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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Super-real: uma segunda vítima
Com os números regionais de
março do IBGE, a região Norte
mostra resultados negativos
do processo de abertura
O REAL valorizado vem provocando mudanças importantes na economia brasileira.
Mais do que o nível de nossa taxa de
câmbio, é a credibilidade em sua estabilidade ao longo dos próximos
anos que está por trás dessas transformações. Os agentes econômicos
têm hoje confiança em tomar suas
decisões de investimento e consumo considerando as importações
como parte de sua estratégia. Isso
permite uma integração crescente
entre demanda interna e oferta externa nos setores dos chamados
bens comercializáveis. Em outras
palavras, temos hoje no Brasil uma
economia realmente aberta ao fluxo
comercial internacional.
Quando ocorrem mudanças dessa
magnitude em uma economia moderna como a nossa, somos obrigados a lidar com ajustes rápidos de
prazo mais curto e alterações estruturais de longo prazo. Esse é um período complexo para o analista, pois
não é tarefa fácil conciliar essas duas
dimensões. No Brasil, vivemos com
intensidade essa fase de ajustes de
curto prazo, que provavelmente se
esgotarão em questão de um ou dois
anos. O mercado chama a isso de
movimento de convergência.
Neste período de convergência
aparecem de forma clara vencedores e perdedores. A imprensa tem
chamado a atenção para os maiores
beneficiados dessas mudanças, que
são principalmente os consumidores. Produtos de melhor qualidade e
preços menores, além de condições
mais favoráveis de financiamento,
estão fazendo a alegria de milhões
de brasileiros. Citaria também como
resultado favorável deste período de
convergência do Brasil para uma
economia aberta a inflação baixa e
com grande estabilidade. O mercado
financeiro já opera a inflação de cinco anos à frente abaixo da meta do
Banco Central.
Mas os perdedores também estão
começando a aparecer com maior
clareza. Na indústria, os primeiros a
sofrer foram os setores têxtil, de
confecções e o de calçados. A região
Sul sentiu o impacto inicial desse
ajuste ao longo de 2006. Agora, com
os números regionais divulgados pelo IBGE para o mês de março, a região Norte também mostra os resultados negativos desse processo de
abertura.
Entre março de 2004 e março de
2006, a indústria na região Norte
cresceu a taxas anuais superiores a
10% ao ano. Nos 12 meses terminados em março de 2007, esse crescimento foi de apenas 0,5%. Se considerarmos apenas o Estado do Amazonas, a queda é ainda mais impressionante: nos 12 meses terminados
nesta data a produção caiu 4,8%. E
sabemos que a produção desse Estado está concentrada em Manaus,
mais especificamente na chamada
Zona Franca. E isso em um momento em que a demanda de bens de
consumo duráveis no país cresce a
taxas de quase dois dígitos.
Sem entrar em juízo de valor sobre a vantagem de uma Zona Franca
como a de Manaus, não tenho dúvida em dizer que essa é uma transformação de natureza estrutural e, portanto, definitiva. E aqui temos uma
questão que terá de ser enfrentada: o
que fazer com as dezenas de milhares de pessoas que perderão seus
empregos, em uma região sem alternativa de atividade econômica?
Mas não só na indústria de transformação vão continuar a ocorrer
ajustes dessa dimensão. Mesmo na
agricultura vamos enfrentar problemas na medida em que ocorram
acomodações nos preços internacionais de alguns produtos. É o que
está acontecendo atualmente com o
açúcar, que, nos níveis de preço
atuais e com o câmbio a R$ 2 por dólar, já está oneroso mesmo para as
usinas mais eficientes.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo Fernando Henrique Cardoso).
lcmb2@terra.com.br
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