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São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2003

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RECEITA ORTODOXA

Apenas 61% da arrecadação poderá ser destinada a quitar débito; restante está vinculado a despesas

Economia para pagar dívida tem limites

SÍLVIA MUGNATTO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Apesar do grande esforço que o governo vai fazer neste ano para economizar recursos de impostos para pagar dívidas, apenas 61% do total da economia poderá efetivamente ser usado para esse fim.
A estimativa foi calculada pelo Ministério do Planejamento em um estudo sobre vinculações de receitas e de despesas fechado em fevereiro deste ano. Cerca de 40% do esforço fiscal não poderá ser usado para abater dívidas porque os recursos estão vinculados a outras despesas.
Segundo o estudo, 80,3% das receitas orçamentárias estão destinadas ao pagamento de despesas específicas.
"Assim, os recursos restantes do resultado primário ficam esterilizados, servindo apenas para aumentar a disponibilidade de caixa do Tesouro e, indiretamente, reduzir a dívida líquida da União", diz o estudo. É que o cálculo da dívida líquida exclui o que o governo tem a receber e o que está no caixa do Tesouro.
Para o ministério, é preciso melhorar a qualidade do resultado primário (saldo das receitas utilizadas para o pagamento de juros), evitando o superávit fictício. O modelo atual, segundo o estudo, "cria uma falsa idéia de maior disponibilidade de recursos do Tesouro".
Para este ano, o governo federal pretende economizar R$ 39,1 bilhões do Orçamento para compor o superávit do setor público (agrega Estados, municípios e estatais) de R$ 68 bilhões.

Obrigatoriedade
Existem vinculações de receitas e de despesas. De acordo com o Ministério do Planejamento, ao retirar todas as vinculações do Orçamento de R$ 406,4 bilhões (Receita Federal e Previdência Social) previsto para 2003, sobram apenas R$ 20 bilhões, ou menos de 5% do total. Ou seja, esse é o total sobre o qual o governo tem poder de decisão sobre seu destino.
A Folha apurou que o ministro Guido Mantega (Planejamento) pretendia utilizar a emenda da reforma tributária para estabelecer algumas desvinculações de receita, mas acabou prevalecendo a tese de que o texto deveria ser menos complexo.
A emenda apenas prevê a prorrogação da DRU (Desvinculação das Receitas da União), que acabava no final deste ano, para 2007. O mecanismo desvincula 20% das receitas orçamentárias (descontadas as transferências para Estados e municípios).
Mas o estudo afirma que é necessária uma desvinculação maior porque a DRU também sofre com o total de despesas obrigatórias. Hoje, a DRU abrange R$ 45,7 bilhões. Entretanto, desse total, apenas R$ 7,3 bilhões não estão destinados a despesas intocáveis, como pessoal, saúde e benefícios previdenciários.
Segundo o ministério, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi interessante ao estabelecer que a expansão dos gastos obrigatórios depende do aumento de receitas ou do corte permanente de outras despesas.
Mas a mesma lei determina que as receitas vinculadas só podem ser utilizadas para seu fim específico mesmo que os gastos aconteçam em outros anos. "Intensificou o problema das vinculações orçamentárias", comenta o estudo do Planejamento.
É o que vinha acontecendo, por exemplo, com a receita de alguns fundos, como o de Combate à Pobreza e o de Universalização dos Serviços de Telecomunicações. A receita desses fundos passou de um ano para o outro por causa de contingenciamento ou baixa execução orçamentária.

Constituição
A vinculação de receitas aumentou com a Constituição de 1988. Até aquele ano, o governo podia gastar livremente 55,5% das receitas. Já em 1993, esse total havia caído para 22,9%. Em 2003, a previsão é que esse número seja de apenas 19,7%.
A Constituição criou a vinculação de 18% para a Educação e destinou os recursos das contribuições sociais ao financiamento da seguridade social. Além disso, estabeleceu os mecanismos de transferências automáticas para Estados e municípios.
Depois da Constituição, foram criadas a CPMF (imposto do cheque) e a Cide (contribuição sobre o consumo de combustíveis), ambas com vinculações específicas.
O governo também contribuiu para aumentar o grau de vinculação ao preferir aumentar a carga tributária por meio de contribuições sociais.
Essa preferência foi motivada pelo fato de que essas contribuições não precisam ser divididas com os Estados e os municípios, como ocorre com os impostos.

Contribuições
A participação das contribuições aumentou de 4,6% do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas produzidas no país) em 1995 para 7,7% em 2002.
Pelo lado das despesas, houve um aumento expressivo dos gastos com benefícios previdenciários assistenciais e para pessoas que não contribuíram regularmente, como é o caso dos trabalhadores rurais.
Outra inovação foi a emenda que fez as despesas com saúde acompanharem, no mínimo, a variação estimada do Produto Interno Bruto.


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