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Juros devem manter queda, diz Mantega
Para ministro da Fazenda, nenhuma economia no mundo consegue crescer com taxas na casa de 16% ou 17% ao ano
Turbulência internacional, que considera passageira, não deve afetar crescimento de 4% neste ano; geração de emprego pode ser recorde da Fazenda, Guido Mantega, que está em São Petersburgo (Rússia), no encontro de ministros da Fazenda do G8
SHEILA D'AMORIM
ENVIADA ESPECIAL A SÃO PETERSBURGO
Três meses depois de assumir o comando da equipe econômica, o ministro Guido Mantega (Fazenda) diz que seu
maior desafio é garantir crescimento da economia acima de
4% em 2006. Confiante, diz
acreditar que o cenário internacional não será um problema. A turbulência, para ele, é
"passageira" e não terá forte
impacto sobre o Brasil.
Nem mesmo a sinalização do
Banco Central de que poderá
interromper a trajetória de
queda nos juros o preocupa. A
permanecer o cenário atual,
avalia, os juros devem se manter em baixa, porque a "inflação
no Brasil continua em queda, e
não houve repercussão dessa
turbulência [externa]".
Para Mantega, nenhuma economia no mundo é capaz de
crescer com juros de 16%, 17%
ao ano. Mas ele ressalta que o
juro médio no Brasil está abaixo disso porque é preciso considerar também outras taxas, como a TJLP (Taxa de Juros de
Longo Prazo), atualmente em
8,15% ao ano.
Após uma agenda que incluiu
conversas reservadas com o secretário do Tesouro americano,
John Snow, e o ministro das Finanças russo, Alexey Kudrin,
uma visita a um dos maiores
museus do mundo e um coquetel oficial com direito a apresentação de balé, o ministro
conversou com a Folha na noite de sexta-feira.
Mantega está em São Petersburgo (Rússia), como convidado, para o encontro dos ministros da Fazenda do G8, o grupo
formado pelas oito economias
mais industrializadas e a Rússia. A reunião serve como preparação para o encontro dos
presidentes que acontecerá no
mês que vem.
FOLHA - O governo brasileiro está
aparentemente tranqüilo com o cenário internacional. Isso foi compartilhado nas discussões com outros
países aqui na Rússia?
GUIDO MANTEGA - Não tenho
percebido preocupação nos ministros da Fazenda de outros
países. Conversando com o secretário do Tesouro americano
e o ministro das Finanças da
Rússia, percebemos que não há
maiores preocupações.
FOLHA - A elevação dos juros anunciada pela Turquia não pode ser o
início de um processo de alta nas
economias emergentes?
MANTEGA - A Turquia é um país
particularmente frágil diante
da crise porque tem déficit em
transações correntes e precisa
de capital externo para fechar
as suas contas. Isso não significa alta dos juros internacionais.
FOLHA - Mas o Brasil conta com capital externo para vender títulos de
longo prazo e melhorar o perfil da
dívida interna. Daí a atuação do Tesouro nas últimas semana. Esse não
é um canal de contágio do país?
MANTEGA - De fato, do ponto de
vista dos títulos brasileiros, essa turbulência acarretou uma
elevação da taxa de juros de
longo prazo, pelo menos momentaneamente.
Também obrigou o Tesouro a
atuar para dar liqüidez para investidores de longo prazo e
manter a confiança deles nos títulos brasileiros. Mas considero isso uma situação circunstancial e passageira.
FOLHA - Não há risco de afugentar
os investidores?
MANTEGA - Não. Foi necessária
[a atuação do Tesouro Nacional] para mostrar que eles têm
saída no caso de uma situação
mais complicada. Pelo resultado da tentativa de recompra [de
títulos da dívida externa, realizada na semana passada], podemos ver que o interesse por
títulos brasileiros continua
muito forte.
FOLHA - A operação ficou abaixo
do que esperava o governo.
MANTEGA - Foi um sucesso no
seguinte sentido: anunciamos
recompra de até US$ 4 bilhões
e foram fechados negócios de
apenas US$ 1,1 bilhão. Significa
que o que oferecemos não foi
aceito pelos detentores dos títulos brasileiros que preferiram ficar com o papéis. Isso demonstra confiança nos títulos
brasileiros. Foi um sucesso
desse ponto de vista.
FOLHA - Na última ata do Copom, o
Banco Central sinalizou que pode
parar a redução da taxa de juros.
Com o cenário positivo que o sr. vem
traçando para o Brasil, não é precipitado falar em interromper a queda
da Selic?
MANTEGA - Não li a ata do Copom, mas, pelas informações
que obtive por telefone, a ata foi
até mais flexível do que a anterior. Isso é uma questão de interpretação. As atas nunca são
muito precisas na indicação do
que vai ser feito nos próximos
meses. Mas, pelo que ouvi, não
sinaliza que [o Banco Central]
vai deixar de reduzir os juros
nem que fará o contrário.
FOLHA - Com os juros atuais e o cenário externo, vai dar para crescer os
4,5% que o sr. vem apostando?
MANTEGA - Primeiro, quando se
fala em juros no Brasil todo
mundo pensa na Selic, que é taxa de curto prazo, mas ela é
apenas um dos vários juros que
são praticados no país.
Temos visto uma redução geral das taxas de juros no Brasil.
Além da Selic, temos a TJLP,
que também vem caindo e, portanto, é conveniente para os investidores.
Se não fosse isso, não teríamos crescimento de 4% a 4,5%
neste ano. Nenhuma economia
no mundo consegue crescer
com juros de 16%, 17% ao ano.
Se fizer uma taxa média da economia brasileira, ela será inferior à taxa de 15,25% ao ano que
é a Selic.
FOLHA - Do ponto de vista fiscal, os
reajustes do funcionalismo público
anunciados pelo governo e a aprovação pela Câmara de um aumento
maior para as aposentadorias não
vão deteriorar o resultado fiscal do
próximo ano?
MANTEGA - Caso se consolide
esse reajuste nas aposentadorias que ganham mais de um salário mínimo, haverá um abalo nas contas públicas brasileiras
de algo como R$ 7 bilhões ou
R$ 8 bilhões a mais de despesa.
Isso pode causar um desequilíbrio orçamentário e comprometer as metas de superávit.
Mas essa lei ainda vai ter de tramitar no Senado, e acredito que
deve cair.
FOLHA - Qual o maior desafio pela
frente?
MANTEGA - Meu desafio é conseguir um crescimento acima
dos 4%, com recorde de emprego neste ano.
FOLHA - Mas os ventos externos
não estão a seu favor.
MANTEGA - Não acredito que
essa turbulência passageira venha a perturbar a realização
desses objetivos. Isso não me
traz nenhuma preocupação.
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