São Paulo, segunda-feira, 10 de julho de 2006

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VarigLog diz que não melhora proposta

Diretor da Volo nega acusação de que seja "laranja" de estrangeiros e diz que TAM e Gol querem dominar mercado

Audi diz que não pode se responsabilizar por dívidas da aérea e que oferta atual, considerada insuficiente, é o máximo que tem a dar


MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Não tem problema, a gente sai fora." Essa é a resposta, sem meias palavras, do empresário Marco Antonio Audi, sócio-diretor da Volo do Brasil, dona da VarigLog, quando a pergunta é o que acontece se o fundo de pensão dos funcionários da Varig, o Aerus, não aceitar a proposta atual da ex-subsidiária de cargas pela companhia aérea.
A frase dá o tom da postura que a VarigLog vem adotando na negociação: com a única proposta mais concreta na mesa pela companhia -outros interessados não conseguiram provar a origem dos recursos- o discurso é na base do "take-it-or-leave- it" (pegar ou largar), o que rendeu acusações de que a empresa da Volo quer comprar a Varig na "bacia das almas".
Avaliação divulgada na sexta-feira pela Deloitte, administradora judicial da Varig, condena os principais pontos da proposta e diz que a falência seria uma solução melhor para os credores do que a venda à VarigLog. A empresa ofereceu R$ 277 milhões pelas operações da Varig. O valor deveria ser repassado à "velha Varig", a parcela da empresa que permanece em recuperação judicial, e é destinado ao pagamento de credores.
A Justiça marcou uma nova audiência para hoje, quando a VarigLog pode modificar sua oferta. Em entrevista concedida à Folha na última sexta-feira, Audi disse que "a gente fez o máximo que dava para fazer".
"Não fui eu quem criei a Varig, não fui eu quem criou a dívida da Varig. Não posso falar que vou dar um jeito na dívida da Varig. A dívida da Varig tem jeito com a liquidação dos ativos e os passivos [encontro de contas entre as obrigações do governo com a Varig e as dívidas da aérea com a União]."
Sobre a acusação do Snea (Sindicato Nacional das Empresas Aéreas) de que a brasileira Volo é "laranja" do fundo americano Matlin Patterson (no Brasil, companhias aéreas não podem ter mais de 20% de participação estrangeira), Audi rebate que TAM e Gol querem dominar o mercado. "É uma guerra. É uma guerra violenta, uma guerra de titãs", declarou.
Sob forte pressão política, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) aprovou a venda da VarigLog, que também é uma empresa aérea, à Volo no final de junho. A aprovação teria sido condição para a proposta pela Varig ser realizada. Acompanhe abaixo trechos da entrevista concedida à Folha na sexta-feira.

 

FOLHA - Quantos funcionários vocês pretendem manter na Varig [a companhia aérea possui hoje cerca de 10 mil trabalhadores]?
MARCO ANTONIO AUDI -
A VarigLog é uma empresa de quase 6.000 funcionários. Boa parte desses funcionários depende do porão dos aviões da Varig. Você tem a VEM que é de manutenção, são 4.700, a Sata que são 5.500, só aí estamos contando com 17.000 funcionários. A Varig hoje opera apenas 16 aviões e com tendência de parar outros na segunda [hoje], na terça-feira por causa dos lessors [empresas de leasing] que querem retomar aviões. O potencial dela, olhamos toda a frota, é ficar com esses aviões e mais um pouco, vai dar mais ou menos 25 aviões, no máximo 30 aviões. Seria uma empresa para iniciar de 2.800 funcionários mais ou menos, mas queremos voltar para 80 aviões o mais rápido possível.

FOLHA - Pela proposta, a VarigLog conta com rotas que a Varig operava há um ano e que ela já perdeu.
AUDI -
Em maio, foi feita uma junção de todas os hotrans [horários de transporte de vôos] da Varig, no primeiro leilão. Estamos nos baseando naqueles hotrans, mas não vai ser possível operar todos. Vamos perder rotas. Não vai ser possível porque não há avião, conseguir avião hoje é difícil e demorado. Mas não estamos entrando para ser uma empresa de 15 aviões. Vamos voltar para uma empresa de 80 aviões. Estamos trazendo investidores estratégicos. Não posso dar os nomes porque ainda não assinamos.

FOLHA - O Cerberus [fundo de investimentos que é um dos acionistas da Air Canada] está entre eles?
AUDI -
Eles estão entre os fundos que estavam conversando com a gente, mas há uma infinidade. Independentemente disso vamos, nós e o fundo de investimentos Matlin Patterson, fazer o negócio.

