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OPINIÃO ECONÔMICA
Brigitte Bardot
JOÃO SAYAD
Há sinais de que começamos
a crescer -estamos vendendo mais geladeiras e televisões,
exportando mais e importando
equipamentos. Apenas o desemprego permanece igual.
O que é desenvolvimento sustentado?
Você se apaixonou por Brigitte
Bardot. Aquele jeito de criança
misturado com mulher, a atitude
desaforada e ingênua, tudo se tornou uma obsessão. Casou-se.
Imaginou que, à noite, dormiria
com a mulher sensual, alucinada
e imprevisível. De dia, esperava
equilíbrio emocional, boa administração doméstica e sabedoria.
Seus desejos, como sempre, são
contraditórios.
Você pode escolher dois finais
alternativos para o sonho.
Numa alternativa, Brigitte Bardot cercada pelas crianças e com
avental todo sujo de ovo recebe
você na volta do trabalho, um
pouco cansada. Mas a casa está
em ordem, seus chinelos, esperando. Você pode ler o jornal sossegado sem que ela reclame de seu silêncio ou queira sair para jantar
fora. Bardot virou uma frustração!
Noutro caso, sua mulher continua sendo a Brigitte Bardot de
sempre, insinuante, enigmática e
irresistível. Você chega em casa
atormentado de desejo. Ela faz
charme para o seu amigo que você encontrou no restaurante. Você se torna cada vez mais ciumento, possessivo e começa a brigar. O
sonho se realizou e sua vida se
transformou num inferno.
A economia capitalista é uma
máquina incontrolável de crescimento, que inventa constantemente novos produtos, novas formas de produzir, que modificam
a vida familiar, introduzem novos costumes, mudam as pessoas
de cidade, de casa e de trabalho. É
uma sociedade em que todos procuram constantemente ser o
maior, o melhor, o mais alto, o
mais largo, o mais bonito. Em que
o lucro é sempre insuficiente e
precisa sempre crescer.
Será que essa economia pode
apresentar crescimento equilibrado -crescendo a taxas constantes e suficientes para absorver os
empregos necessários para os jovens que entram no mercado,
com equilíbrio no balanço de pagamentos e sem inflação?
Há crescimento equilibrado,
com "fundamentos sólidos", isto
é, sem crises financeiras, sem
apostas equivocadas (a internet
dará lucros astronômicos, a "nova economia" não depende de juros, o dólar não será desvalorizado, os preços dos imóveis não pararão de subir e assim por diante)
em que o futuro previsto é igual
ao realizado?
O sonho de desenvolvimento
sustentado se parece com o casamento idealizado com a Brigitte
Bardot. Ou é um crescimento mirrado, contido, ordeiro, sem inflação, sem desequilíbrio. Ou é desenvolvimento, cheio de problemas gerados por ele mesmo.
Para que ele seja sustentado, isto é, que dure muito tempo e incentive investimentos que dêem
lucro, é preciso, em primeiro lugar, que a massa de salários cresça pelo menos a taxas iguais ao
crescimento do produto. No caso
brasileiro e no caso americano
atual , isso ainda não está acontecendo.
No caso brasileiro, para que a
inflação não se torne um problema e volte a gerar como reação
juros altos e câmbio baixo, é preciso que as exportações cresçam
mais depressa do que as importações e que o país acumule reservas
em dólares que o protejam das
crises externas e do aumento das
importações decorrente da expansão da economia. No caso
atual, perdemos a oportunidade
do início de 2003 e recomeçamos
a crescer com câmbio muito barato.
Além do câmbio, devemos estar
preparados para novos desequilíbrios se o crescimento atual se
mostrar mais vigoroso. Os gastos
sociais do governo e os investimentos públicos precisam crescer,
o que requer economia nas despesas com juros, isto é, juros muito
menores.
Devemos estar preparados para
novos desequilíbrios e problemas
desconhecidos. Vai faltar energia?
O que vai acontecer com o transporte ferroviário? E com a oferta
de habitações? Como será a próxima crise internacional? Recuperação do dólar ou o euro continuará se valorizando?
A maior ameaça à pequena retomada de crescimento da economia que estamos observando é o
medo. Que na próxima crise externa, no primeiro gargalo (transportes ou energia?) ou na primeira ameaça de inflação um pouco
maior (provocada pelo câmbio ou
pelas tarifas públicas?) a política
econômica fixe juros mais altos e
mais superávit primário.
Seria como espancar a Brigitte
Bardot quando ela faz charme
para o seu amigo. Ela se submete
ao seu machismo, transforma-se
em Amélia e voltamos à estabilidade sem crescimento.
João Sayad, 57, economista, é professor
da Faculdade de Economia e Administração da USP. Escreve às segundas-feiras, a
cada 15 dias, nesta coluna.
E-mail - jsayad@attglobal.net
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