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São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2003

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RECEITA ORTODOXA

Ministro e Bird avaliam necessidade de superávit maior

Palocci admite elevar aperto fiscal se o cenário se agravar

GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) admite a possibilidade de o país ser obrigado a adotar um aperto fiscal ainda mais rígido que o de hoje -o que significaria elevar a meta para o superávit primário (economia destinada ao pagamento de juros).
Em negociações para um novo empréstimo do Bird (Banco Mundial) ao governo brasileiro, as duas partes trataram da possibilidade de o país aumentar a meta, que é de 4,25% do PIB (Produto Interno Bruto) até 2006.
Segundo um estudo realizado pelo organismo, a meta atual não será capaz de estancar o crescimento da dívida pública se o Brasil passar por mais e -diante do ambiente externo muito desfavorável- nada improváveis turbulências financeiras.
Em simulações com diferentes graus de probabilidade, o trabalho calcula os níveis de superávit necessários em cenários mais adversos que os previstos nos documentos oficiais. Os resultados vão de 4,6% a 5,8% do PIB.
Em carta à instituição, de 9 de maio, Palocci diz considerar que o superávit atual bastará para reduzir a dívida pública de 56% para 50% do PIB no governo Lula. Palocci mostra sintonia, porém, com as preocupações do Bird.
"Com as metas anunciadas de 4,25% do PIB para o superávit primário, acreditamos que o objetivo intermediário relativo à relação dívida/PIB [50%] pode ser alcançado nos próximos três anos. Entretanto, se circunstâncias inesperadas levarem a desvios nessa trajetória, medidas de correção serão tomadas", escreve.
Essas "circunstâncias inesperadas" não são propriamente inesperadas, na avaliação que o Bird anexou aos documentos referentes ao empréstimo de US$ 404 milhões ao Brasil, examinado no mês passado -com o objetivo, aliás, de promover aperfeiçoamentos da política fiscal.

Vulnerabilidade
"Apesar dos consideráveis ajustes nas contas externas e fiscais nos anos recentes, reduzir as vulnerabilidades remanescentes levará tempo. Riscos macroeconômicos substanciais permanecerão por algum tempo", diz o Bird.
O Banco Mundial começa suas simulações adotando premissas semelhantes às dos documentos oficiais da Fazenda: estabilização da taxa de câmbio, redução gradual dos juros a partir deste ano e mais crescimento do PIB a partir de 2004. Nesse cenário, como nas projeções da Fazenda, a dívida pública segue uma trajetória de queda contínua até chegar aos desejados 50% do PIB em 2006.
"A simulação básica acima ignora, no entanto, o fato de que a economia brasileira é sujeita a choques aleatórios", diz o trabalho. Isso explica, conclui-se, por que a política de superávits primários iniciada em 1999 fracassou em reduzir a dívida pública.
O passo seguinte é incorporar a probabilidade de diferentes graus de turbulência aos cálculos. No pior cenário, seria preciso um superávit de 5,8% do PIB para obter os resultados prometidos por Palocci. No jargão técnico, esse cenário tem intervalo de confiança de 10% -em outras palavras, o superávit calculado teria 90% de chances de atingir os objetivos.
Usando um intervalo de confiança de 15%, o superávit necessário é de 5,3% do PIB; com intervalo de 25%, o superávit seria de 4,6%. O estudo esclarece que tais intervalos não chegam a ser rígidos para simulações desse tipo.
O que se pretende dizer é: em uma economia dependente de capital externo, com juros altos, câmbio volátil e baixo crescimento, dificilmente se pode contar com cenários em que todas essas variáveis sigam o comportamento desejado por prazos longos.
Os cenários pessimistas do organismo divergem dos já apresentados em documentos do governo -nestes últimos, a dívida sofre uma elevação inicial, mas volta à trajetória de queda sem necessidade de elevar o superávit.

Riscos
Em outro cálculo, o Bird faz uma relação entre o nível da dívida pública, o superávit primário e o risco-país. No cálculo, o superávit brasileiro é compatível com uma dívida pública em torno de 50% e um risco de 700 pontos. Para um risco menor, são precisos superávits maiores.
Em termos concretos, o Bird enumera os riscos que rondam a economia brasileira: "A vulnerabilidade externa continua uma preocupação. A experiência recente mostrou as dificuldades de um acesso difícil aos mercados externos. Depreciação do real, inflação mais alta, interrupção na queda dos juros e crescimento mais baixo geraram uma dinâmica perversa para a dívida pública, que piorou ainda mais o acesso ao mercado externo".
"Pelo lado interno", diz o texto, "os riscos principais vêm do alto nível de inflação e da incerteza em relação ao destino das reformas propostas pelo governo".


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