FOLHA - Essa proposta encontra muita resistência dos credores, principalmente do Aerus. Hoje [última sexta-feira] a Deloitte, administradora judicial, fez uma lista de críticas à proposta. Existe espaço para melhorar e flexibilizar a oferta?
AUDI -
Primeiro queria te dar minha impressão como pessoa, fora da Volo do Brasil e da VarigLog. Sentei com o fundo de pensão Aerus, com o Brentano [Erno Dionízio Brentano, interventor do fundo]. Sabe quanto tempo levou a reunião? Cinco minutos. Ele sentou e falou: "Eu não aceito nada. Se não melhorar qualquer coisa para mim eu não aceito nada". "Então me diz uma coisa", eu disse, "o que é melhor para você, a morte da companhia, e o conseqüente desemprego de todos esses brasileiros, ou se é a mesma coisa para você pelo menos falar: eu estou ajudando a salvar os empregos?". Ele parou e falou: "Continuo na mesma. Para mim não faz diferença nenhuma se vai ter emprego ou não". Acabou a reunião.

FOLHA - E se o Aerus manter a postura e não aceitar [a VarigLog ofereceu R$ 24 milhões ao fundo, que é credor da companhia em R$ 2,3 bilhões, R$ 1,1 bilhão repactuados durante a recuperação judicial]?
AUDI -
Não tem problema, a gente sai fora.

FOLHA - Não tem espaço para flexibilizar a proposta?
AUDI -
Se você visse o tamanho da equipe que está trabalhando nisso, da área financeira, da área de logística. A gente fez o máximo que dava para fazer. A gente acredita tanto no negócio que da semana passada para essa está colocando US$ 20 milhões na companhia a fundo perdido. Se alguém comprar recuperamos nosso dinheiro, se alguém não comprar, o dinheiro foi embora.

FOLHA - A reclamação é que o percentual de faturamento que iria para a Varig "velha", que fica com as dívidas, é muito baixo.
AUDI -
R$ 278 milhões vão ser colocados na Varig velha, mais todo o patrimônio [segundo a Deloitte, o real valor da oferta é de R$ 126,96 milhões; o valor anunciado estaria inflado porque inclui componentes como aluguéis e arrendamentos]. É muito desencontro de informações, não sei quem tem interesse de fazer todo esse desencontro de informações para que fique essa bagunça no mercado. Agora não fui eu quem criei a Varig, não fui eu que criou a dívida da Varig. Não posso falar que vou dar um jeito na dívida da Varig. A dívida da Varig tem jeito com a liquidação dos ativos e os passivos. Nossa solução pode não ser a melhor, mas é a solução que a gente pode dar, é onde a gente pode chegar.

FOLHA - Um parecer da Superintendência de Serviços Aéreos diz que a Volo tem 94% de capital estrangeiro. Ou seja, a Volo seria uma empresa controlada por estrangeiros. A legislação brasileira coloca o limite de 20% de participação de estrangeiros em companhias aéreas.
AUDI -
Não estamos falando de investimentos de milhões de reais, mas em milhões e milhões de dólares. Os maiores investidores do Matlin Patterson nos EUA são fundos de pensão, é tudo fundo público. Você acha que um fundo público desse iria fazer qualquer coisa contra a lei? Não iria. Eu tenho 30 e poucos anos de mercado, eu jamais iria me prestar a um papel desses. A pessoa que está dizendo isso [que a Volo é controlada por estrangeiros] é uma só, se chama Anchieta Hélcias [diretor do Snea]. Eu fui lá [ao Snea], me apresentei, mas fui tão mal tratado que fui embora. Fomos descobrir que o Anchieta é diretor de relações da TAM. Só tem uma coisa que enxergo disso tudo: sabe qual o único lugar do mundo em que uma companhia aérea tem acima de 30% de ebitda [lucro antes dos juros, impostos, depreciações, amortizações e leasing]? É só no Brasil. O que você acha que eles vão fazer até o fim? Vão brigar contra a gente, eu garanto. É uma guerra, é uma guerra violenta, é uma guerra de titãs. Hoje até brincando um dos sócios nossos, um americano, virou para mim e falou: "Marco, fica esperto que vão mandar matar você". Aí disseram: o dinheiro [para constituir a Volo] não tem origem. Está tudo lá no Banco Central. Você acha que dá para trazer um dinheiro desse tamanho nas costas?


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