São Paulo, domingo, 10 de novembro de 2002

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Produtor de açúcar diz que preço tem de subir mais devido ao dólar

DA REPORTAGEM LOCAL

O aumento no preço do açúcar deveria ser até maior. A opinião é de Eduardo Pereira de Carvalho, 62, presidente da Unica (União da Agroindústria Canavieira de São Paulo). Carvalho, que é diabético, teve noção exata da disparada no preço do produto na semana passada. "Decidi passar no supermercado para ver, e o preço subiu mesmo. Mas subiu porque precisava", diz.
Para acompanhar a atual disparada no dólar (o produto tem cotação em moeda estrangeira), e para seguir o aumento na cotação nas Bolsas no exterior, o reajuste deveria superar os 77%, diz.
Sem meias palavras, Carvalho diz que a negociação com o varejo é um jogo "em que às vezes estamos por cima, às vezes por baixo". Leia trechos da entrevista.


Folha - O consumidor pode esperar por mais reajustes ou pela falta de açúcar nas lojas?
Eduardo Pereira de Carvalho -
Há demanda no mercado interno e há açúcar, então isso vai se resolver. Não é verdade que estamos exportando tudo agora e falta açúcar. O que o setor tinha de enviar para fora já enviou. Exportamos, em média, 60% do que produzimos. E isso não subiu. Os outros 40% é produção para atender à demanda interna. A verdade é que, nos últimos três anos, o setor aumentou a produção, reduziu o endividamento e os lucros subiram. E isso nos tornou mais competitivos, deixamos de ser um setor frágil, que aceita tudo.

Folha - O setor "aceitava tudo" e agora quer se fazer ouvir pelo varejo? Qual o custo disso para o consumidor?
Carvalho -
Não é isso. Em 1999, metade das nossas indústrias de açúcar refinado quebraram. Sabe por quê? Não é "bolinho" enfrentar Pão de Açúcar e Carrefour, não. Agora que estamos numa situação favorável, podendo exportar, vamos aproveitar o momento, como já fizemos e exportamos. Não é revanche. Isso é mercado. O mercado funciona assim. Às vezes estamos por cima, às vezes por baixo. Eu aprendi isso e essa é a graça, a beleza do jogo. Os aumentos pedidos são necessários.

Folha - O varejo diz que o aumento proposto, de 77%, é abusivo. E que o setor é extremamente concentrado, o que torna difícil a negociação. Como o senhor vê isso?
Carvalho -
No final do primeiro semestre havia queda na cotação internacional do produto. De junho para cá, o preço subiu 30% na Bolsa de Nova York. Além disso, ainda há o dólar, com valorização perto de 50%. Você pega tudo isso e não dá outra: o aumento deveria ser até maior do que o setor propôs, de 77%. Se há poucos fabricantes de açúcar refinado, é porque a operação é de baixa rentabilidade, ao contrário do que acontece com o açúcar cristal, em que temos mais de 300 fornecedores. Concentrado está o varejo, isso sim.

Folha - A indústria não teme ficar com a imagem de "vilã" nesse embate com o varejo por reajustes de preços? Afinal, os avisos nas lojas jogam a "culpa" do aumento no fabricante.
Carvalho -
O consumidor não está vendo essa situação com bons olhos. Pode ter certeza disso. Ele é esperto, pesquisa, compara, sabe quem está fazendo jogo de cena. "Vilão" será sempre quem aumentou o preço e o cliente sabe que quem aumenta o preço é a indústria. O varejo não aumenta o preço. Ele aumenta sua margem ou não a reduz quando não quer. Isso, pode ter certeza de que o consumidor sabe. Essa atitude de colocar avisos sobre a dificuldade de negociar com a indústria é parte do jogo. Afinal, quem mais entende de varejo nesse país? Quem transformou uma padaria no maior supermercado do país? O Abílio Diniz (presidente do grupo Pão de Açúcar). Essa ação de ameaçar informar o consumidor do reajuste faz parte do jogo dele.

Folha - Se falta açúcar e a indústria demora a negociar novas entregas, ela perde venda. E as marcas perdem participação de mercado. Isso não preocupa?
Carvalho -
Açúcar todo mundo tem de comprar. Não tem essa de ficar sem o produto por dois ou três meses. Se as empresas perderem venda, bem, isso é um risco.


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