São Paulo, Quarta-feira, 10 de Fevereiro de 1999
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FLUTUAÇÃO SUJA
Para Arturo Porzecanski, BC deveria criar mecanismo transitório, até que as exportações reajam
Governo tem de vender dólares, diz ING

VANESSA ADACHI
da Reportagem Local

O economista-chefe para as Américas do banco ING Barings, Arturo Porzecanski, avalia que o governo brasileiro deveria, já nos próximos dias, adotar um mecanismo de intervenção no mercado de câmbio, vendendo dólares para tirar a pressão sobre a cotação.
Não se trata de uma intervenção permanente. "Seria um mecanismo de venda de dólares para o curto prazo, até que a balança comercial se inverta e traga dólares naturalmente", disse Porzecanski em entrevista à Folha.
Ele está em visita ao Brasil, conversando com clientes do banco a respeito da crise do país.
Uma sugestão, segundo ele, seria fixar um volume de venda diária de dólares, por exemplo, de US$ 100 milhões. Outro mecanismo poderia ser a criação de um "gatilho": cada vez que o dólar subisse mais que um determinado percentual, haveria um leilão da moeda.
"Seriam medidas para impedir que o dólar fosse acima de R$ 2 novamente. Estamos muito perto e isso é perigoso como sinal inflacionário, além de alimentar boatos."
De acordo com o economista do ING, não é possível inverter o saldo da balança comercial subitamente. "O Brasil terá superávit, mas não agora em fevereiro. Provavelmente em abril ou maio."
Até lá, disse ele, há muitas dívidas vencendo no exterior, o que está pressionando o câmbio. "O Banco Central está atuando como se não tivesse caixa e isso gera expectativas inflacionárias", disse.
Para Porzecanski, esse foi um dos dois erros cometidos pelo governo logo após a desvalorização.
O outro foi não ter aplicado um choque de juros. "Um choque logo após a desvalorização teria acalmado as expectativas, principalmente, de inflação."
Porzecanski avalia que não se pode desvalorizar a moeda e no curtíssimo prazo baixar os juros nominais. "Ao contrário, tem de haver juros nominais mais altos para compensar a inflação e a moeda mais fraca. Quanto mais rápido o governo matar as expectativas inflacionárias e controlar as contas fiscais, mais rápido poderá baixar os juros em definitivo."
Porzecanski avalia que tem faltado liderança do BC. Ele considera Armínio Fraga um ótimo nome para o cargo. "O governo precisa colocar pessoas que saibam trabalhar em regime de câmbio livre."
Arturo Porzecanski descreve a si próprio como um dos principais críticos do governo brasileiro em Wall Street nos últimos anos.
Segundo ele, no entanto, está havendo um pessimismo exagerado em relação ao país no exterior.
"Acho que o Brasil tem chance de fazer a desvalorização sem ter hiperinflação, moratória e problemas políticos sérios", afirmou ele.
Para isso, entretanto, a precondição é que o governo anuncie nas próximas semanas cortes profundos em suas despesas.
Segundo ele, o histórico do país é de aumentar as receitas para equilibrar as contas. "Mas o problema está nas despesas. E a principal medida seria um corte em sua folha de pagamentos."
Para ele, é muito importante cuidar das contas fiscais agora "para evitar que a inflação transitória de fevereiro e março crie raízes."
Caso o governo produza cortes rápidos de despesa, Porzecanski imagina que a inflação pode ficar em 15% no ano. A taxa de câmbio poderia terminar 99 ao redor de R$ 1,80, oscilando em patamares elevados até abril.
O economista não concorda com as avaliações, vindas de analistas do exterior, de que o governo brasileiro pode ter dificuldades em rolar sua dívida interna. "Há muita ignorância lá fora sobre isso. No Brasil, a base de investidores que compra os títulos do governo é bastante sólida."


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