São Paulo, domingo, 11 de setembro de 2005

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ARTIGO

Importância da Ásia vai além do câmbio chinês

MOHAMED EL-ERIAN
ESPECIAL PARA O "FINANCIAL TIMES"

Dois fatores determinarão de que maneira as economias industrializadas sustentarão seu crescimento em médio prazo e que segmentos dos mercados oferecerão as melhores remunerações. O primeiro é a maneira pela qual o mundo acolhe a presença da Ásia no cenário econômico; o segundo é a maneira pela qual os países industrializados resolvem a questão das bolhas.
Por enquanto, não há grande consenso quanto a essas questões, o que eleva o risco de uma decisão política equivocada. Em curto prazo, o risco é agravado pelo furacão Katrina.
A posição emergente da Ásia no mercado mundial atingiu massa crítica. A participação da região no comércio mundial vem crescendo. Sua baixa estrutura de custos reduziu as pressões inflacionárias mundiais. E, com as reservas internacionais asiáticas em expansão, os bancos centrais da região se tornaram uma grande influência sobre as taxas mundiais de juros e câmbio.
Esses desdobramentos alteraram estruturalmente relacionamentos tradicionais e por isso ajudam a explicar as aberrações históricas que constatamos no momento. Nos EUA, colocam em destaque o crescimento relativamente discreto no emprego industrial, a incapacidade de empresas de repassar o aumento nos preços de commodities e a ausência de uma depreciação do dólar.
Embora reflita um choque mundial de oferta, a ascensão asiática também exerce efeitos importantes sobre o desempenho de diferentes setores em cada economia. Faz muita diferença se você participa da cadeia de produção da Ásia ou compete com ela. Não admira que empresas de commodities e países emergentes prosperem enquanto indústrias enfrentam dificuldades.
A natureza multidimensional da influência asiática no mundo não se reflete no debate dos círculos financeiros e econômicos, cujas atenções estão concentradas na questão do câmbio da China.
Os riscos desse foco estreito são significativos. Primeiro, ao limitar a análise de uma transformação histórica ao desalinhamento de um preço, a atitude oculta mudanças estruturais. Segundo, ela simplifica excessivamente a dimensão política do debate, aumentando a probabilidade de medidas protecionistas desfavoráveis a todos. Terceiro, ela solapa a espécie de coordenação política internacional necessária para corrigir os desequilíbrios nos balanços de pagamentos. Por fim, ela exacerba as bolhas ao contribuir para a formação equivocada dos indicadores de liquidez, volatilidade e riscos pelos mercados.
As bolhas também foram facilitadas por um segundo fator: inovações financeiras que reduziram as barreiras à entrada em certos mercados. Isso é mais visível na habitação dos EUA, em que empréstimos que envolvem o pagamento de juros sem pagamento imediato do principal criaram uma brecha cada vez maior, em determinadas áreas, entre as compras imediatas de casas e a acessibilidade de preço em prazo mais longo. Nesse meio tempo, o risco subjacente é vendido a investidores que podem subestimar a exposição de crédito associada.
As altas sucessivas nas taxas de juros norte-americanas podem não ser uma maneira eficiente de administrar esse segundo fator. E, com a alta no preço do petróleo causada pelo Katrina, o risco de aumentar os juros subiu devido à ameaça potencial ao consumo dos domicílios norte-americanos.
Em termos mais gerais, parece que falta ao mundo, no momento, uma abordagem mais abrangente quanto a desafios que o Katrina só tornou mais difíceis. Portanto, há necessidade de liderança política que reconheça a natureza das mudanças estruturais. Quanto mais demorar para que surja essa liderança, maior o risco de desaceleração econômica e perturbações nos mercados financeiros.


Mohamed El-Erian é diretor da administradora de fundos de investimento Pimco

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