|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Indústria teme ser moeda de troca na reunião
DO ENVIADO ESPECIAL A CANCÚN
Nem a deslumbrante vista das
águas azuis-turquesa do Caribe
mexicano consegue evitar que
Osvaldo Moreira Douat tenha um
pesadelo em Cancún, na reunião
da Organização Mundial do Comércio: representante da indústria na delegação brasileira, Douat
fica remoendo, uma e outra vez, a
hipótese de que, de repente, os Estados Unidos e a União Européia
resolvam fazer concessões na negociação agrícola, e o Brasil, em
contrapartida, abra seu setor industrial.
Catarinense, Douat é um dos
empresários de maior experiência
em negociações internacionais,
como presidente da Comissão Temática de Integração Internacional da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Neste ano, pela primeira vez,
Douat (também membro da Coalizão Empresarial, o grupo que
reúne os principais representantes empresariais do Brasil), ganhou o crachá de delegado oficial
e pode participar diretamente das
sessões que estão sendo realizadas
em Cancún.
Nem isso nem o fato de que tem
um colega no ministério (Luiz
Fernando Furlan, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) faz o homem da CNI dormir com tranquilidade.
Abertura ampla
É verdade que a hipótese de
concessões na área agrícola por
parte dos países ricos é considerada remotíssima. Mas, se elas vierem, "que ministro brasileiro se
recusaria a levar para casa o troféu
da abertura agrícola?", indaga
Douat.
A moeda de troca só poderia ser
a abertura do setor industrial, como demandam os Estados Unidos e a União Européia.
Pior: o documento que está em
discussão em Cancún, no quesito
"acesso a mercados de bens não-agrícolas", prevê, de fato, uma
abertura mais ampla do que o setor produtivo brasileiro está disposto a aceitar.
Uma das duas fórmulas propostas é rejeitada liminarmente pelo
governo brasileiro: a que seleciona setores nos quais as tarifas de
importação serão levadas a zero
em prazo a ser negociado.
O presidente do grupo negociador, o suíço Piérre-Louis Girard,
sugere abrir sete setores: eletrônica e produtos elétricos; pescado e
produtos derivados; calçados; artigos de couro; autopeças e componentes de veículos; pedras, gemas e metais preciosos; tecidos e
vestidos.
Em alguns desses setores, o Brasil é até muito competitivo (calçados e couro, por exemplo). Mas
recusa-se a abrir o mercado na
área elétrica/eletrônica.
Douat diz que, enquanto houver os gargalos na infra-estrutura
e o peso dos juros entre os mais altos do mundo, a competitividade
da indústria brasileira fica prejudicada.
Não à igualdade
A segunda hipótese sugerida
por Girard é igualmente questionada pelo governo (e, claro, por
Douat): uma fórmula igual para
países desenvolvidos e em desenvolvimento, para reduzir as tarifas de importação.
A tese brasileira é a de que não
pode haver patamares tarifários
iguais para países de níveis de desenvolvimento muito diferentes.
Por enquanto, portanto, o pesadelo de Douat parece prematuro.
Mas, como ele próprio lembra,
Cancún não é o fim do caminho.
Logo depois, em novembro deste
ano, virá a reunião ministerial da
Alca (Área de Livre Comércio das
Américas) e, em um ano, o fim, ao
menos em tese, da rodada Doha,
momentos em que a redução das
tarifas industriais estará no centro
do jogo -e talvez dos pesadelos
de Douat.
(CR)
Texto Anterior: Acordo pode recuperar economias Próximo Texto: Comércio mundial: Coreano se mata em protesto contra OMC Índice
|