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LUIZ GONZAGA BELLUZZO
Preço dos ativos e economia real
Os preços dos ativos não
são mais uma função dos movimentos da economia real, mas o contrário
AS ALTERAÇÕES ocorridas ao
longo das três últimas décadas na estrutura da riqueza
capitalista e na operação dos mercados financeiros tornaram mais complexas e contraditórias as políticas
monetárias. Vou enumerá-las, sem a
pretensão de ser exaustivo: 1) o
maior peso da riqueza financeira na
riqueza total; 2) o poder crescente
dos administradores da massa ativos mobiliários (fundos mútuos,
fundos de pensão, seguros) na definição das formas de utilização da
"poupança" e do crédito; 3) a generalização da abertura das contas de
capital, dos regimes de taxas flutuantes e do uso de derivativos; 4) as
agências de classificação de risco assumem o papel de tribunais, com
pretensões de julgar a qualidade das
políticas econômicas nacionais.
A finança direta e "securitizada"
ganhou, portanto, maior importância. A desregulamentação rompeu
os diques impostos, depois da crise
dos anos 30, à ação dos bancos comerciais, que voltaram a operar como supermercados financeiros. No
mesmo movimento -desde o colapso do sistema de taxas de câmbio fixas no início dos anos 70-, os países
centrais caminharam na direção de
um sistema de taxas flutuantes. Tratava-se, na visão de muitos, de escapar das aporias da "trindade impossível", ou seja, da convivência entre
taxas fixas, mobilidade de capitais e
autonomia da política monetária
doméstica.
Para os países de moeda conversível, sobretudo para o gestor da moeda central, a política monetária
-encarnada num regime de metas
de inflação ou algo similar- tornou-se um instrumento eficaz de estabilização do nível geral de preços.
Mas,
ao mesmo tempo em que as taxas de
inflação de bens e serviços produzidos retrocediam, ampliaram-se as
possibilidades de ocorrência de "bolhas" nos mercados de crédito, provocando uma sucessão de episódios
de "inflação" de ativos.
O analista americano Bill Gross,
da Pimco, descobriu, um tanto tardiamente, que os preços dos ativos
não são mais uma função dos movimentos da economia real. Justamente o contrário: "A economia real
está sendo movida pelo preço dos
ativos, os quais, por sua vez, são influenciados por fluxos financeiros
de origem, composição e longevidade sem precedentes na história".
Gross está entre os analistas capazes de compreender que o crescimento dos fluxos financeiros já não
explica completamente o processo
de precificação dos ativos (e, portanto, das moedas). Nos mercados de
hoje, a "generalização" do movimento de alta nos preços dos ativos
-com forte compressão dos prêmios de risco- conta com a influência decisiva dos mercados de derivativos e com a expansão dos fundos
de hedge que operam com elevada
"alavancagem".
Na proporção em que cresce o
apetite pelo risco, os rendimentos
caem de forma generalizada. Os investidores correm para os mercados
onde os diferenciais ainda são
atraentes, fomentando o chamado
"carry trade" entre os ativos de baixo rendimento dos países centrais e
o rendimento mais elevado de alguns países periféricos.
Nesse ambiente favorável, o Brasil
ainda ganhou de presente um generoso ciclo de preços de commodities. A experiência recente parece
mostrar que, em tais circunstâncias,
as autoridades monetárias conseguem dois resultados: valer-se da valorização do câmbio para levar rapidamente a inflação para uma banda
de variação inferior àquela fixada
atualmente e danar o crescimento
econômico.
LUIZ GONZAGA BELLUZZO, 64, é professor titular de Economia da Unicamp. Foi chefe da Secretaria Especial de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda (governo
Sarney) e secretário de Ciência e Tecnologia do Estado de
São Paulo (governo Quércia).
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