|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VINICIUS TORRES FREIRE
Bancos puseram mais fogo na crise
Inovação financeira reduziu risco bancário e elevou ganhos, mas criou ameaças inéditas e obscuras para a finança global
|
"BANCOS NAS sombras" e estratégias financeiras exóticas multiplicaram os
efeitos da crise imobiliária dos EUA.
"Banco nas sombras" é um apelido
para entidades criadas a fim de multiplicar o volume de operações que
os bancos estão legalmente autorizados a realizar. Trata-se dos "conduits" e de "structured investment
vehicles" (SIVs, veículos de investimento estruturado), criados por
bancos e firmas de "private equity".
Os "conduits" emitem (vendem,
tomam empréstimo) "commercial
papers" (notas promissórias, papéis
de curto prazo) a empresas e investidores. Compram papéis de longo
prazo, como títulos lastreados em
dívidas de hipoteca ou CDOs ("collateralized debt obligations", obrigações de dívida garantida por ativos), papéis cuja rentabilidade e valor é
garantida por recebíveis, títulos de
dívida imobiliária e outras. Um objetivo de "conduits" e SIVs é ganhar
com a diferença entre a rentabilidade dos "commercial papers" e a dos
títulos de longo prazo.
Os bancos criam e administram os
"conduits", dos quais recebem taxas.
Tais transações não estão no balanço dos bancos, que assim podem extrapolar o limite legal de empréstimos e exposição a risco. Os bancos,
porém, cobrem os "buracos negros",
as eventuais perdas dos "conduits".
Esses instrumentos financeiros
facilitaram o direcionamento do dinheiro abundante para negócios de
risco, como hipotecas de segunda linha ("subprimes"). Mas a crise nunca foi mero problema imobiliário.
O crescente calote imobiliário, o
rebaixamento dos títulos lastreados
em hipotecas pela Moody's e o colapso dos "hedge funds" do Bear
Stearns (com US$ 20 bilhões de exposição a "subprimes") começaram
a disseminar o pânico em junho. Investidores correram a liquidar seus
fundos a fim de sacar seu dinheiro.
A fim de saldar compromissos
com os investidores, "hedge funds",
entre outros, liquidaram CDOs e títulos lastreados em dívidas, que se
desvalorizaram (isso quando se sabia seu preço, pois não há mercados
organizados para esses papéis). Tais
títulos eram a garantia que "conduits" e SIVs haviam oferecido a
quem investira em "commercial papers", mercado de mais de US$ 2 trilhões, metade garantido por ativos,
muitos hoje podres. Pouca gente está disposta a rolar esses "asset backed commercial papers". US$ 1 trilhão deles vencem em seis semanas.
Com títulos apodrecidos espalhados pelo planeta, bancos limitaram
empréstimos para outras instituições financeiras (por receio de emprestar a alguém quebrado). Juros
interbancários, risco e volatilidade
dispararam. O crédito de curto prazo para empresas escasseia.
Dados os recursos bancários comprometidos com o prejuízo de "conduits", fundos quebrados e papéis
podres, diminui o capital dos bancos
disponível para empréstimo e outros negócios. O crédito escasseia e
encarece: é o "credit crunch", por
ora moderado. A crise foi apenas
amenizada com os US$ 350 bilhões
que os bancos centrais da Europa e
dos EUA despejaram nos bancos.
Os bancos têm mais problemas.
Acertaram financiamentos de US$
230 bilhões para as LBOs ("leveraged buyouts", aquisições alavancadas por crédito) de firmas de "private equity" (participações e compra e
revenda de empresas). Os bancos repassavam tais créditos adiante. Agora, em caso de insucesso, vão perder taxas, micar seus balanços e dispor
de menos capital para crédito.
vinit@uol.com.br
Texto Anterior: Uma década após divisão do mercado, monopólio volta a preocupar os EUA Próximo Texto: Bolívia quer que Queiroz Galvão refaça obra Índice
|