|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Promessa é dívida
BENJAMIN STEINBRUCH
Antes, durante e depois da
campanha eleitoral do ano
passado, o presidente Lula e o PT
sempre disseram que não aumentariam a carga tributária. A promessa está no programa de governo "Crescimento, Emprego e Inclusão Social", na "Carta ao Povo
Brasileiro" (de forma implícita) e
em muitos pronunciamentos e
entrevistas do presidente Lula antes e depois da posse.
Provavelmente o presidente,
que está voltando de viagem ao
Oriente Médio, ainda não foi bem
informado, mas a promessa está
sendo quebrada. A mudança na
contribuição da Cofins para evitar a cumulatividade do tributo e
a manutenção da alíquota de
27,5% para o Imposto de Renda
promovem, na prática, um aumento da carga tributária a partir de 2004.
É triste verificar que um governo aberto, que aceita o debate
franco de mudanças, acabe baixando uma medida provisória
como a da Cofins. A alteração
nesse tributo era uma antiga reivindicação do setor produtivo e
um compromisso de campanha
do presidente Lula, explícito no
item 44 do programa de governo:
"Desoneração da produção, com
o fim da cumulatividade das contribuições (PIS, Cofins, CPMF)".
A medida provisória que o governo baixou um mês atrás aparentemente tem o objetivo de
cumprir a promessa de pôr fim à
cumulatividade da Cofins. Ocorre
que, estrategicamente, a título de
compensação pelas perdas decorrentes dessa alteração, os redatores da medida elevaram a alíquota da Cofins de 3% para 7,6%, taxação que deverá entrar em vigor
em fevereiro. Há divergências sobre o exato impacto da medida,
mas todos os especialistas concordam que o resultado será o aumento das receitas do governo em
bilhões. Os mais otimistas estimam R$ 4,4 bilhões (versão oficial), e os mais pessimistas, em R$
12 bilhões.
O impacto da nova Cofins será
devastador para o setor de serviços, que terá de suportar um aumento de até 153% na taxação
sem se beneficiar do fim da cumulatividade do tributo. Escolas,
hospitais particulares, hotéis, empresas de transportes, agências de
publicidade, escritórios de advocacia e vários outros prestadores
de serviços serão implacavelmente tributados em seu faturamento
bruto. Até alguns setores industriais terão carga extra. O de alimentos, por exemplo, terá aumento de custos estimado em
3,5%. O de construção, em 2%. O
de pesquisa e desenvolvimento,
em 4%.
Não há lógica em promover tamanho estrago em setores altamente absorvedores de mão-de-obra. A realidade do mercado
tenderá a empurrar inúmeros negócios para a informalidade, uma
tendência que precisa ser combatida, e não estimulada.
O presidente Lula, dois meses
atrás, na solenidade de abertura
da feira internacional Expoabras,
usou uma expressão feliz. Disse
que seria "insanidade" aumentar
a carga de impostos. A manutenção da alíquota de 27,5% para o
Imposto de Renda, que elevará a
carga sobre a classe média em
cerca de R$ 3 bilhões, é uma decisão definitiva. Já foi aprovada pelo Congresso. Mas a mudança na
Cofins ainda pode ser corrigida,
porque começa a ser analisada
por deputados e senadores nesta
semana.
Há correções muito positivas na
nova Cofins: desonera os bens de
capital, desestimula a verticalização industrial que provoca ineficiência, desestimula importações
e também desonera exportações.
Mas não se pode jogar sobre os
ombros de outros setores a obrigação de compensar (com folgas)
as perdas de receitas decorrentes
dessas correções.
O equilíbrio fiscal é indispensável e deve ser perseguido com obstinação pelo governo. Mas, como
está escrito na "Carta ao Povo
Brasileiro", documento síntese
dos compromissos do presidente
Lula para com a nação, "o equilíbrio fiscal não é um fim, mas um
meio", e deve ser usado para colocar o país no rumo do crescimento sustentável, e não simplesmente para prestar conta aos credores.
As sugestões para evitar o efeito
maléfico da nova Cofins sobre a
economia já foram levadas ao governo pelos diversos setores produtivos. O presidente Lula já demonstrou saber que existem momentos em que o chefe precisa
usar sua autoridade. E este é um
deles.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
Texto Anterior: País entra em nova fase e salários devem se recuperar, diz Meirelles Próximo Texto: Taxas: Juro real de 8% é "razoável", diz Levy Índice
|