São Paulo, domingo, 10 de janeiro de 1999

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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Economistas dos EUA rejeitam tese da bolha

GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas

Aconteceu na semana passada um dos mais importantes conclaves de economistas do mundo, promovido pela Associação dos Economistas Americanos.
Os relatos da reunião mostram que há uma convergência entre o sentimento dos investidores em Wall Street e a opinião de respeitados economistas acadêmicos.
Em declaração ao jornal "The New York Times", o economista Gregory Mankiw, de Harvard, uma das estrelas no panteão dos últimos anos, afirmou que, se as pessoas acreditassem na tese da bolha especulativa em Wall Street, o assunto teria sido amplamente discutido no evento.
O sentimento predominante, na sua visão, é de absoluta confiança na capacidade de o presidente do banco central dos EUA, Alan Greenspan, evitar uma crise na Bolsa reduzindo as taxas de juros o quanto for necessário.
Outro economista célebre, Alan Blinder, de Princeton, atribui a boa fase da economia norte-americana a "choques de sorte". Entre esses choques favoráveis estão a queda nos preços do petróleo, a redução nos preços de bens importados pelos EUA, a queda acelerada nos preços de computadores e o declínio nos custos do sistema de saúde. A condição cada vez mais precária das relações de trabalho, reduzindo os custos de contratação, também ajuda. Uma terceira explicação foi dada pelo igualmente notável Edmund Phelps, de Columbia. Para o economista, é a própria valorização das ações na Bolsa que anima as decisões de investimento das empresas e dá fôlego à expansão econômica dos EUA.
Vários indicadores econômicos continuam dando sinais de elevado vigor nos EUA. O desemprego voltou a cair, situando-se no nível mais baixo dos últimos 28 anos. As decisões de compra de imóveis novos estão num patamar recorde desde os anos 70.
Em sua sondagem semestral com economistas, o "Wall Street Journal" identificou um consenso em favor do cenário de mais crescimento nos EUA em 99, ainda que menos intenso. E o mais preciso entre os profissionais ouvidos pelo "Journal" foi elaborado por um professor que também fundamenta suas análises na liderança de Alan Greenspan.
Uma das poucas vozes dissonantes nesse coro de contentes continua sendo a de Paul Krugman, o economista do MIT que acaba de publicar um artigo na revista "Foreign Affairs" alertando para a atualidade dos conceitos de "economia de depressão". Ou seja, seria ainda cedo demais para esquecer as lições da Grande Depressão que se iniciou com a crise de 29.
Uma dessas lições é exatamente a importância de relativizar a confiança exagerada em períodos de grande euforia, que parecem prolongar indefinidamente uma expansão econômica marcada por importantes avanços tecnológicos. Era exatamente esse tipo de situação que prevalecia no início do século, quando economistas célebres escreviam livros, às vésperas do "crash", sugerindo cientificamente que aquela era a hora para comprar ações.
A reunião dos economistas dos EUA na semana passada teve ainda outro lance importante: a apresentação de uma proposta de transformação do Fundo Monetário Internacional (FMI) em emprestador de última instância, uma espécie de banco central global, feita pelo economista-chefe da instituição, Stanley Fischer.
Pela primeira vez a questão da crise em países endividados é apresentada por um burocrata do Fundo não como fruto da irresponsabilidade fiscal ou da corrupção mental em países atrasados, mas como resultado de puras ondas de pânico financeiro.
Assim, a reunião dos economistas norte-americanos resultou num quadro curioso e paradoxal.
Parece haver um consenso de que o mais importante mercado financeiro do mundo não é presa de uma bolha especulativa.
Mas, ao mesmo tempo, um dos mais importantes economistas do mundo afirma com todas as letras: o sistema que gira em torno desse mesmo mercado está hoje sujeito a ondas de pânico financeiro que, afinal, são típicas de bolhas especulativas.
Resta saber se a ação conjunta do Fed e do FMI será capaz de amortecer o estouro dessas "bolhas que não são bolhas". Até agora está dando certo.



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