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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS
Agenda para o crescimento sustentável
ALOIZIO MERCADANTE
O governo Lula recebeu
uma pesada herança da administração anterior, cujos indicadores negativos foram invertidos
como resultado de um intenso esforço realizado em 2003. O aumento dos preços (IGP-M) que alcançou 25,3% no ano de 2002,
ameaçando fugir ao controle da
política econômica, reduziu-se para 8,7%. A carga tributária total,
que em 2002 atingiu 35,9% do
PIB, manteve-se em 2003, após ter-se elevado substancialmente ao
longo dos últimos nove anos. A relação crédito interno/ PIB, que
veio encolhendo desde 1994, quando foi de 55% e chegou a apenas
24,3% em 2002, começa a ser invertida. A relação dívida pública
líquida/PIB de 56,3% em 2002,
que vinha crescendo 7,3% ao ano
nos oito anos passados, aumentou
apenas 1,3% em 2003. Tivemos em
2003 o primeiro saldo positivo em
transações correntes, da ordem de
US$ 3,7 bilhões, após oito anos de
resultados negativos. Por último, o
acesso a fontes de crédito externo,
que praticamente secara no segundo semestre de 2002, acha-se
plenamente restabelecido, com o
risco Brasil, que atingiu 2.400 pontos percentuais em fins de 2002,
caindo significativamente para
410, com ritmo de queda mais rápido que a média dos emergentes.
A materialização das ações que
garantirão a retomada e a continuidade do crescimento requer,
entretanto, outras condições relacionadas com a situação econômico-financeira dos agentes econômicos, o contexto institucional em
que atuarão e as expectativas em
relação ao futuro. Também nesses
aspectos os resultados já alcançados são muito promissores.
As grandes empresas brasileiras
têm aumentado seus lucros, inclusive em virtude de aplicações financeiras. As empresas endividadas em moeda estrangeira, com a
valorização da taxa de câmbio,
fortaleceram sua situação patrimonial. As empresas exportadoras
melhoraram seus índices de capitalização, graças ao excelente desempenho exportador do país.
Em oposição, as pequenas e médias empresas se defrontaram com
uma demanda doméstica declinante e altos custos financeiros. A
redução em marcha da taxa de juros nominal (sete reduções consecutivas) e a recuperação previsível
do poder aquisitivo dos salários,
uma vez retomado o crescimento,
levarão ao aumento dos lucros
desse estrato produtivo. As medidas governamentais em favor da
expansão do microcrédito, assim
como do crédito garantido pelos
salários, já vêm atuando na mesma direção. A redução do IPI sobre veículos automotores, recentemente renovada por mais três
meses, vem aumentando o nível
de atividade da indústria automotiva e da vasta cadeia produtiva a ela ligada.
O BNDES, após profunda reestruturação, reassumiu seu papel
de banco de desenvolvimento e,
vencida a inércia inicial, já assume uma dinâmica apropriada à
aceleração dos investimentos na
infra-estrutura e na indústria,
tendo já reduzido a TJLP de 12%
para 11%. Com a conclusão da
reestruturação de seu capital, será ampliada sua capacidade de
concessão de empréstimos.
No plano institucional, com
destaque para as reformas tributária e previdenciária, fez-se importante esforço na criação dos
marcos legais requeridos para os
investimentos produtivos. Acha-se no Congresso a MP do novo
modelo do setor elétrico, com dois
objetivos principais: redução dos
riscos para os investidores na geração de energia e modicidade
das tarifas.
O novo modelo das agências regulatórias, fundamental para a
retomada dos investimentos nos
serviços públicos, diferencia funcionalmente as agências, delimitando suas competências e criando mecanismos de controle de sua
atuação por parte dos ministérios, sem prejudicar o grau de autonomia indispensável para que
regulem e fiscalizem os mercados
pertinentes.
A política industrial, recém-lançada, com foco central no aumento das exportações, visa a reproduzir desempenhos exportadores como o de 2003, contribuindo para a redução da vulnerabilidade externa. São méritos da nova política: a promoção da capacitação tecnológica como fator de
diferenciação e de agregação de
valor aos produtos, o tratamento
articulado dos aspectos tecnológicos, comerciais e produtivos, assim como a promoção do desenvolvimento regional. Propõe-se
também o apoio governamental
aos segmentos produtivos intensivos em conhecimento: fármacos,
softwares, semicondutores e bens
de capital. Com isso, rompe-se
com o comportamento dos últimos governos de não definir políticas industriais seletivas, cuja
ausência resultou na fragilização
do tecido industrial, prejudicou o
desenvolvimento tecnológico e
acarretou alta propensão à realização de déficits na balança comercial.
Para atrair investimentos privados aos serviços públicos essenciais, a exemplo de saneamento
básico e rodovias, acha-se no Poder Legislativo projeto de lei que
disciplina as parcerias público-privadas (PPPs), destinado a assegurar aos investidores garantias e taxas de retorno adequados.
A reforma tributária vai desonerar as exportações, a cesta básica e os investimentos produtivos.
A substituição da tributação em
cascata por impostos sobre o valor
adicionado (Cofins, PIS-Pasep) e
a redução da contribuição das
empresas sobre a folha de pagamento desonerarão as exportações. A cesta básica e os bens de
capital serão desonerados do
ICMS e a alíquota da CPMF será
reduzida gradativamente à medida que diminua a relação dívida
pública/PIB.
É pertinente, portanto, alimentar expectativas otimistas. A sustentabilidade e a aceleração do
crescimento estarão, no entanto,
a depender do aprimoramento e
do aprofundamento das ações já
adotadas. É indispensável manter
uma política cambial que assegure a estabilidade do câmbio e a
competitividade das exportações,
prosseguir com a redução da taxa
real de juros, inclusive com a diminuição do "spread" bancário,
assim como aumentar os investimentos públicos. A atenuação dos
déficits sociais é parte essencial da
etapa que agora se inicia, a começar com a redução do desemprego
e da informalidade e a implementação de políticas sociais com a
construção de um mercado de
massa e a redução das desigualdades regionais e sociais na distribuição da renda.
Aloizio Mercadante, 49, é economista e
professor licenciado da PUC e da Unicamp, senador por São Paulo, secretário
de Relações Internacionais do Partido
dos Trabalhadores e líder do governo no
Senado Federal.
Internet: www.mercadante.com.br
E-mail: mercadante@mercadante.com.br
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