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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Para o bem e para o mal
"É a economia, estúpido", expressão que fez tanto sucesso nos EUA, passou a explicar empolgação de ricos e pobres com o governo Lula
O LEITOR desta coluna deve se
lembrar da reação da esquerda, petista ou não, quando o
ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso pediu a todos que esquecessem o que ele tinha escrito no passado. Referia-se às criticas que faziam
a ele em razão de algumas de suas
posições no exercício do poder político no Brasil. Principalmente na definição dos novos rumos na gestão
da economia que seu governo começava a implantar com muita clareza.
Durante os oito anos de FHC, mas
principalmente durante a campanha eleitoral de 2002, Lula e seus
correligionários desancaram esse
modelo econômico, que denominavam de neoliberal. Mas a crise criada
nos mercados financeiros pelo medo
de um PT coerente com seus valores
históricos no poder fez Lula e seu
partido mudarem de posição. Pelas
mãos de Palocci fizeram um acordo
de convivência com o Brasil econômico e mantiveram inalterados os
marcos da política de seu tão criticado antecessor.
Como é o padrão petista de se relacionar com a opinião pública -hoje
o conhecemos muito bem-, mantiveram o discurso crítico a FHC com
a mão esquerda enquanto geriam a
economia com a mão direita de Palocci. Para o público interno, a explicação era que se tratava de um movimento tático para lidar com o nervosismo dos mercados financeiros.
Uma vez acalmados os ânimos, o governo retomaria os compromissos
do 12º Encontro Nacional do PT realizado em Recife em 16 de dezembro
de 2001 -que definiu com clareza
uma ruptura com o passado burguês
e neoliberal dos tucanos.
Mas a vida, que é muito divertida,
sempre preparada para aprontar armadilhas para quem dela participa
como ator, tinha outros planos para
Lula. Em 2003, primeiro ano de seu
mandato, iniciou-se um vigoroso ciclo de crescimento no mundo. Estimulado inicialmente pelo vigor da
economia chinesa, teve seu ponto
mais forte na recuperação da economia americana em função da política
de juros baixíssimos aplicada pelo
Federal Reserve. Na esteira desse ciclo, países como o Brasil viram os
preços de seus principais produtos
de exportação aumentarem de forma quase explosiva. Os dólares obtidos com as exportações mudaram a
cor de suas contas correntes externas -de um vermelho de sangue para um azul de céu de brigadeiro.
Com a segurança trazida por esse
novo vigor nas contas externas das
chamadas nações emergentes, os investidores financeiros passaram a
destinar centenas de bilhões de dólares para esses países. Um clima de
quase euforia tomou conta de todos
e as dificuldades estruturais do passado passaram a ser vistas como pequenas rugas nas faces avermelhadas de vigor de economias como a
brasileira. Embalados por esse otimismo e pelo crescimento econômico puxado pela extraordinária expansão da economia mundial, os novos dirigentes em Brasília esqueceram suas críticas e suas propostas de
ruptura com o passado e navegaram
com as velas infladas pelos ventos favoráveis da economia mundial.
Tudo dava certo, novos gênios
econômicos apareceram e nosso
presidente, agarrado ao balão de
nossa moeda forte, virou quase um
deus para os mais pobres. Nesse cenário róseo, nem as falcatruas descobertas, nem as promessas esquecidas sem a menor vergonha, nem o
festival de gastos públicos sem critérios racionais e as instituições em
frangalhos tiram o brilho de nosso
presidente falastrão. A expressão
que tanto sucesso fez nos Estados
Unidos -"é a economia, estúpido"-
passou a ser citada para explicar essa empolgação de ricos e pobres com
o governo Lula.
Mas a grande maioria não percebeu que tudo isso acontecia enquanto o ciclo econômico no mundo
amadurecia e a hora de seu fim se
aproximava. Não tenho dúvida de
que o tempo da euforia sem sentido
ficou para trás. Vivemos hoje as angústias e as incertezas de como será
a fase de acomodação do ciclo que
termina: suave ou aos trancos e barrancos, como se dizia antigamente
na Pouso Alegre da minha juventude. A resposta a essa pergunta está
nas mãos do Federal Reserve, hoje
dividido entre pombas e falcões e
sem a credibilidade de Greenspan.
Mas não conte isso ao nosso presidente, pois vai estragar sua vã felicidade.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 63, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e ministro das Comunicações
(governo FHC).
@ - lcmb2@terra.com.br
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