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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Olhando para o céu
A geração de energia hoje é a
mesma de três anos atrás, o
consumo é muito maior e o
volume de chuvas é menor
FINALMENTE o governo reconhece os riscos de uma crise
de energia nos próximos
anos. Os sinais são hoje demais evidentes para serem escondidos da
opinião pública. Nos últimos três
dias, a imprensa escrita e falada
acordou para o problema e passou a
exercer sua função social de informar o cidadão comum sobre uma
realidade que vinha sendo escondida pelas autoridades.
A crise que estamos vivendo é conhecida por quem acompanha esse
assunto apenas com os olhos da racionalidade. Por obrigação profissional, venho seguindo a questão da
energia elétrica de forma sistemática a partir de meados do ano passado. Para mim, a situação de hoje não
representa uma surpresa, e o leitor
da Folha sabe disso. O que me surpreende é a rapidez com que estamos convergindo para um cenário
pessimista, mas pouco provável,
que já existia havia algum tempo.
Esse cenário de crise resulta da
conjugação de alguns fatores que
se agravaram nos últimos meses.
Os mais importantes são: o aumento do consumo em razão de
um crescimento econômico mais
acelerado e a ocorrência de um regime de chuvas bem menos favorável. Papel relevante na crise
atual também tiveram decisões tomadas pelo governo Lula. Entre
essas, as mais importantes foram a
utilização do gás importado da Bolívia para outros fins que não a geração térmica de energia elétrica e
o modelo de gestão do setor, implantado pelo governo Lula a partir de 2003.
Uma das lições importantes da
crise do "apagão" de 2001 foi a necessidade de o país ter uma capacidade de geração de energia elétrica
a partir da queima de gás. Esse sistema seria usado em momentos
em que a geração de nossas hidrelétricas fosse reduzida em razão de
um regime hídrico menos favorável. O consumidor passou a pagar
na sua conta de energia um seguro
para ter essa segurança. Mas, para
que o instrumento possa ser eficaz, é necessária uma oferta de gás
de reserva no mercado. Entretanto, ao longo do tempo, a Petrobras
desviou esse gás para o consumo
doméstico, em automóveis e para
a indústria de maneira geral. Agora que é preciso acionar as termelétricas, ele não está mais disponível.
O outro fator determinante para
a ocorrência dos riscos atuais foi a
gestão soviética do setor, implantada em 2003. Chamo de gestão
soviética o planejamento centralizado do governo, incluindo uma
política de fixação de preços irrealistas para a energia de novos empreendimentos, mesmo os de responsabilidade do setor privado. Isso foi feito mesmo sabendo que as
novas fontes de geração trariam
custos e riscos crescentes, criando
dois problemas: o primeiro é que
não se permitiu uma geração de
caixa positiva nas estatais do setor
e que financiaria com recursos
próprios novos investimentos; o
segundo é que, ao fixar arbitrariamente os preços, sem considerar
os riscos associados a esses novos
empreendimentos, expulsou as
empresas privadas do mercado de
geração.
Com isso, os novos projetos não
saíram do papel. Nos últimos três
anos, não ocorreu um aumento necessário na nossa capacidade de
geração para acompanhar a demanda. Além disso, o Brasil permitiu que fosse desviada para países
do Mercosul uma parcela da energia gerada internamente e um volume razoável do gás boliviano. Resumo da ópera: a geração de energia hoje é a mesma de três anos
atrás, o consumo é muito maior e o
volume de chuvas é menor.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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