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CLISE GLOBAL
BCs mundiais cortam taxa de juros; Brasil vende dólares e injeta crédito
Ação coordenada de bancos centrais não acalma mercados, que voltam a ter dia de perdas generalizadas
EM uma ação coordenada e inédita, os principais bancos
centrais do mundo decidiram cortar os juros para reduzir o pânico global. No Reino Unido, o governo
anunciou um pacote de 500 bilhões de libras (US$ 867
bilhões) para socorrer o sistema bancário. Mas, como nos dias anteriores, a ação dos governos não acalmou os mercados, que tiveram mais um pregão de perdas generalizadas. Na Bolsa de São
Paulo, a queda foi de 3,85%. Para conter a turbulência no câmbio,
o BC brasileiro voltou a vender dólares direto das reservas, o que
não ocorria desde 2003. Após atingir cotação de R$ 2,48, a moeda
recuou para R$ 2,28. O governo também voltou a flexibilizar regras do compulsório (dinheiro que os bancos têm de depositar no
Banco Central) para ampliar o crédito. As mudanças das últimas
três semanas deverão injetar até R$ 60 bilhões no mercado.
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON
Os principais bancos centrais
do mundo lançaram ontem à
mesa a que pode ser sua última
carta para tentar conter o pânico global, ao reduzirem em
conjunto a taxa de juros em 0,5
ponto percentual.
Foi inútil, como todos os pacotes dos últimos dias: tudo o
que se conseguiu foi evitar o
derretimento das Bolsas de Valores, expressão com que o noticiário on-line recolhia logo
pela manhã os resultados da
Bolsa de Tóquio, que fechou
antes da redução dos juros com
queda de 9,38%.
As Bolsas européias iam no
mesmo caminho, do que dá a
prova mais mais forte a de Paris: abriu em queda de 2,6%, foi
caindo mais, até despencar 8%
por volta de 10h (5h em Brasília), forçando a suspensão do
pregão por 15 minutos.
Foi quando chegou a notícia
do corte dos juros. Houve alguma recuperação, mas assim
mesmo Paris fechou com queda de 6,31%, no nível mais baixo
desde 1993. Londres, Frankfurt, Madri e Milão perderam
algo menos, mas todas em patamares superiores a 5%.
O pior desempenho na Europa foi mesmo o da Rússia, cuja
Bolsa recuou 14,35%.
Recessão mais forte
A queda dos mercados aumentou o temor de uma forte
recessão mundial. O FMI (Fundo Monetário Internacional)
previu ontem crescimento próximo a zero (ou negativo) até
meados de 2009 nas economias
avançadas. Entre os países
emergentes, o desempenho será "substancialmente menor"
daqui em diante.
Para o Brasil, o Fundo projeta um PIB crescendo 5,2% neste ano e 3,5% no próximo, acima da média da América Latina. "As coisas podem ficar bem
piores do que as nossas projeções? Infelizmente a resposta é
"sim'", afirmou o economista-chefe do Fundo, o francês Olivier Blanchard.
O FMI considera que, depois
de "improvisações" que agravaram a crise, os governos centrais estão finalmente colocando em prática as três ações estruturais possíveis até aqui:
fornecer liquidez (dinheiro) ao
mercado via bancos centrais,
comprar os chamados ativos
"tóxicos" e recapitalizar as instituições afetadas.
O secretário do Tesouro norte-americano, Henry Paulson,
afirmou ontem que fará "tudo o
que estiver ao alcance" para
evitar que a economia de seu
país entre em uma severa recessão, ou, como já se especula,
em "depressão".
Apesar das declarações e do
corte dos juros nos EUA, os
principais indicadores da Bolsa
de Valores de Nova York voltaram a cair mais ontem. O índice
Dow Jones recuou 2%, o S&P
500, 1,13%, e o da Bolsa eletrônica Nasdaq, 0,83%.
O que torna ainda mais assustador o novo fracasso das
autoridades na tentativa de injetar calma nos frenéticos mercados de valores é o fato de que
a redução dos juros vinha sendo recomendada aos gritos por
dez de cada dez economistas e
executivos.
Não adiantou. Talvez porque
o problema seja menos o custo
do dinheiro (que fica menor
quando se cortam os juros, como é óbvio) e muitíssimo mais
a ausência dele no sistema financeiro.
Não é um problema de preço,
mas de confiança, como afirma
Thorsten Polleit, economista-chefe do Barclays Capital Bank
em Frankfurt: "A confiança está ausente do sistema. Os bancos não confiam mais uns nos
outros".
Conseqüência inexorável:
são os governos, com seus sucessivos pacotes trilionários de
ajuda ao setor financeiro, que
estão substituindo os bancos
como fornecedores de dinheiro
ao mercado.
Juros menores
Segundo relatório do banco
francês BNP, só o Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos, aumentou seus ativos, nas últimas três semanas,
para impressionante US$ 1,4
trilhão (mais que "um Brasil").
Evidência adicional da falta
de confiança é a contínua elevação da Euribor, a taxa de juros
para negócios entre bancos na
Europa: bateu na terça-feira
em 5,377%, o mais alto nível
desde 1994.
É só comparar com o novo
nível dos juros, após a redução
conjunta de ontem: caiu para
1,5% nos EUA, para 3,75% na
zona do euro (15 países europeus adotam essa moeda), para
2,5% no Canadá, para 4,5% no
Reino Unido, para 4,25% na
Suécia e para 2,5% na Suíça
-países e bloco que operaram a
redução combinada dos juros.
Até a China cortou seus juros
(para 6,93%, na segunda redução em três semanas), evidência clara de que os chineses, geralmente impávidos, também
estão preocupados com a perspectiva de recessão global, como decorrência do terremoto
incontrolável nos mercados.
Petróleo e ouro
O preço do petróleo é outra
indicação de que a recessão está às portas: desde seu pico, em
julho, caiu cerca de US$ 60 e
ontem recuou mais US$ 1, para
US$ 88,95. Cai continuamente
porque, se a atividade econômica se retrair, como já está ocorrendo, haverá menos demanda
por combustível e por energia.
Enquanto o petróleo cai, sobe a desconfiança -e o faz de
forma tão veloz que o jornal
alemão "Berliner Zeitung" informou ontem que a procura
pelo ouro (refúgio, como o dólar, para momentos de crise)
aumentou tanto que já há escassez do metal na praça.
"A demanda supera em muito nossa capacidade de produção", disse ao jornal Heiko
Ganss, diretor da filial de Berlim da Pro Aurum, fábrica de
metais preciosos.
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