São Paulo, quinta-feira, 11 de abril de 2002

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COMENTÁRIO

Juros devem parar de cair

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O impacto da inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) em março vai muito além do fato de ter ficado acima das expectativas do mercado. Em primeiro lugar, reforça os argumentos de quem avalia que o Banco Central interromperá, neste mês, a trajetória de queda dos juros iniciada no mês de fevereiro.
Não são poucos os motivos para pensar dessa forma:
1) Por muito pouco a inflação não estourou o limite superior da meta trimestral acertada com o Fundo Monetário Internacional (FMI), de 7,8% no acumulado em 12 meses encerrados em março. O IPCA nesse período ficou em 7,75%. Se ultrapassasse esse limite, o governo teria de consultar o Conselho de Administração do FMI sobre o que fazer para reconduzir a inflação para baixo. Certamente, causaria constrangimento para a equipe econômica;
2) A inflação acumulada em 12 meses voltou a subir, o que não ocorria desde dezembro do ano passado. Encerrou 2001 em 7,67% e chegou a 7,51% em fevereiro;
3) Os preços administrados/ monitorados (como tarifas de energia elétrica e combustíveis) subiram mais uma vez. No acumulado em 12 meses, passaram de 9,14% em fevereiro para 10,09% no mês passado.
Economistas ouvidos pela Folha dizem que o BC deverá manter a taxa de juros em 18,5%, na próxima reunião do Copom.
"Acho que o BC deverá ser mais cauteloso para ver se o impacto desses choques de preço do petróleo será temporário ou não", afirma Sandra Utsumi, economista-chefe do BES Investimentos.
João Luiz Máscolo, da Foresee, vê outro motivo para manutenção da Selic (taxa básica de juros da economia). A decisão estaria ligada à indefinição do cenário da eleição presidencial. "Se o mercado temer uma descontinuidade da atual política fiscal, o governo poderá ter dificuldade para continuar emitindo títulos. Isso cria o medo de que o governo precise emitir papel moeda para se financiar, o que pressionaria a inflação", declara.
No entanto, há um fator nos números da inflação de março que pode fazer com que o BC reduza os juros outra vez neste mês. Os chamados preços de mercado (dados livremente de acordo com oferta e demanda) mantêm tendência de queda.
Em fevereiro, o BC adotou informalmente o núcleo do IPCA para conduzir a política monetária. Passou a controlar os juros tendo como foco os preços livres, teoricamente sem considerar aumentos eventuais dos preços administrados/monitorados. Como os preços livres estão em queda, talvez o BC pudesse baixar novamente os juros.
Mas o BC continua limitado pelo teto da meta de inflação, que para este ano é de 5,5%.
Portanto, se os preços administrados subirem muito, o BC não poderá ignorá-los, pois do contrário corre o risco de não cumprir a meta outra vez. No ano passado, a inflação ficou em 7,67% -1,67 ponto percentual acima do limite superior da meta, que era de 6%.
Os preços livres são afetados pela redução dos juros, o que não ocorre com os preços administrados. Quando o BC sobe a taxa, os financiamentos ficam mais caros, o que leva as pessoas a comprar menos a crédito. Assim, comércio e indústria têm mais dificuldades para aumentar os preços.
Os preços administrados/monitorados praticamente não são afetados pelos juros porque são corrigidos por contrato ou de acordo com fatores que independem de oferta e demanda.
Se o BC reduzir os juros, estimulará mais a economia, o que facilita também o aumento dos preços livres.


Colaborou Érica Fraga, da Reportagem Local


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