São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 2006

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Salários maiores concentram perdas

Rendimento dos trabalhadores que ganham mais de cinco mínimos recua 6,3% desde 2001, e saldo de empregos, 7,8%

Crescimento econômico baixo dos últimos anos foi o principal responsável por reduzir poder de negociação de quem tem renda maior

DA REPORTAGEM LOCAL

Quanto maior o salário, pior foi a evolução da renda e do emprego no mercado de trabalho nos últimos seis anos. Entre 2001 e setembro de 2006, são opostos os desempenhos dos trabalhadores mais pobres e dos mais ricos no país. Enquanto a massa de renda subiu 32,5%, e o emprego, 28% para quem ganha até um salário mínimo (R$ 350), houve um declínio de 6,3% nos rendimentos e de 7,8% no saldo de empregos de quem recebe acima de cinco salários (R$ 1.750). Para os trabalhadores mais pobres, foi o comércio quem mais aumentou salários (50%) e ampliou vagas (45%). Para os mais ricos, um dos vários vilões foi o setor de serviços: a renda caiu 10% e o emprego, 9%. O único setor entre oito modalidades (veja quadro) em que os assalariados formais acima de R$ 1.750 ganharam foi o extrativo mineral, graças à forte demanda por commodities. Nessa área, o emprego cresceu 24%, e a renda, 26%. "Nos salários intermediários, entre R$ 2.000 e R$ 5.000, em que está a classe média, o achatamento salarial chega a 30% nos últimos dez anos", diz Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos). O baixo crescimento econômico dos últimos anos (abaixo de 2,5%, em média) foi o principal responsável por reduzir o poder de negociação de quem ganha mais e por levar as empresas a cortar cargos em níveis intermediários. Entre os mais pobres, o principal propulsor da renda foram os aumentos reais para o salário mínimo (acima de 32% reais só no governo Lula). No emprego, houve um crescimento da atividade principalmente nas regiões mais pobres e atendidas por programas sociais ou assistenciais da Previdência. Estima-se que o governo gaste cerca de R$ 80 bilhões ao ano com 30 milhões de beneficiários desses programas. No caso do Bolsa Família, metade dos atendidos é do Nordeste. Segundo o "Atlas da Nova Estratificação Social do Brasil", o Nordeste é a região com a menor classe média no país. Pernambuco é o Estado que mais tem famílias de classe média no Nordeste, com 17,7% do total. Como comparação, São Paulo, com 47%, só perde para o Distrito Federal (50%), onde há concentração de funcionários públicos com salários que tendem a ser maiores do que os do setor privado. O economista Marcio Pochmann, um dos organizadores do "Atlas", explica que a concentração da classe média no Sul e Sudeste se acentuou depois das privatizações nos anos 1990, que convergiram as sedes de empresas para São Paulo e Rio e enxugaram quadros intermediários em todo o país. Na média, 31,7% das famílias brasileiras ainda estão na classe média. Em números absolutos, são 15,4 milhões de famílias. "A classe média ainda é grande no Brasil, mas sua tendência tem sido de encolhimento e empobrecimento", afirma o economista Sergio Vale. Outra fonte de pressão são os impostos. Embora a maior parte da tributação no Brasil seja indireta (o que leva, por exemplo, o pobre e o rico a pagar a mesma alíquota sobre um quilo de feijão), a classe média sofre mais com o peso do IR da pessoa física e não tem uma série de subsídios dados à população mais pobre -como desoneração para casas de baixa renda. "Todo o modelo tributário brasileiro foi montado para subsidiar quem é de baixa renda, o que pode ser justo. Mas, como o rico tem mecanismos para se defender e o país não cresce, a conta tem sido paga pela classe média", diz Gilberto do Amaral, presidente do IBPT. Ganz Lúcio, do Dieese, acredita, porém, que o "fundo do poço" para a classe média esteja ficando para trás, mas que uma recuperação mais rápida só virá com taxas de crescimento mais elevadas. (FERNANDO CANZIAN)


Colaboraram MÁRIO KANNO e MARCELO SAKATE , da Redação


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