São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 2008

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análise

Discurso impõe dificuldades a emergentes

SHEILA D'AMORIM
EM SÃO PAULO

Por trás dos discursos empolgados de fortalecimento da liderança dos países em desenvolvimento e de ações coordenadas para criar uma espécie de vacina mundial contra novas crises financeiras, o encontro do G20 encerrado ontem em São Paulo, impôs um desafio às economias emergentes: assumir o risco de trocar a preocupação com o controle da inflação por políticas de aumento de gastos públicos e de redução de juros como forma de evitar recessão e desemprego nos próximos dois anos.
Apontada como a solução para o curtíssimo prazo, a combinação de expansão fiscal e monetária mexe com fantasmas de um passado muito recente dessas economias, cujo histórico de disciplina fiscal e controle de preços é de um pouco mais de dez anos. Por isso mesmo, a proposta é vista como uma ameaça e divide opiniões.
O Brasil é um bom exemplo para esse caso. No comando da reunião, o ministro Guido Mantega (Fazenda) fez uma defesa empolgada da aceleração de gastos públicos e redução dos juros como um instrumento de curto prazo. Para ele, mesmo que isso leve a um desequilíbrio fiscal em algumas economias, será momentâneo e se justifica porque o risco maior é viver uma recessão.
A posição dele reflete o desejo da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) e parcialmente o do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente tem cobrado de sua equipe medidas que impeçam a qualquer custo um recuo na taxa de crescimento do país nos dois últimos anos de sua gestão. Lula quer entrar na disputa pela sua sucessão com uma taxa anual crescimento de, pelo menos, 4%.
Ao mesmo tempo, o presidente exige que o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, assegure o controle da inflação. Ele sabe que isso atinge diretamente o eleitorado mais pobre. As posições antagônicas da equipe brasileira foram refletidas nas discussões do G20, onde a movimentação diplomática é sutil e evita confrontos diretos. Mas, nem por isso, esconde as divergências.
Não foi à toa que o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, notou que o tema de usar política fiscal e monetária expansionista não é consenso entre a delegação brasileira e se esquivou de comentar a situação do Brasil nessa área. Nos debates, Mantega fechou questão com chineses e outros emergentes na defesa de que o quadro que se desenha à frente é de deflação e não pressão inflacionária.
Portanto, não há problema em os países acelerarem gastos públicos. O rombo inicial e temporário nas contas públicas poderá ser compensado mais à frente com retomada de crescimento e maior arrecadação.
Meirelles ficou alinhado com Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu, ponderando que essa discussão não deve ser descolada da preocupação com a trajetória da inflação.


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