São Paulo, sexta-feira, 11 de agosto de 2006

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Lula tenta contornar a disputa entre os ministros

Furlan se queixou de Mantega com presidente e insinuou que poderia deixar governo

Mantega diz que entende colega, mas que pedidos "não cabem no cofre'; em tom irônico, Furlan afirma que Palocci o tratava melhor


DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O desentendimento entre os ministérios de Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento) e Guido Mantega (Fazenda) -explicitado ontem pelo secretário da Fazenda, Julio Gomes de Almeida- faz parte de uma disputa que já vinha sendo contornada nos bastidores do governo pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Recentemente, Furlan se queixou de Mantega com Lula e até insinuou que poderia deixar o governo porque não conseguia emplacar suas idéias. Mas Lula convenceu Furlan a permanecer e o incentivou a continuar fazendo suas propostas.
Segundo interlocutores do Palácio do Planalto, Furlan reclamou de que todas as suas propostas são "bloqueadas" pela Fazenda. E, para dar uma noção melhor da sua insatisfação, chegou a ironizar que o ex-ministro Antonio Palocci Filho o tratava bem melhor.
Na gestão anterior, Furlan até contava com a simpatia de Palocci, mas enfrentava a resistência dupla dos secretários do Tesouro, Joaquim Levy, e da Receita, Jorge Rachid, que propunham veto a tudo o que vinha do Desenvolvimento.
Hoje, a posição de Mantega se aproxima mais da de Furlan, o que ele reconhece, apesar de suas reclamações. Ainda assim, os dois não conseguem se entender totalmente, e o maior problema com o Ministério da Fazenda é o respaldo que seu colega vem dando à Receita.
Na semana passada, o ponto da discórdia foi o pacote que alterou as regras cambiais. As equipes de Mantega e Furlan entraram em atrito por causa da proposta da Receita de cobrar CPMF sobre a parcela de receita de exportação que ficaria no exterior.
Mantega chegou a defender publicamente a tese da Receita, mas acabou recuando e aceitando a isenção de CPMF. Ou seja, Furlan ganhou essa disputa, mas não teria conseguido fazer com que mais de 30% das receitas com exportações ficassem no exterior.
"Primeiro ele defendia os 30%. Depois [do anúncio do pacote] defendeu um percentual maior. A proposta [de Furlan] do pacote cambial foi acatada e era a isenção da cobrança da CPMF para uma parte da transação", disse Mantega à Folha.
Agora, Furlan quer mais desoneração. A Receita mais uma vez se opõe. No caso do setor da construção civil, o ministro insiste em nova rodada de redução de tributos. Mantega aceita só criar mais facilidades de financiamento: "A medida [que deverá ser anunciada] é mais de caráter financeiro, embora haja pleito do Desenvolvimento para desoneração".
O Planalto incentiva Furlan a lutar por suas posições. Lula, que sabe das divergências, será o árbitro. Por isso, segundo a Folha apurou, o presidente considera que Furlan está no seu papel ao defender, mesmo que publicamente, as demandas do setor produtivo. Por outro lado, Lula também argumenta que Mantega vai sempre analisar tudo com cuidado para ver os "prejuízos" que as medidas podem levar aos cofres públicos. No final, sairá vencedor quem conseguir convencê-lo.
Ontem, após o constrangimento causado pelas declarações do secretário de Política Econômica, Fazenda, Desenvolvimento e até o Palácio do Planalto atuaram para contornar a disputa e evitar que ela fosse interpretada como uma crise de governo nas vésperas da eleição presidencial.
Furlan negou que tivesse divergências com o ministro da Fazenda. Já Mantega disse à Folha que desconhecia as reclamações que teriam sido feitas por Furlan a Lula e que tem "um bom diálogo" com o colega. "Ontem [quarta-feira], estivemos juntos na Camex [Câmara de Comércio Exterior], e as relações são boas."
Mantega disse ainda que acha legítimo que Furlan traga as demandas do setor privado para o governo: "Mas, às vezes, elas não cabem no tamanho do cofre". Por isso, ele insistiu em que não há espaço para desoneração. "Fazemos as coisas com parcimônia", afirmou.
(SHEILA D'AMORIM, LEANDRA PERES E KENNEDY ALENCAR)

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