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"Liquidação de um dia" gera filas e lota as lojas de grandes redes de varejo
PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Número 470, Sebastiana!
471, Eduardo!, 472, Eucimari!..." São 5h30 e a "chefe de
fiscais" Liliane organiza a
imensa fila da liquidação de
um dia só da rede varejista
Magazine Luiza, que, na filial
do shopping Aricanduva (zona leste de São Paulo), começou a se formar na madrugada
de quinta. Com prancheta na
mão, Liliane diz os números
em voz alta, como se fosse professora de aeróbica, e parece
viver um dia muito especial:
"Amo a minha profissão!"
Apesar de seu empenho, o
público avança desarvoradamente quando as portas se
abrem, às 6h, sem que ninguém lhe cobre as senhas. A
número 1, a manicure Fia Fernandes, 34, que está ali desde
as 3h de quinta-feira, perde o
pé direito de seu sapato -mas
parece feliz: em sua pressa
consumista, ela é iluminada
por refletores de TV e se aferra a uma caixinha de chocolates que recebeu de brinde.
Fia ganha R$ 850, pretende
gastar R$ 3.000, mas "só se valer muito a pena". Acaba levando um "rome" (hometheater) e uma "LCD" (TV).
Mas nem todo mundo está
contente. "Meu número na fila era 156 e eu entrei junto
com o 10 e o 390. A TV que eu
queria estava de R$ 450 por
R$ 350. Isso é liquidação?", reclama Luciana Teixeira, 31.
Assim como outros integrantes da fila, ela está entrando na filial da maior concorrente, a Casas Bahia, que também anuncia liquidação (ela e
o Ponto Frio, segundo maior).
Os preços se equivalem. A assessoria da Casas Bahia informa que seu faturamento, ontem, foi 66% maior que o da
véspera.
Qual o segredo?
Inaugurado há 51 anos em
Franca, no norte de São Paulo,
o Magazine Luiza só entrou no
mercado da capital em 2008,
quando, em uma megaoperação, abriu simultaneamente
44 lojas (agora são 48). O marketing da "liquidação de um
dia" tem 16 anos no interior.
Mas no que a promoção ali é
diferente da dos outros varejistas? O diretor de vendas e
marketing do ML, Frederico
Trajano, diz que "os fornecedores negociam em caráter de
exclusividade com a gente, por
causa do histórico de credibilidade da liquidação".
O professor de comportamento do consumidor da
ESPM, Fábio Borges, afirma
que o fornecedor vai sempre
embarcar em uma "negociação exclusiva" com o varejista.
Borges prefere atribuir o sucesso da promoção a uma "sólida arquitetura de marketing". "Eles transformaram "a
maior queima de estoque do
interior" em notícia muito antes de a rede chegar a SP."
A assessoria do magazine
diz que, em um dia, a rede registrou em suas 447 lojas espalhadas por sete Estados um
faturamento de R$ 70 milhões
-20% a mais que em 2008.
Na promoção de ontem, 2,3
milhões em itens estiveram
disponíveis. Mas, para o taxista Odair Pinto, que está de saída sem levar nada, "baratinho,
mesmo, só a panela de pressão, que custa R$ 9". "Você
acha que alguém precisa passar quase dois dias em uma fila
para comprar uma panela?"
Um dos problemas observados foi na interpretação do
texto da promoção, que anunciava "até 70%" de descontos.
"Isso aí é propaganda enganosa", reclama a comerciária
Lucile Vezetiv, 53, cujos dois
filhos conseguiram comprar
por R$ 2.600 uma TV que custa R$ 3.300.
De acordo com o professor
Borges, a interpretação do
texto da promoção "é um problema para o Ministério da
Educação". "Não cabe ao varejo educar as pessoas. Mas o
povo acaba aprendendo." Para
reforçar o marketing do "imperdível", a rede do magazine
fechou suas lojas às 14h, com o
suposto fim do estoque.
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