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ANÁLISE
Bric é linha de defesa para asiáticos
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
Chamada cada vez mais a
compartilhar os custos da solução dos problemas globais, a
China vê no fórum político
Bric, com Brasil, Rússia e Índia,
um instrumento de defesa dos
seus direitos e deveres de país
em desenvolvimento.
"Apesar dos grandes sucessos na construção econômica, a
China é muito grande, e sua
renda PIB per capita, muito
baixa. Continuamos sendo um
país em desenvolvimento, e a
política exterior sempre parte
dessa posição do meu país", disse à Folha o embaixador chinês
em Brasília, Qiu Xiaoqi.
Ele ecoa editorial do jornal
oficial "China Daily", que, ao
anunciar a visita do presidente
Hu Jintao ao Brasil, disse que o
país "continuará a lutar pela influência dos emergentes".
Não há dúvidas, dizem analistas, de que a relação bilateral
com Washington é a mais importante para Pequim -a potência asiática detém mais de
US$ 2 trilhões em reservas e
exporta mais de US$ 300 bilhões por ano para os EUA, dos
quais 20% são em produtos de
empresas americanas instaladas na China.
Em contraste, o comércio
com o Brasil está na casa dos
US$ 30 bilhões, embora a China tenha sido em 2009 a maior
parceira individual do país.
Mas a ideia de formação de
um novo condomínio hegemônico bipolar, o G2, com os americanos, encontra resistência
entre os chineses.
"Para os nacionalistas, a
pressão americana por maior
responsabilidade no sistema
internacional é uma armadilha. Para os moderados, a China não pode ser parte de um G2
por causa de seus problemas
domésticos, de país em desenvolvimento", diz o chinês Ming
Wan, da Universidade George
Manson (EUA).
O Brasil reconhece que a
China tem interesses de potência. Roberto Jaguaribe, subsecretário de Assuntos Políticos
do Itamaraty, lembra que o
grupo de trabalho entre EUA e
China reúne um vice-premiê e
um conselheiro de Estado chineses e os secretários do Tesouro e de Estado americanos.
"Se quer chamar de G2, é um
pouco subjetivo. Mas a China
tenta evitar a imagem de que
queira um esquema em detrimento dos demais."
Ex-embaixador em Pequim,
Roberto Abdenur disse em seminário recente no Rio não ter
"ilusões românticas" sobre a
relação Brasil-China, mas afirmou que os dois países podem
ter parcerias em finanças, mudança climática, energia renovável e segurança alimentar.
Como fórum político, no entanto, o Bric desafia a história.
Rússia e Índia trazem bagagem de rivalidades com a China. As três foram impérios e
são potências atômicas. Rússia
e China têm poder de veto no
Conselho de Segurança da
ONU. O Brasil é o novato, "menos fixado no imaginário da relevância internacional do que
os demais", diz Jaguaribe.
Concorrência desleal
Novas divergências surgiram, ligadas à agressividade comercial chinesa. Empresários
russos e brasileiros queixam-se
de concorrência desleal provocada pela taxa de câmbio da
moeda chinesa, o yuan.
A China lançou ofensiva contra pressões do tipo. A embaixada em Brasília divulgou documento em que afirma que as
importações chinesas crescem
neste ano 32% mais rápido do
que as exportações.
Mas o que marca a novidade
do Bric, diz Jaguaribe, é o fato
de os quatro, sobretudo a China, serem países em desenvolvimento, mas não mais periféricos. Entre 2001 e 2008, foram
responsáveis por 46,3% da expansão global, mas a renda per
capita média -US$ 6.094 em
2008- é quase um oitavo da
americana (US$ 46.859).
A contradição é o ponto de
convergência. O diplomata Liu
Youfa, vice-presidente do Instituto de Estudos Internacionais da China, lembra que 70%
das maiores empresas transnacionais ainda têm sede nos
EUA, no Japão e na Europa.
"A fronteira econômica dos
países ricos é maior do que a
territorial. Os países do Bric
têm que romper com isso para
se tornar seus próprios senhores", disse. Sem maior competitividade, os quatro estacionarão como provedores de matérias-primas (Brasil), energia
(Rússia), serviços (Índia) ou de
fábrica do mundo (China). "É
um cenário triste."
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