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Empresas sofrem duplo estrangulamento, diz Gerdau
JANAÍNA LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
Os empresários brasileiros enfrentam um difícil paradoxo causado pela atual política econômica: têm dificuldades para vender
no mercado interno, porque a demanda está sob o cabresto dos juros altos, e também no externo,
por conta dos lucros reduzidos
com a alta do real em relação ao
dólar. A opinião é do presidente
do conselho diretor da Gerdau,
Jorge Gerdau Johannpeter.
"As políticas industrial e macroeconômica do país, em certos
aspectos, são dois fatores que limitam a competitividade do setor
industrial", disse ele na quinta-feira, em entrevista exclusiva à
Folha. "É preciso desenvolver sistemáticas alternativas."
Gerdau observou que, embora
possa haver interesse de siderúrgicas estrangeiras em vir para o
Brasil, a margem de consolidação
do mercado interno é pequena.
Ele disse que ainda não escolheu
seu candidato às eleições presidenciais deste ano.
A seguir, os principais trechos
da entrevista.
Folha - Já é possível sentir os reflexos da política monetária na atividade siderúrgica?
Jorge Gerdau Johannpeter - Depende de qual segmento. Por
exemplo: a retração no setor da
construção civil [abastecida pela
siderurgia] aconteceu mais forte
durante o ano de 2004 para 2005.
Mas nos últimos meses do ano
passado e no começo deste ano
nós tivemos pequenas recuperações. Como o governo tem dado
grande apoio -financiamento
etc.- para a construção, notamos que aí houve uma melhora.
Ainda mais com essa redução do
IPI, foi possível observar alguma
melhora na demanda no Estado
[de São Paulo].
Folha - O setor siderúrgico tem
vendas e contratações em expansão. Pode reclamar dos juros e do
câmbio?
Gerdau - A siderurgia não é melhor nem pior do que o resto da
atividade econômica, mas o setor
tem elasticidade. É possível manter o ritmo da produção e destinar
os produtos para os mercados interno ou externo. Aquilo que a demanda interna não consome pode ser destinado à exportação.
Mas, como um todo, indiscutivelmente vivemos atualmente no
Brasil um certo tipo de estrangulamento vindo de dois fatores [juros e câmbio]. Especificamente, o
grupo Gerdau, por ser um grande
exportador, tem acesso ao crédito
externo, o que barateia um pouco
nosso custo de produção.
Folha - Há riscos para a economia
nacional?
Gerdau - As políticas industrial e
macroeconômica do país, em certos aspectos, são fatores que limitam a competitividade do setor
industrial.
Folha - O que fazer, então?
Gerdau - É preciso desenvolver
sistemáticas alternativas. Por
exemplo: talvez o dólar das exportações não tenha de ser "internado" imediatamente. É uma engenharia [financeira] tremendamente complexa, mas o Brasil
tem de aprender como conduzir
isso. O que não pode é simplesmente continuar "internando" o
dólar que vem para investimentos
puramente financeiros e o governo ser obrigado a comprar dólares sistematicamente, porque isso
não tem limite.
Folha - O sr. se refere a incentivar
os investimentos de longo prazo, e
não apenas o capital para a ciranda
financeira?
Gerdau - É. O Brasil precisa de
poupança, tanto nacional como
internacional. Então é necessário
construir mecanismos que não
sobrevalorizem a moeda, para
que, no final, não haja problemas
na geração de empregos, na exportação do setor industrial e de
manufaturados e, por conseqüência, problemas adicionais em toda
a economia. Isso não quer dizer
que eu deixe de apoiar a macroconcepção de uma política de sucesso no combate à inflação, outra
peça-chave desse processo. E sim
a análise de novas macroestratégias, o que começa com a gente
olhando como o restante do mundo lida com esses problemas.
Folha - E como essas macroestratégias seriam desenvolvidas entre
o empresariado e o Estado?
Gerdau - É um trabalho técnico,
complexo, a ser feito sob termos
estruturais. Cabe ao Conselho
Monetário Nacional e às outras
instâncias que cuidam do tema.
Folha - E a carga tributária?
Gerdau - Recai, proporcionalmente, sobre poucos. Ao mesmo
tempo existe um alto índice de
ineficiência gerencial do governo.
Além de elevada, a carga tributária é desestimulante porque encarece o "custo-Brasil". Assim,
quando você constrói uma fábrica, você paga uma carga tributária
enorme, próxima de 30% do valor
do investimento, que é imobilizado antecipadamente. Coisas como essa devem ser revistas.
Folha - O senhor se refere ao imposto sobre o valor agregado?
Gerdau - É. E não sou só eu que
acho. Se toda a América do Sul
faz, toda a Europa faz... Uma das
coisas que temos de aprender na
vida é olhar o que os outros fazem
de bom. Se deu certo com todos
os outros países com os quais vou
competir, então tenho de tentar
não fazer algo muito diferente.
Folha - O setor siderúrgico vem
sendo favorecido pela economia
mundial, mas é bastante dinâmico.
Como a Gerdau pensa em investir
na sua consolidação?
Gerdau - Hoje há um consumo
bastante elevado na América do
Norte, Europa e Ásia. A margem
de consolidação do Brasil é relativamente pequena, porque as empresas estão sadias, têm estruturas acionárias bem definidas. Não
vejo facilidade nesse processo de
evolução por aqui. Em termos internacionais, existe espaço. Estamos focados no continente americano, mas é possível ampliar
nossa atuação em aços especiais
em outras regiões da Europa.
Folha - É possível uma parceria da
Gerdau na China?
Gerdau - É um "player" muito
importante. Detém praticamente
30% da produção de aço do mundo. Uma parceria com uma empresa chinesa é algo que se pode
desenvolver no futuro. Mas não é
coisa para o curto prazo. Há espaço para crescer nos Estados Unidos, onde existem vários usinas
menores, independentes. Para a
Gerdau, não interessa ser consolidada, mas consolidadora.
Folha - O sr. crê que estrangeiros
possam comprar usinas aqui?
Gerdau - Não estou vendo nos
grupos empresariais do setor a
perspectiva de que alguém do exterior venha comprar alguém
aqui. A presença deles na América
do Sul não é significativa. Então, é
provável que se perguntem: como
seremos globais sem estar no continente sul-americano? Mas, na
realidade, não adianta olhar só o
lado do investidor. Tem de saber
também o interesse de quem está
do outro lado do balcão.
Folha - O sr. apoiou o presidente
Lula nas últimas eleições, em 2002.
Já escolheu seu candidato para as
eleições presidenciais deste ano?
Gerdau - Não. E mesmo que já tivesse escolhido não falaria.
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