São Paulo, sexta-feira, 11 de outubro de 2002

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TRANSE

Seca de moeda dos EUA, concentração de dívidas e incertezas políticas fazem a cotação ir a R$ 3,99, novo recorde

Sem controle, dólar dispara e bate nos R$ 4

ANA PAULA RAGAZZI
DA REPORTAGEM LOCAL

O dólar chegou a ser negociado a R$ 4 ontem e fechou próximo a este valor, cotado a R$ 3,99, em alta de 2,97% -novo recorde do real. No ano, a alta é de 72,4%.
A pressão no dólar vem de motivos que se repetem há algumas semanas: a incerteza política e a forte concentração de vencimentos de dívidas dos setores público e privado neste mês.
O mercado de câmbio opera há meses com liquidez reduzida. O crédito externo ao Brasil secou diante da possível vitória de um candidato de oposição nas eleições presidenciais e da aversão mundial ao risco, após as fraudes financeiras de empresas dos EUA.
Quem tem dólares em mãos não quer se desfazer da moeda, por avaliar que está protegido contra toda a turbulência atual.
Dessa forma, qualquer operação concluída no mercado, por menor que seja, terá forte impacto no fechamento do dólar.
Desde o início da semana, empresas têm comprado a moeda, devido à necessidade de quitar os cerca de US$ 700 milhões em débitos do setor privado que vencem nos próximos dias e não têm condições de serem renovados.
Nas últimas semanas, o Banco Central havia sido praticamente o único vendedor da moeda, por meio de oferta de dólares no mercado à vista e de leilões de crédito ou linha externa. "Mas, ontem, o BC atuou como comprador e intensificou a alta", avalia Maurício Zanella, do Lloyds TSB.
No próximo dia 17 vencem US$ 3,6 bilhões em dívida do governo atrelada ao dólar. Ontem, a autoridade monetária resgatou cerca de R$ 311 milhões de papéis que compõem esse vencimento.
"Como o BC aceitou pagar parte desses papéis ao mercado, comprando dólar acima R$ 3,90, ele acabou causando uma tensão ainda maior no final das negociações", diz Zanella.
Até ontem, o BC renovou cerca de 16% dessa dívida e o mercado avalia que ele não conseguirá renovar muito mais do que isso. Como os papéis deverão ser resgatados, o mercado começa a pressionar a cotação para influenciar o Ptax (preço médio do dólar medido diariamente pelo BC) que será utilizado para balizar o vencimento do contrato e aumentar, assim seus ganhos. Na semana passada, houve a mesma movimentação.
Ao resgatar parte do vencimento ontem, segundo os analistas, o BC tentou desanuviar um pouco a forte concentração do dia 17 e também diminuir o volume de sua dívida atrelada ao câmbio. Mas a atitude não foi vista com bons olhos pelo mercado, uma vez que ele aceitou pagar um dólar caro.
A entrevista concedida pelo presidente da instituição, Armínio Fraga, na quarta-feira, após o fechamento do mercado, dividiu os analistas ontem.
Alguns consideraram que Armínio agiu corretamente ao alertar para o fato de que o país vive uma crise de confiança e defendem a atual política do BC.
"De nada adianta o BC ficar queimando reservas agora para tentar conter o dólar. Isso demonstra uma atitude séria e responsável da atual equipe econômica", avalia Alan Gandelman, da corretora Ágora Sênior.
"Uma deterioração muito forte das reservas poderia piorar ainda mais as já problemáticas condições do novo governo", diz.
Os críticos afirmam que, ao declarar que os instrumentos de a ação do BC já são conhecido e que não há muito mais o que fazer, o BC praticamente declarou que "jogou a toalha", como afirma Helio Osaki, analista da Finambras. "Não havia a necessidade de ele dar aquelas declarações, em especial quando o mercado espera por atitudes do BC", diz.


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