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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
A turma da bufunfa cansou
Com o crescimento, o risco é
que a turma da bufunfa
consiga pressionar o BC
a frear a queda do juro
CHEGUEI AO Brasil na semana
passada e li nos jornais que a
elite se declara "cansada". Fiz
então uma rápida pesquisa sociológica e constatei que, de fato, a turma
da bufunfa está totalmente exausta.
Há motivos para essa exaustão?
Talvez. Os bufunfeiros já tiveram
momentos mais brilhantes e mais
exaltados. A taxa de juro, por exemplo, continua muito alta, mas não é
mais a mesma. Segundo levantamento da Uptrend Consultoria Econômica, a taxa básica de juro caiu
para 7,7% em termos reais. De março a julho de 2003, a taxa real básica
superava 16%. Entre abril e outubro
de 2005, ela ficou acima de 13%.
Bons tempos... A turma da bufunfa
ficou na saudade.
Com a última redução de 0,5 ponto percentual determinada pelo Copom (Comitê de Política Monetária
do BC), o Brasil perdeu para a Turquia a liderança mundial em matéria de juros reais. A remuneração de
alguns fundos de investimento começou a se aproximar perigosamente do rendimento da aplicação popular -a modesta caderneta de poupança. Bufunfeiro que se preza jamais aceitará tal nivelamento.
Mas, convenhamos, a turma da
bufunfa precisa moderar suas queixas. Nosso juro real básico ainda é
mais de três vezes superior à média
mundial. Os bancos continuam registrando lucros gordos, diria mesmo, obscenos. Graças à expansão do
crédito, aos elevados "spreads" e às
pesadas tarifas cobradas da clientela
indefesa, os estabelecimentos bancários exibem extraordinária rentabilidade. Devem (ou deveriam) estar
exultantes, e não "cansados".
Com a ampliação do crédito e a
queda dos juros, a economia passou
a crescer mais rapidamente. No primeiro semestre, a indústria cresceu
quase 5% em relação a igual período
do ano passado. As projeções para o
PIB estão sendo revistas para cima.
O risco agora é que a turma da bufunfa consiga pressionar o Banco
Central a frear a queda do juro. Na
imprensa, já surgiram economistas
bufunfeiros, ligados aos bancos, proclamando que o "forte" crescimento
da indústria confirma os temores do
Copom de que a economia está mais
aquecida do que se esperava.
Mas seria um erro reduzir o ritmo
de queda dos juros ou, pior ainda, interromper o processo de diminuição
da Selic. A economia apenas começa
a reagir. Não há indícios de pressão
exagerada da demanda sobre a capacidade instalada. Essa última tem
aumentado em razão da recuperação dos investimentos. A inflação e
as expectativas de inflação estão
controladas. Uma posição restritiva
do BC agravaria o problema da excessiva valorização cambial, ressaltado por Benjamim Steinbruch em
sua coluna na Folha de anteontem.
Vamos ver como se comporta o
Banco Central. Temos motivos para algum otimismo. Afinal, as mudanças recentes na diretoria do BC
parecem ter arejado um pouco o
ambiente por lá.
Por fim, uma nota de caráter estritamente pessoal. Eu estava, confesso, com uma certa saudade da
turma da bufunfa e das suas manifestações pitorescas. Em Washington, os ruídos da bufunfa tupiniquim não repercutem.
E as suas contrapartes nos Estados Unidos são bem mais discretas.
Não imagino, por exemplo, que o
presidente da subsidiária da Philips nos Estados Unidos se animasse a congregar patrocinadores de
eventos e publicitários para lançar
um "convite à meditação", de caráter "apartidário", em protesto, digamos, contra a guerra no Iraque
ou o colapso de pontes. O companheiro Bush subiria pelas paredes.
Lá as companhias estrangeiras têm
que ser mais cautelosas.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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