São Paulo, segunda-feira, 10 de maio de 2010

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Acordo antipirataria pode frear desenvolvimento, diz especialista

Pedro Roffe, de instituto europeu, alerta para efeitos de pacto de países ricos

LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

O Acta (acordo comercial antipirataria, na sigla em inglês), tratado que vem sendo negociado sob sigilo pelos EUA, a União Europeia e mais nove países, tende a restringir o comércio global e o desenvolvimento, avalia um dos principais especialistas no tema.
Para o chileno Pedro Roffe, supervisor do Programa de Propriedade Intelectual e Desenvolvimento do Centro Internacional para Comércio Sustentável e Desenvolvimento, em Genebra, o acordo tem como risco maior frear países em desenvolvimento ao reproduzir, antes da hora, o modelo de patentes dos desenvolvidos.
Em entrevista à Folha, Roffe, que trabalhou por 30 anos no Unctad (braço de comércio e desenvolvimento da ONU), diz que "não há dúvida de que o propósito inicial seja consolidar avanços obtidos por esses países com acordos bilaterais em termos de observância", afirma. Entre eles, a apreensão de cargas de terceiros sob suspeita de falsificação.

 

FOLHA - O sr. espera que o Acta seja concluído neste ano?
PEDRO ROFFE
- Não. No texto que acaba de ser divulgado falta muito a ser negociado.

FOLHA - Mas dá para ter ideia de que tipo de acordo será.
ROFFE
- Os EUA e a UE manifestam há tempo o desejo de avançar nos Trips [acordo sobre propriedade intelectual da Organização Mundial do Comércio], que não criam um sistema judicial especial sobre observância -cada país o faz segundo seu sistema legal. Buscam isso em tratados bilaterais, sobretudo com países em desenvolvimento. O projeto do Acta, não há dúvida, tem como propósito inicial consolidar os avanços que foram obtidos.

FOLHA - Como isso afeta os países em desenvolvimento?
ROFFE
- Apesar de só servir para os signatários, ele vai fixar padrões. E quando os EUA ou a UE discutirem algum acordo de livre comércio com outros países, vão incluir o Acta como obrigação. Também há as medidas de fronteira, o trânsito de genéricos. O Acta consolida esses princípios. É um risco sério para os países emergentes.

FOLHA - Medidas assim podem ser contestadas na OMC. Isso não cria uma dubiedade?
ROFFE
- Vai ser um problema jurídico. Há risco que, no futuro, o Acta possa influir na legislação dos signatários, com impacto no comércio exterior.

FOLHA - Por que o acordo não trata da melhor distribuição de conteúdo na internet?
ROFFE
- Excelente ponto. Eles estão em contradição. Em princípio algo assim deveria facilitar o comércio, mas com essa tendência protecionista estão colocando obstáculos.

FOLHA - O Acta pode restringir o comércio?
ROFFE
- É o risco maior, pois os países desenvolvidos têm instrumentos de salvaguarda fortes, que equilibram. Quando isso é exportado a outros, o comércio pode ser afetado. O reforço da propriedade intelectual quando um país se desenvolve é aceitável. Mas cada um [deveria] decidir segundo seu grau de desenvolvimento.

FOLHA - Isso pode bloquear o desenvolvimento?
ROFFE
- É a crítica que se faz. Afinal, antes esses países tinham regras para a cópia legítima, que permitiu o desenvolvimento de sua indústria. Agora estão obrigando países que ainda estão se desenvolvendo a adotar os mesmos padrões.


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