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São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

Da luta das mulheres à batalha pelo 1º emprego

AMALIA SINA

Muito tem se falado da questão das cotas que garantem o acesso das minorias raciais, sociais e sexuais em empresas, instituições de ensino e órgãos públicos. O assunto despertou a sociedade recentemente, com a adoção de medidas de afirmação nas universidades cariocas. As minorias exigem -e merecem- espaço, e poucos questionam esse fato. No entanto temos encontrado uma sociedade dividida, longe de ter opinião homogênea quanto ao assunto. Não pretendo entrar na questão de serem ou não justas as cotas, serem ou não estes mecanismos legais uma forma de "preconceito ao contrário", como dizem muitos. O que quero dizer é que, antes mesmo de pensar em cotas, é imprescindível fazer a sociedade entender que pode crescer com a inclusão daqueles que em algum aspecto -seja ele social, racial, sexual etc.- são diferentes da maioria.
No mundo empresarial, assim tem sido com as mulheres. Quando entramos no mercado, trazendo nossa bagagem cultural, muito diferente da do homem, enriquecemos o jeito de fazer negócios. Não que o mercado de trabalho seja machista: jamais sofri preconceito por ser mulher. Na verdade, o mundo dos negócios sempre foi, e ainda é, muito masculino. É preciso entender que as mulheres trouxeram ao sistema seu "jeito", sua maneira de ser. Foi preciso que a mulher mostrasse ao homem que ela possuía muitas habilidades que poderiam ser aplicadas com sucesso nas corporações e que o mercado estivesse interessado em abrigar essas diferenças.
A diversidade é enriquecedora, pois cria situações que um espaço monótono é incapaz de criar. Colocar pessoas diferentes em um mesmo ambiente cria uma situação propícia à troca, à evolução, por meio da diferença. Toda vez que você encontra um ambiente, principalmente de negócios, no qual as pessoas são muito parecidas o nível de criatividade é menor. Empresas diversificadas evoluirão como nichos ecológicos do nível da Amazônia ou do Pantanal, ricos em variedade de espécies, em biodiversidade.
No entanto poucas empresas estão evoluindo no sentido de buscar o crescimento na diversidade. Mesmo quando pensamos na entrada das mulheres no mercado, a batalha não pode ser considerada ganha. Se hoje temos 30% dos cargos de trabalho de todo o mundo ocupados por mulheres, o mesmo não é verdade quando pensamos apenas nos cargos executivos, nos quais as decisões efetivas das empresas são tomadas. Infelizmente, apenas 5% desses postos estão nas mãos de mulheres, segundo pesquisa do grupo Catho. É muito pouco. Significa que ainda não estamos conseguindo mesclar nossas características próprias com o modo de fazer negócios das corporações. Significa que, em boa parte dos casos, ainda jogamos de acordo com regras estritamente masculinas.
O que nos leva a outra questão: estariam as empresas preparadas para acolher esse universo de diferenças? Em alguns casos, podemos dizer com muito orgulho e otimismo que o caminho correto já foi tomado. A empresa na qual trabalho, por exemplo, admitiu em seu primeiro relatório de balanço social que há a necessidade de diversificar a característica de seus gestores. O plano é aumentar o número de mulheres nos cargos executivos de 4% para 10% nos próximos anos, além de desenvolver políticas de absorção da cultura local nas filiais do grupo holandês espalhado pelo mundo.
No entanto ainda há diversos percalços nessa jornada. Muitas companhias não têm ao menos o básico para permitir a integração das minorias. Tomemos o caso dos deficientes físicos, que, amparados pela lei, estão conquistando com justiça o espaço que lhes é devido. O triste é perceber que muitas empresas não se deram nem ao trabalho de adaptar seus ambientes às necessidades desses novos trabalhadores. As construções em si já são preconceituosas, despidas de rampas, banheiros especiais, elevadores etc. O mercado, ao incorporar essas pessoas, tem que assumir a responsabilidade de tratá-las com dignidade e respeito.
Chego, enfim, a um ponto da maior importância. Muito se fala em estabelecimento de cotas para minorias, mas não se pensa numa grande maioria que sofre muito preconceito. Os jovens, em busca de seu primeiro emprego, deparam com exigências excessivas, um verdadeiro entrave ao ingresso no mercado de trabalho, principalmente em tempos de crise. Não há empregos para quem não tem experiência, e não se adquire experiência sem que se conquiste um emprego. Apóio o projeto que o governo federal pretende implantar em todo o país, criando estímulos para que as empresas adotem esses jovens e dêem a eles a primeira oportunidade, quebrando o círculo vicioso da falta de experiência. Os jovens, com sua visão de mundo mais fresca e recente, também têm muito a oferecer ao mercado. É bom que as empresas estejam prontas para lucrar com essa incorporação.


Amalia Sina, presidente da Walita, é professora universitária e autora do livro "Marketing Global - O Desafio de Construir Uma Marca em Tempos de Globalização" (Crescente Editorial), além de outros dois livros sobre marketing.


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