São Paulo, sexta-feira, 11 de maio de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Bilhões de dólares e de chutes

Bancões, economistas e "analistas" não se entendem sobre o futuro dos EUA. Mas consumidor pára de gastar

O WAL-MART e as maiores redes de varejo dos Estados Unidos registraram em abril a pior (e quase inédita) queda nas vendas desde 1970. Diante do fato, otimistas apareceram com um argumento do gênero "o PIB foi ruim por causa da Copa", como se viu no Brasil do ano passado. Nos EUA, foi o efeito Páscoa (as vendas do feriado foram em março) e o frio primaveril.
O inverno de parca neve já explicara tanto a migração tardia de patos escandinavos como a queda do preço de petróleo e commodities, em janeiro. Nessa toada, o "mercado" ainda redescobrirá a eficácia explicativa do exame de miúdos de aves mortas, tal como o faziam os arúspices romanos.
No lado pessimista, o economista-catástrofe Nouriel Roubini viu nos números do comércio mais motivos para reafirmar seu cenário de "hard landing", queda forte, na economia dos EUA. Alguns outros economistas, menos alarmados mas preocupados, atribuíram a queda do varejo à alta da gasolina e ao crédito curto, influenciado pela ruína do valor dos imóveis (é fácil para um americano abrir uma linha de crédito garantida pelo valor de sua casa).
Para Roubini, o PIB americano do primeiro trimestre será revisado para menos de 1% (foi de 1,3%, crescimento anualizado do dado trimestral); o segundo trimestre teria começado pior que o anterior.
Apesar de exageros flamejantes, Roubini de certo modo antecipou sinais (ou a dimensão) da avaria na atividade econômica americana: crise imobiliária, queda forte no investimento em máquinas, instalações produtivas, equipamentos e informática, déficit comercial maior.
Na enquete do "Wall Street Journal" online (WSJ.com) divulgada ontem, 85% dos 60 economistas ouvidos dizem que o pior já passou, que o primeiro trimestre teria sido o fundo do poço, embora 2007 ainda deva ser o pior ano desde 2002. Mas os economistas de bancões como Goldman Sachs, Merrill Lynch e UBS disseram à "Bloomberg" faz só 11 dias que o Fed deve cortar os juros três vezes neste ano, de 5,25% para 4,25%, dada a apatia econômica. O Fed, esse, nem tugiu nem mugiu.
Parêntese: mais de 75% dos economistas ouvidos pelo WSJ.com "disseram que o aumento da desigualdade de renda nos EUA é preocupante e que uma parte crescente da renda vai para o 1% mais rico. Mas, para a maioria deles, o governo não deveria tentar conter o processo. Fecha parêntese.
Blogueiros econômicos dos EUA, economistas de banco e "analistas" de mercado divertem-se com os nomes da temporada de desaceleração.
Brincam com nomes, pois, dada a dispersão de previsões, há muita gente ignorante do que se passa (ainda assim ganhando milhões inéditos até em Wall Street).
Depois da ressuscitação absurda do termo "estagflação" (a inflação alta e o PIB muito baixo do final dos 70 e início dos 80) veio a "staglite" ("estagnaçãozita"), expressões que sucederam o cenário "goldilocks" (economia morna). Agora, aparece a "slowflation", estagflação suave.
Quem está na festa das Bolsas aproveitou o corcoveio numerológico dos indicadores e faturou ganhos de dois meses de euforia. Mas que ninguém procure razões econômicas nessa doideira.


vinit@uol.com.br

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