São Paulo, terça-feira, 11 de setembro de 2007

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Brasil não aceita prejuízo na crise, diz Lula

Em discurso na Finlândia, presidente diz que os EUA têm de resolver o problema da crise gerada pela "ganância de alguns fundos'

Presidente voltou a criticar os EUA, ao afirmar que, "se o lucro não foi repartido, muito menos queremos repartir o prejuízo"

Alan Marques/Folha Imagem
Os presidentes Lula e Tarja Halonen, da Finlândia, preparam-se para brindar após a assinatura de acordos entre os dois países


CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A HELSINQUE

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva adotou ontem um tom belicoso para falar dos Estados Unidos e de sua responsabilidade pela crise financeira internacional, ao afirmar:
"Não aceitaremos que joguem nas nossas costas os prejuízos de um jogo de que não participamos".
A palavra jogo não é casual. A avaliação completa do presidente foi esta, ao ser perguntado, no palácio presidencial da Finlândia, sobre a turbulência nos mercados financeiros, que se reacendeu na sexta-feira (a pergunta e a resposta foram dadas antes que abrissem os principais mercados, inclusive o brasileiro, ontem):
"Os Estados Unidos precisam resolver o problema de sua crise. É um problema da política econômica dos Estados Unidos, da ganância de alguns fundos de investimento que quiseram comprar títulos de risco, imaginando que estavam em um cassino".
Lula ainda acrescentou que, "se o lucro não foi repartido, muito menos queremos repartir o prejuízo".
O presidente relatou que tem pedido a seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, e ao presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que conversem com seus pares norte-americanos, no Tesouro e nos BCs dos países envolvidos (nos títulos de risco), para que estes "assumam o mais urgentemente possível a responsabilidade de resolver essa crise para que ela não venha a causar prejuízos a muitos países".
Lula lembrou que o Brasil passou décadas sem crescer e emendou: "Agora, não vamos jogar fora essa oportunidade por causa de apostadores que tentam ganhar dinheiro fácil em vez de ganhar dinheiro trabalhando".
O presidente insistiu uma e outra vez na responsabilidade primordial dos Estados Unidos: "Quem criou a lei de financiamento foi o governo americano e, portanto, quem vendeu facilidades, que assuma as dificuldades".

Situação tranqüila
Não houve tempo para uma segunda pergunta que permitisse tirar duas dúvidas: primeiro, saber o que pode fazer o governo brasileiro para evitar "os prejuízos" do jogo de que não participou e, segundo, a que lei de financiamento se referia. Talvez às regras de hipotecas que permitiram concessões de crédito indiscriminadamente, nos Estados Unidos, ponto de partida para a crise de confiança em curso nos mercados.
A resposta do presidente mostra uma mudança de tom em relação à tranqüilidade absoluta que mostrava no início dos problemas há pouco mais de um mês. Lula insiste em que o Brasil está em situação tranqüila, por ter uma "solidez econômica que não teve durante muitas décadas".
Mas a tranqüilidade já não é absoluta, pois Lula emenda, agora, com a afirmação de que adota "cautelas" e "torce" para que os EUA resolvam a crise.
Como fatores de tranqüilidade, o presidente listou, primeiro, o conhecido dado das reservas na altura de US$ 160 bilhões. Depois, acrescentou o fato de que a balança comercial brasileira "não depende apenas de um ou dois países".
Lembrou que os Estados Unidos representam hoje apenas 18% do comércio brasileiro e prometeu "continuar diversificando as exportações para evitar que uma crise em qualquer país possa criar dificuldades para o Brasil".
É uma espécie de habeas-corpus verbal contra a eventual contaminação da economia brasileira por uma desaceleração da economia norte-americana ou mesmo uma recessão nela.

Não só os EUA
O presidente ainda apontou como teórico seguro anticrise o fato de que "hoje, quem dá sustentação ao crescimento econômico brasileiro é o mercado interno", o que permite "muito mais segurança do que se dependêssemos das exportações".
Já no seu discurso no encerramento de seminário entre empresários do Brasil e da Finlândia, Lula pouco tocou na crise internacional, preferindo pôr o foco nos seus dois temas preferidos, os biocombustíveis (leia texto abaixo) e o convite para investir no Brasil.
Citou, por exemplo, que o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) prevê investimentos de US$ 250 bilhões até 2010, em áreas como infra-estrutura, energia e telecomunicações.
Como uma das atrações do Brasil para o investimento finlandês, Lula mencionou a perspectiva de crescimento de 5% ao ano, a partir de 2008, "sem pressão inflacionária".
Na microeconomia, ainda citou o fato de que as mudas de eucalipto no Brasil têm crescimento excepcional, permitindo o corte em sete ou no máximo nove anos -adoçando a boca dos finlandeses, que têm como uma de suas especialidades a produção de papel e celulose. A outra especialidade, mais recente, são os celulares, área em que a Nokia finlandesa já ocupa 32% do mercado brasileiro.


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