainda motivação para retornar ao mercado argentino.
Walter Molano, da BCP Securities, também afirma que a forma de a Argentina negociar com o FMI tem fechado as portas do mercado internacional. Nos últimos dias, representantes do governo argentino afirmaram que o pagamento ao FMI está vinculado à renovação do acordo com o Fundo. Esse discurso, fortemente encorajado pelo presidente Néstor Kirchner, tem sido visto por Wall Street como uma estratégia populista para atrair a simpatia da população argentina. A tática, porém, causa efeito contrário nos investidores internacionais.
"O dilema para Kirchner é que ele acredita que, se mudar a atitude com relação ao FMI, vai fazer um papel ridículo", disse Molano. "Para melhorar o acesso ao crédito externo, o governo vai ter que encerrar essa luta com o FMI, renegociar a dívida e fazer acordo com os seus credores. Depois disso, é só deixar as areias do tempo cobrir o passado de moratória."
Para Porsecanski, além de populismo, há certa dose de má vontade da Argentina em lidar com os credores. "Por razões políticas, Kirchner escolheu não pagar os credores. Ele não parece muito disposto a negociar", diz.
Em carta publicada ontem no "Wall Street Journal", o ministro das Relações Exteriores da Argentina, Rafael Bielsa, rebateu esse tipo de acusação. "Nós temos avançado na renegociação da dívida com credores privados, que é um processo altamente complexo devido à enormidade das obrigações envolvidas", escreveu.


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