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São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2003

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ELETRÔNICA

Remanescente da abertura dos anos 90, Semikron defende incentivo para fabricação de produtos de maior valor agregado

Sobrevivente do chip quer isenção de imposto

Eduardo Knapp/Folha Imagem
José Luiz Lopes, da Semikron, uma das duas únicas fabricantes de chips do país; empresa pede isenção de impostos para insumos


LÁSZLÓ VARGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Enquanto o governo tenta convencer grandes multinacionais a instalarem uma fábrica de chips de microeletrônica no país, uma empresa de Carapicuíba (Grande São Paulo) acompanha o assunto, à distância, com grande interesse.
A Semikron fabrica, desde 1963, chips de potência, que controlam a energia elétrica que circula em aparelhos como rádios, televisores, máquinas de lavar e elevadores. Ligada ao grupo alemão Semikron, sobreviveu à abertura brasileira às importações, iniciada em 1990. É uma das duas fábricas de chips no Brasil.
O governo quer atrair para o país uma fábrica de chips de microeletrônica para reduzir o déficit comercial (as fábricas de televisores e rádios, por exemplo, gastam muito com importações de componentes).
Os chips de potência da Semikron funcionam para uma tarefa específica e são diferentes daqueles de microeletrônica, que exercem várias funções.
José Luiz Lopes, diretor administrativo da Semikron, diz, porém, que as medidas para estimular a produção dos dois chips no Brasil são semelhantes.
Nesta entrevista, ele diz que o governo deveria isentar de impostos a importação de insumos, o que permitiria a fabricação local de componentes com maior valor agregado.

Folha - O plano do governo de trazer uma grande indústria de chips de microeletrônica é viável?
José Luiz Lopes -
Um dos problemas é garantir escala de produção. A demanda interna para a Semikron, por exemplo, não atende suas necessidades. Para sobreviver, é preciso exportar. Minha estimativa é que uma indústria de chips de microeletrônica teria de exportar cerca de 90% de sua produção para justificar um investimento de US$ 1,5 bilhão [estimado pelo governo]. Para que isso dê certo, o governo precisa criar uma política industrial.

Folha - Qual política industrial?
Lopes -
A Zona Franca de Manaus estimula hoje a importação de componentes, pois o governo exige pouco índice de nacionalização. Para que a indústria de semicondutores e de microeletrônica se desenvolva, são necessários incentivos. Não falo de subsídios. Os impostos de importação para insumos, como as lâminas de silício, são em média de 10% hoje. Deveriam ser zerados, se o governo quiser incentivar a criação de indústrias de semicondutores.

Folha - Por exemplo?
Lopes -
Os fornos de difusão, usados em etapas de preparo de chips. Para fazer um chip, é preciso adicionar à placa de silício materiais como fósforo, alumínio e ouro, o que exige altas temperaturas. Os fornos usados para isso não são fabricados no Brasil.

Folha - Isso não desestimularia a vinda de indústrias de máquinas sofisticadas para o Brasil?
Lopes -
Não. Essas indústrias fazem equipamentos muito específicos. Nenhum grupo industrial construiria uma fábrica de fornos para semicondutores no Brasil. Isso exigiria muito dinheiro. Não defendo a importação de produtos usados, como pneus, que são fabricados no Brasil. Há equipamentos específicos usados e de última geração em fábricas na Europa e que não são utilizados por falta de encomendas. Eles poderiam chegar ao Brasil por um valor equivalente a 30% do preço original. A tributação sobre o lucro das empresas também não estimula a indústria de chips.

Folha - Qual o motivo?
Lopes -
Se o governo pretende estimular a indústria de semicondutores, deveria isentar de imposto o lucro não distribuído. Ele seria reinvestido na pesquisa tecnológica, na produção ou no capital de giro. Isso é comum em países que decidem estimular o desenvolvimento de determinados setores. Acho também fundamental que o governo ofereça às indústrias linhas de crédito compatíveis com o mercado internacional.

Folha - Esse dinheiro viria do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social]?
Lopes -
Deveria ser do BNDES, pois é o agente incentivador da indústria. Mas a taxa de juros que o BNDES cobra hoje é incompatível com a realidade lá fora. Por mais barata que seja, por volta de 17% ao ano, é incompatível com os 3% a 5% cobrados nos Estados Unidos e na Europa. A Semikron não usa dinheiro do BNDES hoje porque é muito caro. Chegou a fazer isso nos anos 80, quando o banco cobrava somente parte da correção monetária.

Folha - Quais produtos a Semikron fabrica?
Lopes -
Fabrica semicondutores de potência, ou chips de potência, para a indústria de rádios, de televisores e de máquinas de lavar, por exemplo, e para máquinas de outras empresas. Até o início dos anos 90, grandes multinacionais, como a Texas Instruments, a Philips e a Siemens, produziram chips de potência no país. Com a abertura do mercado, feita de modo desorganizado pelo então presidente Fernando Collor, elas fecharam suas fábricas de chips. A política cambial do governo Fernando Henrique Cardoso também não ajudou.

Folha - Quais são seus clientes?
Lopes -
Cerca de 60% da produção é exportada para Alemanha, Suécia, Estados Unidos, Japão e outros países. Ao todo, são mais de 30 países, e 40% da produção é vendida para empresas no Brasil.

Folha - A empresa dá lucro?
Lopes -
Sim. O lucro atualmente é de 7% do faturamento. A receita no ano passado foi de R$ 50 milhões [lucro de R$ 3,5 milhões]. Mas a Semikron trabalha com a metade da sua capacidade. Falta para a companhia mais escala de produção, pois a demanda interna pelos produtos é muito fraca.

Folha - A abertura das importações foi prejudicial à empresa?
Lopes -
Antes da abertura a empresa chegou a faturar US$ 30 milhões por ano. Hoje, fatura cerca de US$ 20 milhões por ano. A empresa passou por sérias dificuldades de 1990 a 1999.



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