São Paulo, domingo, 09 de setembro de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Bancos puseram mais fogo na crise


Inovação financeira reduziu risco bancário e elevou ganhos, mas criou ameaças inéditas e obscuras para a finança global

"BANCOS NAS sombras" e estratégias financeiras exóticas multiplicaram os efeitos da crise imobiliária dos EUA. "Banco nas sombras" é um apelido para entidades criadas a fim de multiplicar o volume de operações que os bancos estão legalmente autorizados a realizar. Trata-se dos "conduits" e de "structured investment vehicles" (SIVs, veículos de investimento estruturado), criados por bancos e firmas de "private equity".
Os "conduits" emitem (vendem, tomam empréstimo) "commercial papers" (notas promissórias, papéis de curto prazo) a empresas e investidores. Compram papéis de longo prazo, como títulos lastreados em dívidas de hipoteca ou CDOs ("collateralized debt obligations", obrigações de dívida garantida por ativos), papéis cuja rentabilidade e valor é garantida por recebíveis, títulos de dívida imobiliária e outras. Um objetivo de "conduits" e SIVs é ganhar com a diferença entre a rentabilidade dos "commercial papers" e a dos títulos de longo prazo.
Os bancos criam e administram os "conduits", dos quais recebem taxas.
Tais transações não estão no balanço dos bancos, que assim podem extrapolar o limite legal de empréstimos e exposição a risco. Os bancos, porém, cobrem os "buracos negros", as eventuais perdas dos "conduits".
Esses instrumentos financeiros facilitaram o direcionamento do dinheiro abundante para negócios de risco, como hipotecas de segunda linha ("subprimes"). Mas a crise nunca foi mero problema imobiliário.
O crescente calote imobiliário, o rebaixamento dos títulos lastreados em hipotecas pela Moody's e o colapso dos "hedge funds" do Bear Stearns (com US$ 20 bilhões de exposição a "subprimes") começaram a disseminar o pânico em junho. Investidores correram a liquidar seus fundos a fim de sacar seu dinheiro.
A fim de saldar compromissos com os investidores, "hedge funds", entre outros, liquidaram CDOs e títulos lastreados em dívidas, que se desvalorizaram (isso quando se sabia seu preço, pois não há mercados organizados para esses papéis). Tais títulos eram a garantia que "conduits" e SIVs haviam oferecido a quem investira em "commercial papers", mercado de mais de US$ 2 trilhões, metade garantido por ativos, muitos hoje podres. Pouca gente está disposta a rolar esses "asset backed commercial papers". US$ 1 trilhão deles vencem em seis semanas.
Com títulos apodrecidos espalhados pelo planeta, bancos limitaram empréstimos para outras instituições financeiras (por receio de emprestar a alguém quebrado). Juros interbancários, risco e volatilidade dispararam. O crédito de curto prazo para empresas escasseia.
Dados os recursos bancários comprometidos com o prejuízo de "conduits", fundos quebrados e papéis podres, diminui o capital dos bancos disponível para empréstimo e outros negócios. O crédito escasseia e encarece: é o "credit crunch", por ora moderado. A crise foi apenas amenizada com os US$ 350 bilhões que os bancos centrais da Europa e dos EUA despejaram nos bancos. Os bancos têm mais problemas.
Acertaram financiamentos de US$ 230 bilhões para as LBOs ("leveraged buyouts", aquisições alavancadas por crédito) de firmas de "private equity" (participações e compra e revenda de empresas). Os bancos repassavam tais créditos adiante. Agora, em caso de insucesso, vão perder taxas, micar seus balanços e dispor de menos capital para crédito.

vinit@uol.com.br


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