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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Desvalorização cambial na China ainda preocupa
GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas
Em entrevista que será publicada
amanhã na revista "Conjuntura
Econômica" (da Fundação Getúlio
Vargas), o economista Sergio Werlang, diretor de Política Econômica do Banco Central, menciona a
desvalorização cambial na China
como um dos eventos que podem
voltar a abalar o sistema financeiro
internacional nos próximos meses.
Uma boa questão é saber porque
a China resistiu tão bem, até agora,
às crises asiáticas e em outros mercados emergentes.
A resposta, entretanto, pode estar numa característica do sistema
financeiro chinês que é oposta ao
princípio de ampla liberdade de
capitais que o próprio Werlang defende nessa mesma entrevista.
Há hoje praticamente um consenso de que a capacidade chinesa
de se isolar da crise deve muito ao
controle sobre os fluxos de capitais, especialmente sobre o endividamento externo.
Como a China é uma máquina de
gerar divisas, usando práticas comerciais igualmente heterodoxas,
fica difícil ocorrer um ataque especulativo contra sua moeda.
A receita do sucesso chinês é portanto bastante simples: muitas reservas internacionais em caixa e
dívida externa baixa.
Um detalhe institucional, entretanto, ajuda a entender a dificuldade que os investidores teriam para
atacar a moeda chinesa. O governo
simplesmente impede o funcionamento de um mercado futuro na
moeda local (o renimbi).
Para alguns analistas econômicos, um dos problemas da China
seria o sistema bancário, tão bichado quanto os de muitos congêneres asiáticos, com bancos fracos e
empréstimos a empresas estatais
em dificuldades.
Ainda assim, o controle de capitais chinês funcionou nos últimos
anos como um bloqueio ao endividamento externo desses bancos.
As reservas internacionais do país
chegaram a US$ 149 bilhões no final do ano passado, para uma dívida externa total da ordem de US$
130 bilhões.
Resta saber se as informações
disponíveis são confiáveis. No final de 1997, as autoridades chinesas reconheciam uma dívida externa bancária de US$ 40,3 bilhões. As
estatísticas do Banco de Compensações Internacionais mostram
um total de quase US$ 90 bilhões
registrado pelos bancos.
É uma discrepância razoável e
lembra a situação coreana, cujo
governo ou não sabia ou escondia
o valor real da dívida externa.
No caso da China, as dúvidas sobre exatidão ou confiabilidade dos
dados afetam praticamente todas
as estatísticas econômicas.
Mas talvez o fato mais relevante
para avaliar os riscos de uma desvalorização cambial na China não
seja de ordem financeira. Em outros casos de crise cambial na Ásia,
a origem do colapso em geral esteve numa onda de fuga de capitais
ou numa acentuada fragilidade financeira.
A China está isolada desse tipo de
risco, mas nada impede que o governo chinês queira desvalorizar a
moeda. Não para evitar uma crise
de balanço de pagamentos (o país
tem superávit em conta corrente e
investe o excedente em títulos do
governo dos Estados Unidos), mas
para manter a China como potência exportadora, ampliando assim
sua capacidade de crescimento e
atração de investimento estrangeiro.
Em resumo, a China demonstrou
até agora uma clara resistência aos
movimentos especulativos, sobretudo porque seus sistema econômico está a léguas de distância da
receita de liberalismo adotada em
outros países da Ásia e da América
Latina. Mas nada impede uma desvalorização voluntária, decidida
com base em razões estratégicas e
políticas, principalmente se os
mais importantes mercados chineses, como o norte-americano, entrarem numa rota de desaquecimento nos próximos meses.
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