|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Brasil critica onda protecionista na OMC
Em discurso, embaixador brasileiro faz ameaça velada aos EUA e à União Europeia de recorrer ao tribunal da entidade
Protesto recebeu apoio de países como China e Índia; eventual litígio é visto pelo Itamaraty como "última opção" a ser usada pelo país
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
A reunião de ontem da OMC
(Organização Mundial do Comércio) se transformou num
protesto contra a ameaça protecionista do mundo desenvolvido, e o embaixador brasileiro
junto à entidade, Roberto Azevedo, fez uma advertência velada aos EUA e à União Europeia:
caso se sinta prejudicado, o
Brasil poderá recorrer ao Mecanismo de Solução de Controvérsia da própria OMC.
"O Brasil está analisando cuidadosamente os fundamentos
legais e os impactos comerciais
das medidas [da UE e dos EUA]
e está pronto a defender todos
os seus direitos dentro do sistema da OMC", disse o embaixador em seu discurso, sem citar
explicitamente, nesse trecho,
os dois alvos da ameaça velada,
os EUA e a UE.
Por telefone, Azevedo esmiuçou para a Folha o seu recado
aos países ricos: "Não achem
que vamos ficar de braços cruzados, engolindo qualquer medida. Se detectarmos medidas
que violem as disciplinas da
OMC e afetem os interesses
brasileiros, poderemos agir a
qualquer momento, acionando
o Mecanismo de Solução de
Controvérsia".
Recorrer a esse mecanismo
significa iniciar um processo de
litígio e abrir um "panel" (formalizar um questionamento),
que pode acabar em última instância em retaliações comerciais. O Brasil, porém, não pensou em nenhum momento em
acionar a OMC ontem mesmo,
como chegou a ser divulgado, e
sabe muito bem o quanto um
processo desse gênero é difícil
e lento. Seria a última opção,
em caso extremo.
A ameaça e o tom do embaixador repetem os da nota que o
Itamaraty divulgou na última
sexta-feira, admitindo recorrer
a "ações necessárias" contra
medidas protecionistas que
afetem as exportações brasileiras. A nota foi explicitamente
dirigida aos EUA, que tentam
incluir a cláusula "Buy american" (comprar produtos americanos) no pacote em tramitação no Congresso.
Se a cláusula for exclusivamente em relação a compras
governamentais, o Brasil terá
que engolir calado, pois adota
medidas protecionistas e não é
signatário do acordo nessa área
selado na OMC. Mas há dúvidas sobre sua extensão.
Lamy e o diabo
Na reunião de ontem, o diretor-geral da OMC, Pascal
Lamy, apresentou um documento enumerando as medidas que todos os países vinculados vêm tomando contra a crise
econômica e ressaltou: "O diabo está nos detalhes".
Azevedo ressaltou no seu discurso que há várias formas de
protecionismo: "Não é só aumentar tarifas ou estabelecer
controles de importação", disse
ele, clamando pela conclusão
da Rodada Doha de comércio.
Ele já tinha ensaiado uma
manifestação dura contra o
protecionismo na reunião do
conselho da OMC, na semana
passada, e recebeu apoios e
adesões ontem. "Uma avalanche", disse, partindo de países
muito diferentes, como Índia,
China, México, Uruguai e Coreia. A exceção foram justamente os EUA e a UE.
"É uma defesa preventiva",
disse ele no telefonema, explicando que o movimento iniciado em Genebra deverá ganhar
contornos mais objetivos até a
reunião do G-20 (países ricos
mais países emergentes), em
abril, em Londres.
O tema também deverá estar
no topo da agenda do encontro
que o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva deverá ter ainda
neste primeiro semestre com o
presidente dos EUA, Barack
Obama, em Washington.
Texto Anterior: França anuncia ajuda de US$ 8,5 bilhões a montadoras, mas impõe condições Próximo Texto: Entidade afirma que é preciso "vigiar" barreiras comerciais Índice
|