São Paulo, sexta-feira, 10 de fevereiro de 2006

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LUÍS NASSIF

Uma lei cambial antiindustrial

Tem razão o economista Gustavo Franco nas críticas à proposta da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) de mudança na lei cambial: lei antiga não é necessariamente lei anacrônica. O projeto apresentado pela Fiesp traz riscos claros ao país e desdobramentos que ainda não foram devidamente avaliados, talvez devido à euforia atual, provocada pelo excesso de dólares na economia.
É um fato episódico, e a própria Fiesp tem alertado para isso. E não esconde o fato de que as reservas cambiais do Banco Central ainda são pequenas para as dimensões do comércio exterior -bancam apenas cinco meses de importação. O enorme custo fiscal desse carregamento se deve à política monetária equivocada, não à dimensão das reservas.
É importante notar que o conceito de caixa central de divisas -exercido pelo BC- sempre foi uma demanda do setor produtivo, preocupado com sucessivas crises cambiais e com a necessidade de administrar a carência de dólares. É modelo praticado unanimemente por países emergentes, mesmo pelos maiores, como China, Índia e Rússia.
O que a Fiesp propõe é acabar com esse conceito e cada demandante de câmbio ir buscar no mercado a cobertura para suas necessidades. É uma saída ótima, mas apenas para períodos de bonança, que costumam ser pontuais. Em tempos de escassez de dólares, é um desastre.
Se a Câmara deixar passar esse projeto, o Brasil sairá definitivamente do grupo de países com projeto nacional, para se tornar um país-mercado, como a Suíça, a Holanda, Cingapura e Hong Kong, com uma estrutura econômica totalmente diversa de um país continental, adverte um especialista em história de regimes cambiais. A Fiesp está agindo em cima de uma realidade circunstancial, mas será a primeira a pedir o socorro do Estado quando faltarem dólares, como fez em toda a sua história.
Na verdade, apesar de a Fiesp ter se tornando madrinha do projeto, ele faz parte de um conjunto de medidas que, ao longo dos últimos 20 anos, com o objetivo ideológico da livre conversibilidade do real.
Seria a financeirização final da economia de um país complexo, o fim de um modelo que permitiu, ao longo das últimas cinco décadas, a própria criação do atual parque industrial brasileiro. Aprovada essa nova lei, como definiu o especialista, na primeira classe ficarão os que exportam ou têm acesso a recursos no exterior, pois poderão manter contas em moeda estrangeira e estarão isentos, cobertos e isolados dos problemas internos do País, políticos, econômicos e sociais.
Na segunda classe, a rapa.

Modelo europeu
A lei cambial acabou ocupando o espaço que seria reservado, hoje, às promessas vãs do modelo europeu de TV digital. O relatório da União Européia apontando as inconsistências do seu modelo está no endereço www.projetobr.com.br, inclusive desmontando a bandeira de que a variedade de modelos de conversores de sinal seria um fator de barateamento do set top box no mercado brasileiro.


E-mail: luisnassif@uol.com.br

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