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Não existe "risco-Lula", diz economista do PT
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
A alta do dólar, que ontem bateu nos R$ 4, não pode ser atribuída à disputa eleitoral. "Quando o
presidente do BC abandona a sua
postura de neutralidade e quer
atribuir a crise cambial a riscos
políticos [supostamente atribuídos a Lula], ele está de um lado subindo no palanque, o que é péssimo, e de outro tentando escamotear a fragilidade do balanço de
pagamentos brasileiro".
Essa é a opinião de Ricardo Carneiro, professor da Unicamp e
um dos economistas do PT que
participaram do grupo de trabalho que elaborou as propostas de
Luiz Inácio Lula da Silva para a
economia. Leia a entrevista concedida por Carneiro à Folha.
Folha - O dólar bateu a barreira
de R$ 4. Isso é "risco Lula"?
Carneiro - De forma nenhuma. É
antes de tudo a acentuação da
aversão ao risco em escala global,
produzida por fenômenos nos
quais o Brasil não chega sequer a
ser considerado. Há uma retração
dos financiamentos nas principais economias e a fuga de ativos
de pior classificação de risco, que
tem como pano de fundo o estouro da bolha acionária e o excesso
de investimento e endividamento
das empresas. Os emergentes foram muito afetados por esse processo de fuga para a qualidade.
Quando o presidente do BC
abandona a sua postura de neutralidade e quer atribuir a crise
cambial a riscos políticos [referência a Lula], ele está de um lado
subindo no palanque, o que é péssimo, e de outro tentando escamotear a fragilidade do balanço
de pagamentos brasileiro -produto da era FHC-, que torna o
país particularmente vulnerável à
contração global do crédito. Nesse "caldo de cultura" a especulação corre solta, mas não é a razão
primordial do desequilíbrio.
Folha - Como as pessoas e as empresas são afetadas pelo dólar?
Carneiro - As empresas endividadas em dólar serão afetadas pela alta das dívidas e da carga de juros. Embora o governo não possa
fazer muita coisa quanto às dívidas em dólar dessas empresas, deveria abrir linhas de financiamento em reais para as mesmas.
A outra face do problema é a
elevação da inflação, que pode ser
temporária se a desvalorização
cambial não se sustentar.
Folha - O BC adotou medidas para
reduzir a capacidade de os bancos
operarem no mercado de câmbio,
tem vendido moeda, e o dólar continua subindo. Na sua opinião, a
centralização do câmbio seria uma
medida de evitar uma crise cambial
mais aguda? O PT centralizará o
câmbio, se Lula ganhar?
Carneiro - O PT jamais cogitou
da centralização do câmbio. Essa
medida não está em nenhuma das
versões do programa econômico
do partido. O presidente do BC
deveria esclarecer o público e dizer em qual esquina ele ouviu referências à centralização e quem
as fez. Se ele não esclarecer, fica
parecendo que está fazendo campanha eleitoral. O compromisso
exposto e reafirmado em vários
documentos é com o regime de
câmbio flutuante.
Folha - Qual seria a estratégia do
BC em um governo petista: deixar o
real se desvalorizar, para proteger
as reservas, ou queimar reservas
para derrubar as cotações?
Carneiro - Como diz a boa doutrina, num regime de câmbio flutuante os desequilíbrios entre
oferta e demanda de divisas são
equacionados pela variação do
preço, vale dizer da taxa de câmbio. Se a contração da oferta de divisas é circunstancial, o BC pode
optar por vender reservas para reduzir a volatilidade. Se a redução é
permanente, não há outra alternativa, a não ser deixar ajustar a
taxa de câmbio.
Pensando no caso brasileiro, a
escolha é entre duas situações
igualmente ruins. É menos danoso deixar o câmbio desvalorizar,
pois isso pode promover um mudança na inserção externa do país.
A perda de reservas fragiliza a posição internacional do país e não
resolve nenhum problema.
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