São Paulo, sexta-feira, 09 de abril de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

A volta da dinheirama


Está barato para o Brasil tomar empréstimos lá fora; país pode se lambuzar de tanto comer melado

A BOLSA de Valores brasileira continua a resistir às insinuações de que vive uma bolhinha, de que já está cara demais. Investidores não residentes ("estrangeiros") voltaram a não se intimidar e ajudam a soprar a suposta esferinha de água e sabão.
A Bovespa voltou ao nível mais alto desde meados de 2008. Ou seja, antes da explosão da crise econômica, quando havia inflação de commodities, os preços de nossas exportações de produtos básicos iam à Lua e crescíamos a 7%.
Os bancos brasileiros jamais tomaram tantos empréstimos em dólar como no primeiro trimestre deste ano. Ontem, o Itaú captou US$ 1 bilhão a 6,2% ao ano, dizem, o que dá menos de 2,4 pontos percentuais acima dos títulos americanos. Faz um mês, ouvia-se de executivos de bancos brasileiros que eles estavam com muito dinheiro queimando na mão, faltando mesmo é cliente seguro para emprestar.
As taxas médias de juros para empréstimos privados de países emergentes são as menores desde o final de 2007. Estão mais ou menos três pontos percentuais acima das dos títulos do governo americano de prazo de dez anos, em tese o negócio mais seguro do mundo. Economistas de bancões americanos e europeus não param de revisar para cima suas estimativas do volume de empréstimos para países emergentes.
Em breve, o governo brasileiro deve ir ao mercado internacional "testar" a receptividade para os títulos da dívida brasileira. Na verdade, o Tesouro brasileiro vai ser bem recebido. O objetivo do governo será estabelecer um novo "piso" para os tomadores nacionais de empréstimos no exterior, firmar uma nova taxa de referência.
Em dezembro de 2009, o Tesouro brasileiro tomou US$ 500 milhões emprestados por dez anos, a uma taxa (rendimento) de 4,75% para os investidores. A menor da história para títulos de dívida pública externa em dólar. Em maio, a taxa fora de 5,3%.
Um relatório do Institute of International Finance (IIF), do final de janeiro, cantava as óbvias condições favoráveis para a dinheirama. O IIF é a associação mundial dos bancos.
Dizia o texto que o crescimento dos emergentes será maior do que o do mundo rico, bidu. Deficit e dívidas públicas do mundo euroamericano são vergonhosamente altos em relação até aos do Brasil. O custo da dívida pública (juros) em termos de PIB se aproxima dos nossos.
Dado tal estado das finanças de governos e do setor privado de países ricos, ficou pois um tanto abalada a ideia de que os mercados emergentes eram muito rentáveis, mas muito mais arriscados.
De resto, as taxas de juros no mundo rico, dado o estado lastimável de suas economias, vão ficar baixas por um longo período. As do mundo emergente, Brasil inclusive, vão subir, pois as economias estão bem aquecidas. O diferencial de juros (maiores aqui, menores lá fora) deve atrair mais dinheiro para cá.
Esse pode ser um jeito de financiarmos nosso crescente deficit externo. Pode ser também um jeito de nos iludirmos que esse fluxo é estável e dirigido para os investimentos de que precisamos (e não para consumo). E podemos passar mal de comer tanto melado.

vinit@uol.com.br


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