São Paulo, quinta-feira, 11 de maio de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CÂMBIO

Industriais reclamam medidas para conter a valorização da moeda

Real volta a ser tão forte quanto em 1999, diz estudo

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os produtos brasileiros exportados para o EUA perderam praticamente toda a competitividade conquistada com a desvalorização do real em 1999. Em 2005, o índice de competitividade para os EUA era exatamente o mesmo do último ano antes da desvalorização, 1998.
A situação para quem exporta para a Europa não é tão ruim por conta da valorização do euro. Mas ainda assim, o real forte comeu boa parte da competitividade do câmbio. 2005 só não perde para 1998, último ano de câmbio administrado.
Por enquanto, as exportações seguem crescendo. Mas esse vigor não mostra que o câmbio está no nível correto, mas é apenas reflexo do baixo crescimento do país frente a uma economia mundial aquecida e com preços em alta, diz Josué Gomes da Silva, presidente da Coteminas e do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial). "Nosso superávit comercial é feito de um diferencial de crescimento entre nossa economia e a mundial."
"Não é verdade que a moeda brasileira flutua porque o câmbio flutua. Aqui o câmbio flutua mais. Nossa valorização é especialmente forte", diz Julio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Iedi. O instituto divulgou ontem estudo em que calcula índices de competitividade dos produtos brasileiros para os dois principais mercados do Brasil -Europa e EUA. Diferentemente de estudos divulgados até agora, ele não calcula uma taxa de câmbio real para a economia brasileira.
O Iedi, em parceria com a Funcex, calculou um índice para cada um dos dois mercados e para 18 diferentes setores. Os resultados são bastante similares. Apesar de alguns setores sofrerem relativamente mais que outros, todos perderam grande parte da competitividade cambial ganha a partir da desvalorização de 1999.
"Existe uma certa inércia da economia e dos contratos", diz Décio da Silva, presidente da Weg, que participou da divulgação do estudo. Ele diz que, apesar de não haver ainda sinais de queda das vendas externas, a indústria já sofre com o real forte.
Os empresários dizem que a perda de empregos no Brasil por conta da moeda forte é inevitável. Por um lado, há o incentivo para substituir insumos produzidos aqui pelos importados. Por outro, a própria Weg, por exemplo, faz investimentos para produzir em suas plantas no exterior peças ou componentes que deixarão de ser elaborados no país.
José Antônio Fernandes Martins, vice-presidente corporativo da Marcopolo, maior produtora mundial de ônibus, também vê impactos negativos que ainda não apareceram na pauta de exportação. "Há uma desindustrialização causada pela política predatória de câmbio", diz, referindo-se à transferência de produção para plantas fora do Brasil.
"É a única maneira de sobreviver. Em vez de gerar mais empregos aqui, vamos criar empregos lá fora."
Paulo Francini, diretor da Fiesp, faz questão de salientar o fato de que todas as empresas participantes do lançamento do estudo serem grandes exportadores, além de atuarem no mercado internacional, com plantas em vários países. "Nós trouxemos campeões, e os campeões dizem que está difícil. Estamos assistindo a um processo de destruição. Sabemos o preço que isso acarretará", disse, referindo-se à sobrevalorização do câmbio antes de 1999.
Gomes da Silva usou até o exemplo argentino, insinuando o tamanho da destruição. "Muitos se admiram de o Brasil ter superávit com a Argentina. A economia e a indústria argentina foram destruídas por uma década de sobrevalorização do câmbio", disse.
Exaltados em vários momentos, os empresários cobraram mudanças que estanquem o movimento de valorização do câmbio. Lembraram que o Brasil tem uma das mais valorizadas moedas do mundo. Desde 2000, a taxa de câmbio real efetiva, cujo cálculo considera os preços e o câmbio das várias economias com as quais os países têm relação comercial, valorizou-se 30% no caso brasileiro. Todos cobraram uma postura mais enérgica do governo na redução da taxa de juros que, dizem, alimenta parte da valorização do real ao segurar a economia e atrair dólares especulativos. "A única saída é normalizar os juros, voltar a crescer. Para importar mais, temos que crescer mais", diz Gomes da Silva.
Os grandes exportadores podem até não sofrer queda nos lucros por conta da perda de competitividade cambial, dizem eles, mas os ganhos com as exportações são menos representativos. Silva, da Weg, lembra que os juros altos também trazem ganhos à empresas. Ganhos financeiros aparecem cada vez mais nos balanços. "Eles representaram 50% do lucro [no primeiro trimestre]", diz Walter Fontana, da Sadia.


Texto Anterior: Luís Nassif: Uma compra emblemática
Próximo Texto: Moeda Forte: Sob pressão, governo descarta mudar câmbio
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.