São Paulo, quinta-feira, 11 de julho de 2002

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FRAUDES DO CAPITAL

Investigação criminal em tele também ajuda a arrastar mercados aos menores níveis em cinco anos

Escândalos atingem vice de Bush e Bolsas

Associated Press
Desolado, o operador Salvatore Testa, da Bolsa de NY, acompanha a queda de 3,1% no Dow Jones


DA REDAÇÃO

A crise de confiança nas empresas norte-americanas arrastou ontem as Bolsas dos EUA aos piores níveis em cinco anos.
Os dois novos componentes da crise detonada em dezembro, com o colapso da Enron, foram a confirmação de que promotores federais investigam a contabilidade da Qwest, quarta maior operadora de telefonia local dos EUA, e de que o vice-presidente norte-americano, Dick Cheney, responderá a processo civil por suposta fraude contábil (leia abaixo).
O índice industrial Dow Jones fechou ontem em 8.813 pontos, com queda de 3,11% -a maior desde setembro de 2001. Pela primeira vez desde outubro, fechou abaixo de 9.000 pontos.
A Nasdaq, Bolsa eletrônica que reúne ações do setor de tecnologia, tombou 2,54%, para o piso de 1.346 pontos -o mais baixo desde maio de 1997. Em outro painel, o S&P 500, que considera as ações das 500 principais empresas negociadas na Bolsa de Nova York, o recuo foi de 3,4%, o que o levou ao pior nível desde outubro de 1997.
""Não há compradores para as ações, e isso é uma declaração de falta de confiança nas empresas americanas", disse o analista Gary Wedbush. ""A notícia da Qwest é mais um motivo em uma lista já enorme de motivos."
Na jornada de ontem, com a confirmação da investigação, as ações da telefônica perderam 32% de seu valor.
O abalo tampouco poupou as megacorporações, como as montadoras Ford e GM. Em períodos de crise, empresas tradicionais tendem a sofrer menos. Não foi o que ocorreu. Os papéis da Ford perderam ontem 7,4%, e os da GM, 6,9%. Perdas que se espalharam entre gigantes de outros setores como Philip Morris (alimentos e tabaco) e American Express (cartões de crédito).
Do outro lado do oceano, as autoridades francesas anunciaram ontem que vão investigar a contabilidade do conglomerado de mídia Vivendi Universal, submergido em uma grave crise financeira. Com mais essa notícia negativa e a influência do pessimismo nos EUA, todas as Bolas européias fecharam com perdas significativas.

Credibilidade no chão
Os argumentos apresentados por analistas para a aversão ao mercado acionário convergem: nenhum investidor estaria disposto a comprar ações e correr o risco de ser surpreendido com números forjados, como os apresentados por empresas como a Enron, uma das maiores companhias de energia do mundo, que pediu concordata em dezembro depois de inventar ganhos e esconder débitos.
Escândalos parecidos envolveram a WorldCom (dona da Embratel), que escondeu um prejuízo de US$ 3,85 bilhões, e a Xerox, envolvida em uma fraude de US$ 6,4 bilhões. Na segunda-feira, o mercado foi surpreendido com a notícia de que a Merck, terceira maior fabricante de remédios do planeta, incluiu no faturamento US$ 12,4 bilhões em ganhos de uma subsidiária que jamais haviam entrado em seu caixa.
A sucessão de supostas fraudes atingiu as atividades empresariais do presidente George W. Bush, e, agora, resvalam também no vice, Dick Cheney.
Uma empresa de energia na qual Bush era sócio fora obrigada, em 1989, a refazer seu balanço depois de uma auditoria federal constatar uma operação para ocultar prejuízos. Cheney responderá a processo por supostas práticas contábeis que teriam inflado as ações de uma petrolífera.
O ceticismo em relação à transparência dos números apresentados nos balanços das empresas se manteve a despeito de Bush ter anunciado anteontem, em Wall Street, centro financeiro dos EUA, um pacote com medidas ""para moralizar as companhias e acalmar os investidores". Depois de afirmar que ""as folhas de jornais não podem ser lidas como folhas de escândalos", Bush formalizou como única medida concreta a criação de uma força-tarefa para investigar crimes financeiros.
""Foi um discurso medíocre. Bush precisava ser mais enfático. Sem atacar esse problema [dos balanços fraudulentos" não se conseguirá resgatar a confiança do investidor", disse o analista Barry Hyman, da corretora Ehrenkratz King Nussbaum.

Escândalos renovados
A Qwest informou que está sendo investigada criminalmente por promotores federais. A companhia, cuja contabilidade já vinha sendo investigada, não informou o motivo da investigação.
A tele é a terceira a enfrentar um processo criminal recentemente nos EUA. Já estão sendo investigadas as companhias de telecomunicações WorldCom, segunda maior operadora de longa distância nos EUA, e a Global Crossing.
Os papéis, que chegaram a valer US$ 67 em junho de 2000, eram negociados ontem por cerca de US$ 1,70. Assim como a WorldCom, que no mês passado revelou uma fraude de US$ 3,85 bilhões, a Qwest corre sérios riscos de concordata. As dívidas da tele somam US$ 26 bilhões e, para os analistas, a companhia terá dificuldades em renegociar seus débitos.
Os problemas da Qwest só agravam ainda mais a crise do setor de teles. Após a bolha de investimentos de 1999 e 2000, as teles enfrentam uma demanda estagnada e passam por fortes ajustes.
A receita retraída e a desvalorização das ações trouxeram um aperto no caixa das companhias, que têm dificuldades para honrar os empréstimos feitos durante o boom. Só neste ano, o índice das ações das empresas de telecomunicações caiu 50%.



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